Sexta-feira

VALOR ECONÔMICO

Discussão sobre multa de distratos deve se estender

A definição da base de cálculo para a cobrança de multa em caso de cancelamento de vendas de imóveis ¬ os distratos ¬, prevista para ser discutida na próxima quarta-¬feira, tende a se estender, qualquer que a definição inicial. Se a posição defendida pelas incorporadoras, de incidência da penalidade sobre o valor total do imóvel, for aprovada, é provável que órgãos de defesa se oponham à decisão. Por outro lado, se a visão desses órgãos de que a multa tem de incidir sobre o valor pago até o distrato se sobrepuser, o equilíbrio econômico-financeiro do setor será afetado, segundo incorporadoras. "Não há resposta simples. O final da discussão vai gerar ônus para uma das partes", diz a advogada do setor imobiliário do escritório Stocche Forbes, Fernanda Rosa.

Na avaliação da advogada, uma solução intermediária seria um percentual de multa sobre o valor já pago, mas desde que fosse estabelecido um mínimo em relação ao total do imóvel. "Considerando o dissenso claro entre o setor produtivo e a defesa do consumidor, o único caminho viável será a busca pela minimização das perdas dos dois lados", afirma o presidente da Comissão de Direito Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Leonardo Mundim.

O Valor apurou que, pelas discussões até o momento, há um encaminhamento dentro do governo para que a multa incida sobre o valor integral dos imóveis. Para técnicos do governo, como esses impasses têm sido decididos pelo Poder Judiciário, muitas vezes com a cobrança de multa de 25% sobre o valor já pago, o movimento onera a atividade produtiva. Eles avaliam que, com um cenário macroeconômico desfavorável, na ponta, a sociedade paga como um todo.

O secretário Nacional do Consumidor, Armando Rovai, disse ao Valor que o papel da secretaria, na negociação, é trazer harmonia entre a atividade produtiva e a defesa do consumidor. Rovai considerou que a relação entre incorporadoras e o sistema de defesa do consumidor estava esgarçada e que o papel da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) foi justamente o de recoser. A seu ver, embora o setor esperasse acordo sobre o texto, ontem, a definição seria impossível, pois é necessária anuência do sistema de defesa do consumidor. "A Senacon se sentou à mesa para buscar o diálogo, ser uma catalizadora, e deixar o relacionamento entre as construtoras e os órgãos de defesa do consumidor muito transparente", disse o secretário. Ele observou que, ao final da discussão, o objetivo é encaminhar projeto de lei para análise no Congresso Nacional. O presidente do Secovi¬SP, Flávio Amary, afirmou que a questão dos distratos é muito complexa e não é fácil encontrar solução para o assunto.

"Estamos discutindo há bastante tempo, tentando construir um consenso que dê solidez e segurança para todo mercado imobiliário nacional." Ele disse acreditar que o setor está muito perto de solucionar a questão. O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, defendeu que a multa deve ser cobrada sobre o valor integral do imóvel, pois os custos do setor produtivo, entre eles o de corretagem, incidem sobre esse valor integral. "As despesas que pagamos são sobre o valor total", afirmou Martins.

O diretor da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz Fernando Moura, tem posicionamento semelhante. "Nós defendemos um equilíbrio nas relações entre incorporadoras e compradores de imóveis. E equilíbrio significa cobrir os custos que tivemos", afirmou Moura, que espera consenso em breve. "Não podemos ceder uma vírgula além do que está proposto. O distrato não pode ser um prêmio para o comprador do apartamento", disse o vicepresidente executivo da EZTec, Flavio Zarzur.

Já a presidente da Associação Brasileira de Procons, Claudia Francisca Silvano, garante que os órgãos de defesa não vão aceitar uma decisão que prejudique os consumidores. "Os Procons defendem que a multa seja aplicada sobre o valor pago pelo consumidor. Não vamos concordar com nada que incida sobre o valor integral do imóvel", disse. Na avaliação do diretor de relações com investidores da Rossi Residencial, Fernando Miziara de Mattos Cunha, a regulamentação dos distratos começará a ser definida, mas nem todos os desdobramentos do assunto serão resolvidos de maneira integral, ao mesmo tempo, devido à complexidade de assuntos que podem ter impacto das rescisões, como o patrimônio de afetação.

