Quinta-feira

Imóvel para média e alta renda supera crise da pandemia

Assim como sinalizado pelas prévias operacionais, as incorporadoras com foco nos padrões médio e de alta renda apresentaram resultados fortes, no terceiro trimestre, com crescimento de receita, margem e, consequentemente, melhora da última linha do balanço.

Empresas aproveitaram o período para lançar projetos e atender à demanda que tinha sido represada nos primeiros meses da pandemia de covid-19. A continuidade do bom desempenho é esperada para o quarto trimestre. No segmento de baixa renda, porém, não se verificou um cenário tão positivo.

A receita também teve expansão, mas a luz amarela se acendeu, com preocupações da pressão do aumento dos custos de matérias-primas sobre as margens. Em imóveis de maior valor tem sido possível repassar para os preços altas nos custos, o que se mostra mais difícil nas unidades populares devido ao teto dos valores do programa habitacional Casa Verde e Amarela.

Cyrela, EZTec, Even, Mitre e Moura Dubeux se destacaram entre as incorporadoras de médio e alto padrão, no trimestre, na avaliação de analistas. O momento favorável vivido pelo setor trouxe de volta divulgações de metas do Valor Geral de Vendas (VGV) a ser lançado.

EZTec puxou a fila e foi seguida por outras empresas como Trisul e Tecnisa no anúncio de projeções para o biênio 2020-2021, indicando crescimento acentuado. De julho a setembro, as vendas de lançamentos e de estoques chamaram a atenção, estimuladas pela demanda represada nos primeiros meses da pandemia e pelos juros baixos.

O aquecimento dos negócios de unidades na planta estimulam incorporadoras a apresentar novos projetos. Por outro lado, a venda de estoques significa aumento relevante de receita, pois o indicador é contabilizado proporcionalmente ao avanço das obras.

As incorporadoras de média e alta renda têm conseguido boa rentabilidade na comercialização das unidades em estoque, seja pela redução de descontos que vinham sendo praticados, seja por aumento de preços para recompor custos. Lançamentos também têm apresentado boas margens futuras.

Em relatório sobre os resultados da Cyrela, Even, EZTec e Moura Dubeux, os analistas do Credit Suisse Daniel Gasparete, Pedro Hajnal e Vanessa Quiroga ressaltam que “as empresas já começaram a colher os frutos deste bom momento para o setor”. Já Alex Ferraz, analista de mercado imobiliário do Itaú BBA, destaca que o terceiro trimestre “premiou quem tomou risco de lançamentos, caso de Cyrela, Even e Mitre”.

Mais tradicional incorporadora brasileira, a Cyrela teve recorde trimestral de lucro líquido, de R$ 1,4 bilhão de julho a setembro. O desempenho foi impulsionado pelas ofertas iniciais de ações (IPOs) das subsidiárias Lavvi, Plano & Plano e Cury, mas a companhia também apresentou melhora de receita e margem. A EZTec aumentou seu lucro líquido em 96%, para R$ 119,8 milhões.

Desconsiderando-se a venda do EZTowers, o lucro trimestral da companhia fundada por Ernesto Zarzur foi recorde desde 2015. O lucro da Even cresceu 147%, para R$ 40,8 milhões. A Moura Dubeux reverteu o prejuízo de R$ 19,9 milhões do terceiro trimestre de 2019 e obteve lucro de R$ 13,1 milhões.

A Mitre registrou lucro atribuído aos controladores de R$ 22,54 milhões no terceiro trimestre, com alta de 305% na comparação anual. Em conjunto, as incorporadoras de capital aberto lançaram, de julho a setembro, R$ 8,43 bilhões, com crescimento de 31,4% na comparação anual. As vendas líquidas tiveram expansão de 47%, para R$ 7,82 bilhões.

O levantamento feito pelo Valor considera a parte própria das companhias nos empreendimentos e inclui Cury, Cyrela, Direcional, Even, EZTec, Gafisa, Helbor, Lavvi, Melnick Even, Mitre, Moura Dubeux, MRV, PDG Realty, Plano & Plano, RNI Negócios Imobiliários, Rossi Residencial, Tecnisa, Tenda, Trisul e Viver.