"Se, ao longo da obra, tenho que devolver dinheiro, afeto o equilíbrio econômico financeiro daquela obra", afirma. Ainda que a maior parte dos distratos ocorra na entrega dos empreendimentos, esse equilíbrio é alterado, de acordo com o diretor de relações com investidores, porque a incorporadora ainda precisa pagar o financiamento bancário à produção e despesas de condomínio.

O mais correto, segundo Miziara, é que os recursos só pudessem ser devolvidos ao comprador quando a Sociedade de Propósito Específico (SPE) não tivesse mais nenhuma exposição de dívida. Para o diretor de incorporação da Rossi, Rodrigo Martins, a busca de regras para distratos é saudável por expor para a sociedade uma realidade que até então era só das incorporadoras, mas a regulamentação só irá trazer segurança jurídica se a aquisição de um imóvel "deixar de ser preferência para ser obrigação do consumidor". "Essa regulamentação será âncora da recuperação setor", diz Martins. No encontro a ser realizado na próxima semana, além de representantes das incorporadoras, estarão a Senacon, do Ministério da Justiça; os ministérios do Planejamento e da Fazenda; e órgãos de defesa do consumidor, como a Associação Brasileira de Procons. O setor discute também o percentual da multa a ser cobrada na rescisão, de 10% a 12%, e o prazo para a devolução dos recursos.

 

Governo estima PIB potencial de 3,8%

Recém-¬concluído, um estudo da área econômica do governo indica que o potencial de crescimento do país é maior do que a maioria das estimativas feitas por profissionais do setor privado. Pelas contas oficiais, o Produto Interno Bruto (PIB) potencial nos próximos dez anos é de 3,8%. Duas questões básicas orientam os economistas do setor público quando o tema é a atividade econômica. Elas se referem a quanto o país conseguirá crescer nos próximos anos e porque a saída da recessão, desta vez, é mais lenta do que nas experiências anteriores.

Para responder à primeira indagação, os técnicos oficiais tomaram como base o período pós-Plano Real, de 1994. Antes disso, a superinflação distorcia os dados. O crescimento da economia desde então foi, em média, de 3,3%. Desses foram descontados os efeitos demográficos ¬ decorrentes de uma menor oferta de mão de obra jovem no mercado de trabalho ¬ e do menor crescimento da economia chinesa (de uma taxa média de 10% nos anos 90 e 2000 para algo mais próximo de 6,5%). Esses dois fatores retiram 1 ponto percentual do PIB potencial que cai, portanto, para 2,3%.

Os técnicos do governo não consideram nas suas projeções os investimentos, que caíram substancialmente como proporção do PIB, porque entendem que havendo ganhos de produtividade, a taxa de investimento naturalmente crescerá. Esse, apontou um economista oficial, seria um dos equívocos do trabalho de Daniel Leichsenring, economista¬chefe da gestora de recursos Verde Asset Management. Publicado pelo jornal "O Estado de S. Paulo", o estudo concluiu que o PIB potencial do país no pós¬recuperação da recessão atual é de 1,5%, em comparação com 2,5% de crescimento médio nos anos de 1980.

Outro elemento relevante nos cálculos do governo, com impacto não desprezível na capacidade de crescimento, é o processo de redução do gasto público que a PEC do teto vai produzir nos próximos anos, em favor do aumento do investimento privado. Os técnicos se referem a esse fator como um processo de migração de um "crowding out" para "crowding in". Considerando que o setor privado é mais eficiente do que o governo, o efeito seria um aumento da produtividade.

Da década de 90 para cá o governo federal aumentou sua despesa em praticamente o dobro do crescimento do PIB. O gasto primário da União, que correspondia a 11% do produto em 1991, atualmente representa 19% do PIB e a vigência da PEC do teto ¬ que determina o congelamento da despesa em temos reais pelos próximos 20 anos ¬ deve reduzi¬lo para 16% do PIB até 2027. O agigantamento da União nesse período, em detrimento do investimento privado, retira cerca de 0,75 ponto percentual do potencial de crescimento pela perda de produtividade.

A expansão do investimento privado esperada para os anos futuros acrescentaria 0,75 ponto percentual no PIB potencial. A diferença, de 1,5 ponto percentual, é o que a migração de uma situação para a outra pode acrescentar ao PIB. Ou seja, este passaria de um potencial de crescimento de 2,3% para 3,8%, se tudo ocorrer como planejado. Ou seja, com o rigoroso cumprimento do mandato da PEC do teto, a aprovação da reforma da Previdência e de um conjunto amplo de reformas microeconômicas destinadas a melhorar a produtividade da economia doméstica.

Se as limitações para o crescimento da economia brasileira não são tão dramáticas quanto parecem à primeira vista, busca-¬se uma resposta sobre qual a razão da lenta recuperação da atividade produtiva, que não se materializou no terceiro nem no quarto trimestre de 2016, como era esperado. Agora, a aposta do governo é que o fim da recessão se concretizará neste primeiro trimestre. É claro que a retomada não será para o patamar de 3,8% potenciais de imediato. Será bem gradual. A causa da recessão que começou em 2014 foi o descontrole das contas públicas. Mas a razão da difícil virada da economia ¬ da recessão para a recuperação da atividade ¬ decorre do elevado endividamento das empresas e das famílias. Ambos estão em processo de desalavancagem há três trimestres.

A troca de governo ¬ de Dilma Rousseff por Michel Temer ¬ produziu uma sensível reversão das expectativas, resultando na queda do prêmio de risco do país, na valorização do real frente ao dólar, e de expansão do mercado acionário. Tal movimento, porém, não teve impacto na performance do PIB, porque as empresas, superendividadas, não tinham como retomar seus investimentos, e as famílias, também atoladas em dívidas e sob temor do desemprego, reduziram o consumo. A expectativa é que com a queda mais acentuada da taxa de juros possa sobrar recursos para o aumento do investimento e do consumo.

É importante ter em mente, porém, que o comprometimento da renda das empresas e das famílias com suas dívidas ainda é elevado e o processo de desalavancagem vai continuar ainda por algum tempo. Da parte do governo, além das reformas da Previdência, trabalhista e, também, tributária, como tem salientado o presidente Temer nos últimos dias, o foco será na agenda de medidas microeconômicas. Essas mais a redução da taxa de juros ¬ tanto da Selic quanto da taxa ao tomador final ¬ vão gerar ganhos de produtividade e, portanto, um crescimento sustentável na ótica oficial.

No curto prazo, porém, o crescimento será muito modesto ¬ algo entre 0,5% e 0,8% este ano ¬ conforme revisão que está sendo feita nas projeções da área econômica do governo. A redução dos prognósticos para o PIB de 2017, que era de 1% em novembro, decorre de uma herança estatística de 2016 pior do que imaginada. Melhora da educação dos brasileiros é fundamental para gerar ganhos de produtividade. Mas este é um processo bem mais lento do que as medidas de natureza econômica. Talvez em 30 anos o país chegue ao padrão americano, onde o tempo médio de escola de um cidadão é de 13 anos. Aqui, estuda¬-se, em média, apenas 7 anos.

 

Entrevista – Roberto Setubal - 'Vamos ver uma queda relevante no spread'

O presidente do Itaú Unibanco, Roberto Setubal, diz que volta mais tranquilo do Fórum Econômico Mundial, em Davos. Ele vê condições de a economia brasileira ter uma melhora rápida, nos próximos dois anos, e constatou em Davos um "claro suporte da comunidade internacional de negócios para que isso aconteça". Em entrevista ao Valor, Setubal avalia que a questão política continua a ser o maior risco para a economia brasileira em 2017, especialmente pelos esperados desdobramentos da Operação LavaJato. Mas ressalvou: "Parece que o presidente [Michel] Temer não está envolvido em nenhum tipo de problema e, portanto, o governo vai continuar".