As empresas mais concentradas no programa habitacional não tinham suspendido lançamentos nos primeiros meses da pandemia, mas aceleraram o processo de apresentação de projetos ao mercado no terceiro trimestre. O bom desempenho operacional, antecipado na divulgação das prévias, se refletiu na receita, porém há preocupação com os impactos nas margens frutos dos aumentos de despesas com matérias-primas.

“As obras passam a custar mais e podem atrasar devido aos prazos mais longos para recebimento dos insumos”, diz um analista que pediu para que seu nome não fosse citado. Ele ressalta que as incorporadoras de maior porte com foco na baixa renda têm ganhado participação de mercado.

 

Fitch mantém rating do Brasil em BB-, com perspectiva negativa

A Fitch Ratings manteve o rating do Brasil em “BB-”, com perspectiva negativa. Em maio, essa perspectiva havia sido reduzida de “estável” para “negativa”. Segundo a agência de classificação de risco, a perspectiva reflete a severa deterioração do déficit orçamentário e da dívida pública este ano e a incerteza persistente quanto às perspectivas de consolidação fiscal, incluindo a sustentabilidade do teto de gastos.

Além disso, a Fitch afirma que os crescentes vencimentos da dívida interna de curto prazo em meio a um pesado fardo da dívida pública tornam o Brasil vulnerável a choques, incluindo mudanças na confiança dos investidores domésticos e nas condições de financiamento. “Embora a equipe econômica esteja comprometida em retornar à agenda de reformas em 2021, o ambiente político permanece fluido, reduzindo a visibilidade e previsibilidade do processo”.

A Fitch espera que a economia se recupere a partir de 2021, mas diz que a incerteza em torno dos desenvolvimentos políticos e políticas econômicas, combinada com um aumento global dos casos de coronavírus, continua a obscurecer o cenário.

A agência prevê que o déficit nominal do governo aumentará para 16,7% do PIB, de cerca de 6,0% em 2019. “A recessão econômica e postergação de concessões tiveram um impacto adverso nas receitas, mas o grosso da deterioração veio de uma resposta fiscal considerável à pandemia, ou seja, o coronavoucher que deve custar cerca de 4,5% do PIB sozinho”.

A estimativa é que o déficit caia para cerca de 7% em 2021, com a retirada das medidas de apoio e a recuperação da economia. No entanto, afirma que existe uma incerteza considerável quanto à capacidade do governo de cumprir o teto de gastos.

“A incerteza contínua em torno da evolução da pandemia e as pressões de gastos podem tornar isso desafiador, como destacado pelas recentes discussões sobre a introdução de uma nova transferência social (Renda Cidadã). O espaço para cortar gastos discricionários diminuiu substancialmente nos últimos anos e resta saber se o governo será capaz de acomodar novas transferências sociais cortando gastos obrigatórios em outros lugares”.

Na opinião da Fitch, a flexibilização do teto de gastos para acomodar novas iniciativas de gastos poderia minar a âncora fiscal e prejudicar a confiança dos mercados. Articulação por reformas Após o “orçamento de guerra” este ano, que permitiu o enfrentamento da pandemia de coronavírus, o Brasil precisa voltar para uma trajetória de consolidação fiscal em 2021, segundo a Fitch.

Entretanto, a agência de rating afirma que a falta de clara articulação política pode prejudicar avanço das reformas no próximo ano. Segundo a Fitch, o ambiente político do Brasil permanece fluido, com tensões periódicas entre o Executivo e o Congresso, que reduzem a visibilidade das perspectivas de reformas pós-pandemia. As recentes eleições municipais também paralisaram as discussões no Congresso sobre as reformas.

“O governo Bolsonaro tem cortejado o apoio de partidos de centro em um Congresso fragmentado, mas a capacidade de tal aliança para aprovar profundas reformas econômicas permanece incerta. Embora o Brasil tenha um ambicioso conjunto de reformas em andamento, a falta de uma articulação política clara sobre seu sequenciamento e priorização, bem como interesses particulares, pode dificultar seu progresso em 2021”.

Entre os projetos de reformas, a Fitch aponta a emenda constitucional que permitiria a invocação de uma 'emergência fiscal' para facilitar os cortes de gastos, o que poderia aumentar a flexibilidade orçamentária e a sustentabilidade do teto de gastos. Além disso, lembra que o governo apresentou recentemente uma reforma do setor público para conter o custo da folha de pagamento e melhorar a eficiência no médio prazo.