Para ele, as investigações podem levar à demissão de mais algum ministro, mas sem que isso altere o rumo que o país tomou. Setubal estima que a PEC do teto dos gastos, que o governo conseguiu aprovar no Congresso, "de certa forma blinda um pouco o Brasil contra eventuais tentativas populistas" na eleição presidencial de 2018. O executivo constata um aumento do interesse estrangeiro por ativos brasileiros, com o crescimento de operações de fusões e aquisições em 2017. Também sinaliza uma baixa do spread bancário e a retomada do crédito.

Leia os principais trechos da entrevista.

Valor: Davos está terminando justamente quando Donald Trump assume a Casa Branca, em meio a incertezas. Como o senhor vê o eventual impacto para o Brasil?

Roberto Setubal: Há muita incerteza em relação a medidas que ele [Trump] vai buscar implementar. Especialmente para o Brasil, não há algo que vai nos impactar diretamente. O Brasil pode ser impactado indiretamente na medida em que outros países forem afetados. Mas, neste momento, para o Brasil, não temos muito com que nos preocupar.

Valor: Qual o impacto sobre o dólar, por exemplo, com o estímulo que a administração Trump quer dar para a repatriação de capitais de empresas americanas?

Setubal: Isso também não afeta o Brasil. A maior parte desse dinheiro está parada em paraísos fiscais e onde há grandes incentivos com baixo imposto. Essa repatriação já mais ou menos anunciada pelas autoridades americanas deve ter algum efeito no dólar, mas não acredito que seja relevante. O crescimento econômico e a taxa de juros comparada a outros lugares do mundo são fatores mais determinantes para a cotação do dólar.

Valor: Qual a percepção em Davos sobre o Brasil?

Setubal: Algumas coisas me surpreenderam em relação ao Brasil aqui em Davos. Primeiro, um desconhecimento bastante grande de todas as medidas tomadas pelo governo, que foram recentes, é verdade. Ainda não há aqui um entendimento claro de como podem impactar o Brasil e quais medidas vêm sendo aprovadas, inclusive. A vinda da delegação brasileira a Davos foi bastante oportuna para divulgar essas medidas. Elas foram muito bem percebidas, causaram boa impressão neste momento.

Valor: As medidas são suficientes para recuperar realmente a confiança do mundo dos negócios no país e no exterior?

Setubal: Há uma percepção de que o Brasil está caminhando na direção correta. Vi vários fóruns, inclusive com participação de autoridades brasileiras, e elogios para as medidas adotadas. Há também uma percepção de que tudo isso demora um tempo para fazer efeito. A recuperação da economia brasileira vai acontecer, não vai ser da noite para o dia, mas é claramente uma mudança de rumo muito importante. O nível de confiança na economia brasileira melhora muito com tudo o que foi mostrado em Davos.

Valor: Quando o Brasil terá uma recuperação mais firme?

Setubal: Quando a gente comparar o final de 2017 em termos de PIB com o final de 2016 teremos um crescimento possivelmente acima de 2%. É claramente um caminho de recuperação que vai levar já em 2018 a um PIB melhor.

Valor: O sr. tem mencionado a incerteza política como principal risco no país. Quais riscos? O de delações atingirem o presidente Temer?

Setubal: Acho que os riscos da economia brasileira estão realmente muito mais ligados à questão política do que ao rumo econômico. As incertezas que vejo vêm principalmente das investigações [da Lava¬Jato] que estão acontecendo. Agora, não acredito muito que as investigações possam afetar tanto o governo atual. Vai afetar muito mais o cenário eleitoral de 2018. Parece que o presidente Temer não está envolvido em nenhum tipo de problema e, portanto, o governo vai continuar. Eventualmente, um ou outro ministro pode ter de sair, mas isso não vai mudar fundamentalmente o caminho do Brasil.

Valor: Para a presidência da República, dos políticos que estão aí o sr. vê candidatos viáveis, isentos de problemas na Justiça?

Setubal: Acho que ainda não está claro esse cenário. Temos candidatos a candidatos. Ao longo das investigações [da Lava¬Jato] um ou outro é que pode se tornar inviável ¬ ou viável. Mas é cedo para dizer; temos que aguardar o começo do ano que vem para ter mais clareza.

Valor: Qual seria o perfil de um bom candidato a presidente, considerando a situação econômica?

Setubal: O ideal seria um candidato que desse sequência ao trabalho que vem sendo feito na área econômica. Temos que pensar no Brasil sempre a médio e longo prazos e a sequência seria bastante importante para ganhar confiança na economia. Evidentemente teria que ser alguém que não esteja envolvido em nenhuma das investigações da Lava¬Jato e que tenha um perfil reformista, moderno, de trazer novas ideias.

Valor: O sr. não vê risco de candidatos fortes mais extremistas?

Setubal: Acho mais provável que a gente tenha candidatos que defendam a continuidade do programa atual, que é exatamente o oposto do que vinha sendo feito, e que não teve sucesso claramente. Acho que a população certamente rejeitaria um candidato que tivesse um programa como o anterior, que trouxe esses problemas que estamos vivendo neste momento. Acho também que a aprovação do teto dos gastos públicos foi uma medida extremamente importante, especialmente a longo prazo para o Brasil, e limitaria muito a possibilidade de [ocorrer] um governo populista, querendo se basear em gastos públicos. A PEC do controle dos gastos de certa forma blinda um pouco o Brasil contra eventuais tentativas populistas.

Valor: A reforma da Previdência, como está proposta, é suficiente?

Setubal: Se for aprovado exatamente o que está ali proposto, acho que ela é suficiente, teremos um alívio muito grande e tiraremos esse assunto da pauta certamente por muitos anos. O ideal é que aprovassem como está porque combinaria perfeitamente com a PEC dos gastos e as possibilidades do Tesouro. Quando se compara o que está sendo proposto para os brasileiroscom regras de aposentadoria que existem nos países desenvolvidos, depois de aprovada, a nova regra ainda seria muito [mais] generosa do que em países muito mais ricos que o Brasil.

Valor: Quais reformas micro o sr. acha que concretamente podem avançar neste ano?

Setubal: A agenda é muito intensa. Acho que a ideia de melhorar o ambiente de negócios no Brasil é muito relevante. Há uma série de pequenas medidas que já estão de certa forma na agenda do governo, como facilitar abertura e fechamento de empresas. Isso no Brasil é muito complicado e a reforma facilitaria muito a vida do pequeno empresário que, no final do dia, é quem move a economia.

Valor: Reformas estão sendo delineadas, a política monetária é mais flexível e o governo cobra os bancos para baixar os juros. Isso vai acontecer logo?

Setubal: Sem dúvida o Banco Central começou a aliviar a política monetária com redução de juros de 0,75 ponto. Acho que vamos assistir a uma queda bastante consistente e sustentável da Selic, e chegar a um dígito talvez no fim deste ano ou começo de 2018, dependendo também da conjuntura internacional e do juro americano. Isso tem reflexo nos juros que os bancos cobram de seus empréstimos e acredito que também vão cair, será absolutamente natural e inevitável. Taxa de juro tem dois componentes muito relevantes. Um é a Selic, que está sendo reduzida, e o outro é o nível de risco na economia, que está melhorando.

Valor: O sr. vê risco de nova renegociação de dívidas de empresas que já foram negociadas, dada a demora na recuperação econômica?

Setubal: O ambiente de negócios está melhorando, a economia começa a retomar e temos melhoria geral na inadimplência. Estamos assistindo empresas vendendo subsidiárias, ativos, para reduzir seu endividamento. No Itaú, nunca tivemos um "pipeline" tão grande de operações de fusões e aquisições. Há muito interesse de investidores estrangeiros no Brasil. Tudo isso está ajudando as empresas que conseguem vender algum ativo importante a recompor seu fluxo de caixa e seu endividamento. Alguma renegociação nova pode acontecer, sempre na medida em que a empresa mostre que tem viabilidade. É importante que, no reescalonamento da dívida, tenha uma perspectiva futura de amortização da dívida.

Valor: Podemos ver um recorde de fusões e aquisições em 2017?

Setubal: O Brasil tem exatamente essa combinação de ativos interessantes, baratos, empresas muito boas sendo vendidas, como vimos com CPFL, Alpargatas e outras. Há boas possibilidades de volume muito grande de M&A [fusões e aquisições]. Recorde, não sei, mas será um ano bem ativo. Isso mostra um dinamismo grande da economia e a confiança de investidores estrangeiros no Brasil.