O governo também apresentou uma reforma tributária em julho, com o objetivo de simplificar o sistema altamente complexo e oneroso. Já o Senado aprovou recentemente o projeto de lei para conceder autonomia formal ao Banco Central, que ainda precisa de aprovação da Câmara dos Deputados.

A Fitch projeta que a dívida do governo aumentará para quase 95% do PIB em 2020, de 75,8% em 2019, e aumentará mais gradualmente depois da recuperação econômica e consolidação fiscal. Embora fatores pontuais, como pré-pagamentos de empréstimos pelo BNDES e progresso nas privatizações, possam melhorar temporariamente essa trajetória da dívida, “uma estabilização permanente exigiria uma redução mais rápida do déficit primário”.

A agência aponta que o atual ambiente de juros baixos garante o financiamento da dívida, mas não é uma panaceia para as fragilidades fiscais subjacentes.

 

Senado aprova terceira etapa do Pronampe com nova linha de crédito

O Senado aprovou, nesta quarta-feira (18), projeto de lei que institui a terceira fase do Pronampe, programa de crédito para microempresas e empresas de pequeno porte.

O programa foi criado inicialmente para auxiliar empresas em dificuldades durante o período de pandemia do novo coronavírus. O texto agora segue para a Câmara dos Deputados. Se aprovado na outra Casa legislativa, sem alterações, segue para a sanção do presidente Jair Bolsonaro (sem partido)

O Pronampe ( Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte) foi criado no mês de maio na tentativa de amenizar as perdas de pequenos empresários durante a pandemia da Covid-19.

O projeto de autoria do senador Jorginho Mello (PL-SC) prevê a abertura de linhas de créditos para os empresários, que serão concedidas por bancos, bancos de desenvolvimento, cooperativas de crédito.

O governo federal, por sua vez, vai disponibilizar recursos para garantir essas operações de crédito. Estão previstos nessa etapa do programa aportes de R$ 10 bilhões. Nas duas fases anteriores do Pronampe, foram destinados R$ 28 bilhões para o FGO (Fundo Garantidor de Operações).

Inicialmente, o projeto de lei que estabelecia a terceira etapa do programa previa uma elevação dos juros dos empréstimos, que passaria de 1,25% mais a taxa Selic (2%) - índice adotado nas fases anteriors - para 6% acrescido da taxa Selic.

No entanto, a relatora da proposta, senadora Kátia Abreu (PP-TO), afirmou que ela e o autor do projeto decidiram manter a taxa de juros a ser cobrada. O argumento é que os recursos garantidores vieram por meio de recursos extraordinários, que perderiam a validade ao fim do ano.

"Essa terceira tranche seria diferente. Por quê? Porque nós enjoamos de arrumar dinheiro, e os bancos não multiplicarem o nosso dinheiro. Ficavam só emprestando de um para um. E aí, eu e Jorginho, negociamos muito com o Ministério da Economia, no sentido de que cada um real colocado viraria mais quatro. Então, ao invés, de R$10 bilhões, ficariam R$40 bilhões", explica a relatora, em relação à proposta inicial.

"Esse dinheiro pode ser postergado para o ano que vem? Não! Porque é crédito extraordinário. Está dentro do decreto da pandemia. Então, o que adianta a gente subir os juros agora para Selic mais 6, se em 30 dias ninguém vai conseguir tomar ninguém não vai conseguir tomar R$40 bilhões", completa.

O Pronampe é destinado para microempresas, com faturamento de até R$ 360 mil por ano e também para empresas de pequeno porte, com faturamento de R$ 360 mil a R$ 4,8 milhões. As empresas podem contratar crédito em até 30% do seu faturamento anual.

A carência para o início dos pagamentos é de seis meses, condição prevista nas etapas anteriores e mantida no projeto aprovado pelos senadores. Os pagamentos podem ser parcelados e devem ser quitados em um prazo de 36 meses - período que inclui a carência.

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), afirmou que existe a possibilidade de o programa se tornar permanente, com recursos no orçamento do próximo ano.