Valor: Quais seriam as medidas com maior impacto para redução dos spreads? O banco vê essa redução ocorrer já em 2017?

Setubal: Acho que sim. A queda da taxa de juro e a redução do risco de inadimplência contribuem bastante. Ainda estamos vivendo um nível elevado de risco, mas a tendência é distensionar ao longo do ano. Vamos ver uma queda relevante do spread.

Valor: Como compatibilizar a redução nas taxas de juros de operação de crédito com melhora na rentabilidade dessas operações?

Setubal: O ambiente de juro menor contribui bastante para a melhoria da inadimplência. Taxa de juro menor e redução de inadimplência possibilitam spread menor, ao mesmo tempo que a rentabilidade do banco se mantém. É o ambiente em que todo mundo sai ganhando. A estabilidade na economia é muito importante em razão disso, por trazer confiança, capacidade de planejamento.

Valor: O Itaú é líder no segmento de cartões. Como vai ser afetado pela redução de rotativo?

Setubal: O sistema brasileiro de cartões de crédito tem uma série de distorções que vêm do tempo da inflação muito alta. É possível trazer a taxa rotativa para baixo, reduzir os prazos, redistribuir a comissão. Agora, isso tem um impacto bastante grande na indústria de cartões de crédito, mudando um pouco a cadeia de valor. E tem impacto relevante em algumas empresas que possam estar posicionadas apenas em certos pontos da cadeia de valor. Para o Itaú, que está posicionado em todos os pontos da cadeia de valor, entendemos que no todo conseguiremos manter uma boa rentabilidade. A redução de prazos não é um problema para o Itaú, o banco tem uma capacidade de funding muito grande.

Valor: A mudança no rotativo do cartão pode ser feita neste ano?

Setubal: Acho que sim, mas é preciso ter um pouco de cuidado, porque o que temos no sistema brasileiro é a taxa de rotativo muito elevada compensando o parcelamento sem juros que é feito na conta. Esta combinação é que é perigosa, com um volume pequeno que paga muito juro e um volume muito grande que não paga nenhum juro. Esse subsídio cruzado precisa ser bem equacionado.

Valor: O banco vai continuar usando o excesso de capital para fazer aquisições?

Setubal: Sempre estamos olhando possibilidades de aquisição. No Brasil, o que vemos hoje são nichos específicos do mercado financeiro. No ano passado tivemos essas três operações pequenas para o tamanho do Itaú [compras de Recovery, BMG Consignado e Citi]. Não vemos mais nenhuma grande aquisição do Brasil. E sempre tem a possibilidade de alguma aquisição na América Latina, mas, no momento, não temos nada em vista.

Valor: E sobre provisões? Os grandes casos de inadimplência corporativa acabaram?

Setubal: Vamos provavelmente assistir uma redução no volume de provisões a serem feitas. Isso vai contribuir favoravelmente para o resultado do banco em 2017, na medida em que temos menos perdas de crédito à frente, porque já fizemos bastante provisões agora.

Valor: E a demanda por crédito?

Setubal: Acreditamos que em 2017 vamos começar a ver crescimento de novo nas operações de crédito, depois de dois anos seguidos de queda. A recuperação da economia leva a uma maior demanda de crédito, combinada com a redução da inadimplência.

Valor: Como está o processo de sucessão no banco? O novo presidente, Candido Bracher, já assumiu as funções do dia a dia no banco?

Setubal: A sucessão no Itaú está seguindo conforme planejado. Foi anunciada com bastante antecedência que Candido Bracher seria o presidente do banco a partir de maio de 2017, exatamente para fazer uma transição bastante tranquila e ele se inteirar de todos os temas. O banco é muito grande, complexo. Ele estava mais envolvido em operações do atacado, e agora tem se envolvido mais na parte de varejo e tecnologia, de forma que até abril estará bastante preparado para assumir.

Valor: O que fará em seguida?

Setubal: Vou dividir a função de presidente do conselho de administração com Pedro Moreira Salles. Ao longo dos anos, o conselho cresceu muito de importância. Regulamentação mais recente impôs uma série de responsabilidades de supervisão, monitoramento, acompanhamento, inclusive na informática, em função dos riscos de ataques cibernéticos.

Valor: Como o sr. sai de Davos, com toda essa discussão sobre populismo, incertezas etc?

Setubal: Eu volto mais tranquilo para o Brasil, exatamente porque vejo como o país tem condições de ter melhoria rápida, quer dizer, nos próximos dois anos. E há claramente um suporte da comunidade internacional de negócios para que isso aconteça.

 

Ajuste e cenário global são riscos para 2017

Os maiores riscos para a economia brasileira, nos próximos meses, são economia global, cenário político e ajuste fiscal, apontam economistas de bancos e consultorias ouvidos pelo Valor. Destacam¬-se na composição do risco economia global, o governo Donald Trump, que assume a presidência dos Estados Unidos hoje, desconforto com a política na zona do euro e apreensão com o ritmo de expansão da economia da China. Na composição do risco político estão eventuais desdobramentos da Operação Lava¬Jato ¬ agora com ainda mais incerteza, depois da morte do relator da processo no Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki.

O risco fiscal comporta duas preocupações: a possibilidade de a Câmara dos Deputados rejeitar a proposta do governo para reforma da Previdência e o ajuste fiscal ficar aquém do esperado. O Valor consultou 23 economistas sobre os riscos que podem assombrar o cenário básico das instituições e 80% dos analistas mostraram preocupação semelhante ¬ e elevada na comparação com outros riscos¬ com a economia global e o cenário político doméstico; 56% dos entrevistados destacaram a eventual frustração do ajuste fiscal como fator altamente perturbador; 21% demonstraram desconforto com a zona de euro e a política econômica chinesa.

A inflação não foi citada como fonte de preocupação, mas ninguém despreza efeitos de aumento de preços das commodities, em especial petróleo ¬ se ocorrer. Determinadas preocupações são comuns a profissionais de instituições estrangeiras. Eles também listam um número maior de variáveis sob disciplinado monitoramento ¬ o que se explica pela atuação global de bancos. Bancos e consultorias nacionais preocupam-¬se, pela ordem, com o fator Trump na economia global, com o cenário político doméstico e com resultados de medidas fiscais. Paulo Gomes, estrategista e economista¬chefe da Azimut Brasil Wealth, sintetiza: "Politicamente, o risco está na não aprovação de uma reforma previdenciária e ajuste fiscal em linha com as expectativas".

No cenário externo, há dúvidas quanto ao governo Trump e a consequente política monetária que o Federal Reserve possa adotar para acomodar a nova realidade, conjuntura na zona do euro e economia chinesa. André Muller, economista da AZQuest, cita riscos externos semelhantes aos listados por Gomes e classifica como "mais relevantes" os internos: "A continuidade da aprovação da agenda fiscal do governo (Previdência e solução para a dívida dos Estados com a União) é condição necessária para que a economia brasileira passe a apresentar expansão sustentável, sem aceleração da inflação e juros mais baixos ao longo de 2017 e 2018."

Gustavo Arruda, do BNP Paribas, destaca o risco de mudança radical da política econômica americana. Eventual desaceleração do crescimento chinês, incerteza com o governo Trump e risco político na Europa estão no pacote. "No âmbito interno, nosso cenário básico contempla aprovação da pacote. "No âmbito interno, nosso cenário básico contempla aprovação da reforma da Previdência, além de eventuais reformas que facilitem o ambiente de negócios. Os riscos a esse cenário são associados ao aumento da instabilidade política." "Instabilidade política interna" também é o principal risco na visão de Rafael Bevilacqua, da Eleven Research. Patrícia Krause, economista¬chefe da Coface para América Latina, não descarta maior turbulência no cenário político com a homologação da delação premiada da Odebrecht, "trazendo riscos à atividade e ao ajuste fiscal".

José Claudio Securato, presidente da Saint Paul Escola de Negócios, avalia que será preciso aguardar os resultados de delações. Para ele, "o risco político de afastamento do presidente Temer e dos principais ministros do núcleo econômico, incluindo presidente do Banco Central" são muito baixos. Daniel Gomes da Silva, do Modal, afirma que a continuidade do cenário de incerteza política é o principal risco. E enumera os eventos que podem provocar reviravoltas nas expectativas: delação da Odebrecht, julgamento da chapa Dilma¬Temer no TSE e proximidade das eleições majoritárias de 2018 conforme o calendário avança. "A combinação desses eventos pode reduzir a capacidade do governo Temer impor reformas e medidas a um ritmo acelerado." "Os riscos para as perspectivas do Brasil são: não crescimento econômico e político", resume o Departamento Econômico do Santander.

David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch no Brasil, chama atenção para crescimento como o maior risco para o Brasil nos próximos meses e alerta: "Sem crescimento, a questão fiscal se complica muito." Roberto Luis Troster, diretor da Troster & Associados, considera que o baixo crescimento deixa o país mais vulnerável a choques de oferta. Os analistas do Departamento Econômico do Bradesco avaliam que os principais riscos para o BC neste momento derivam do sentimento de frustração com o tempo que pode durar a contração da atividade tornando a retomada mais tardia e lenta do que o esperado. A equipe do Bradesco aponta a existência de riscos adicionais e imprevisíveis. "Riscos de mensuração existem: a continuidade das investigações sobre corrupção no Brasil e seus eventuais efeitos secundários sob a estabilidade política, além das incertezas em relação às medidas na área econômica e de política externa que o novo governo americano encaminhará."

Thiago Carlos, economista do UBS, aponta como principal fator de risco "a eventual ausência de um equilíbrio político que provoque desancoragem das expectativas fiscais". Ele cita como exemplo a não aprovação de reformas estruturais no Congresso. "Nesse cenário, o PIB se contrairia de forma mais intensa e o câmbio se desvalorizaria; seria um complicador para a convergência da inflação para meta." Carlos acrescenta o risco de aumento mais acentuado da taxa de juros nos Estados Unidos, "tapering" na União Europeia e/ou desaceleração mais forte da economia chinesa. "Esses eventos externos, se confirmados, podem aumentar a volatilidade nos preços de ativos globais", afirma.

O Departamento de Pesquisa Macroeconômica do Itaú Unibanco trabalha com a perspectiva de que "internacionalmente as mudanças na política econômica americana sejam suaves ¬ com moderado estímulo fiscal e sem maiores rupturas no comércio internacional ¬ e, domesticamente, que se complete essa etapa da agenda fiscal, com a aprovação da reforma da previdência". Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista¬chefe do Banco Fator, a maior fonte de incerteza é a política doméstica e chama a atenção para a "agenda muito apertada".

"O posicionamento para 2018 está cada dia mais próximo, e Temer está entre uma reforma ministerial, a Lava¬Jato e a proposta de reforma da previdência. Um tema cada dia mais presente vai ser crescimento versus ajuste fiscal. O próprio governo adotou estratégia para termos aumento real de gastos em 2017, o que pode compensar em parte a trajetória de estagnação da atividade no que toca decisões privadas. O ajuste fiscal trará de volta o tema mais impostos." Sílvio de Campos Neto, economista da Tendências Consultoria Integrada, cita entre as preocupações internas a crise fiscal do Estados. "A crise dos Estados situação política no Brasil estão no front das preocupações. A Lava¬Jato segue como um elemento de risco contínuo ao governo Temer. A aprovação da reforma da Previdência é fundamental e eventual aumento da tensão política dificultaria tal desfecho. Uma retomada econômica ainda mais lenta colocaria pressão adicional no governo", avalia.

Newton Rosa, superintendente de Economia da SulAmérica Investimentos, destaca como um risco de cunho político a demora para a economia brasileira dar sinais de superação da recessão. "Essa demora pode minar a governabilidade do presidente Temer, limitando sua capacidade de levar adiante sua agenda de reformas fiscais", afirma. "Pressões inflacionárias podem estar presentes diante da percepção de que o endividamento público sem sinais de estabilização. A pressão inflacionária viria pelo canal do câmbio que responderia ao aumento do risco país."

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