"Eu quero lembrar que o Congresso Nacional sempre terá a liberdade, a iniciativa na proposta orçamentária para o ano que vem, que nós ainda vamos deliberar, de tentar encontrar um espaço fiscal para que nós tenhamos um orçamento para o Pronampe no próximo ano para que essas operações, que se mostraram tão efetivas, tão positivas se mantenham", afirmou.

 

 ‘Quando há um governo de má qualidade, é preciso impor a restrição fiscal de fora pra dentro’

Segundo o ex-presidente do Banco Central, para evitar uma crise completa nas contas públicas, será preciso uma reforma administrativa que pegue todo mundo e uma reforma tributária que acabe com as distorções; a dúvida é se o governo tem coragem para articular isso com o Congresso

Para o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore, um dos economistas mais respeitados do País, o Brasil não vai conseguir andar muitos metros se não resolver urgentemente a questão das contas públicas. O País chega ao final deste ano com uma dívida próxima a 100% do PIB, após gastos bilionários para conter os efeitos da pandemia da covid-19. E as perspectivas não são boas – a projeção, segundo Pastore, é continuar crescendo até pelo menos 2028 ou 2029, quando chegaria a 110% do PIB. Em resumo, uma grande crise fiscal.

Para o economista, não há outra solução para esse problema que não seja fazer uma transferência de renda cortando gastos – ou seja, deixar de gastar com benefícios a servidores e subsídios ineficientes para que sobrem recursos. Para isso, é preciso que as reformas estruturais, como a tributária e a administrativa, saiam do papel. Mas o seu grande temor é que nada disso aconteça ¬– e, pelo contrário, o governo simplesmente eleve os gastos, por conta das pressões que devem vir no ano que vem.

Pastore, colunista do Estadão, inaugura a série de entrevistas que vão discutir saídas para a crise fiscal que ronda o País. 

● Qual tem sido o impacto da pandemia da covid-19 para a economia brasileira?

A pandemia pegou o Brasil numa situação fiscal muito frágil. O Brasil, como todos os países, teve de gastar e gerou um déficit primário (despesas superiores às receitas) que levou a dívida para próximo de 100% do PIB. Isso é uma restrição importante ao crescimento econômico. Não podemos fugir de fazer um ajuste fiscal sério, e a pandemia ainda não terminou. O País entrou em uma recessão, curta, e agora estamos saindo dela.

● Está em curso uma recuperação rápida?

Não tenho dúvida de que foi rápida, mas a questão aqui não é o ano de 2020, mas o de 2021. A recuperação foi rápida porque se desligou a economia, a máquina parou e depois foi ligando de novo e voltou a funcionar. Só que nos três anos anteriores o Brasil crescia a 1% ao ano e a perspectiva que temos para 2021 é de um crescimento muito lento. Se é que vamos ter algum. Se tirar o “carry over” (efeito estatístico pelo qual o nível de atividade de um ano passa para o seguinte), que pode ser de 2,5%, 3%, a perspectiva para 2021 é de uma economia estagnada.

● Pode, na prática, não ter crescimento em 2021?

Se tiver crescimento, é muito pequeno. Olhando hoje o cenário é muito mais na direção de ter uma economia parada ao longo de 2021. O auxílio emergencial foi fundamental para fazer a recuperação rápida. Pegou 66 milhões de pessoas, garantiu a renda delas, que compraram bens. O lado positivo é que a recuperação foi rápida. O lado negativo é que isso levou a dívida pública para perto de 100% e gerou um problema fiscal que herdamos de 2020 e 2021. Mesmo cumprindo o teto de gastos (regra prevista na Constituição que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação), ela ainda vai crescer até 2028, 2029, quando vai chegar perto de 110% do PIB. 

● Quais serão as consequências desse cenário?

Uma dívida muito maior e com uma dinâmica muito pior. Subiu o prêmio de risco dos títulos públicos. Isso torna a administração da dívida mais difícil, aumenta a incerteza, o que reduz investimento em capital fixo (edifícios, máquinas e equipamentos) e o crescimento do PIB potencial (a capacidade de produção de uma economia utilizando todos os recursos disponíveis, sem pressionar a inflação). Gera também uma depreciação cambial (aumento do dólar), na qual o câmbio fica muito acima da taxa de equilíbrio.

● A vitória do Joe Biden nas eleições americanas melhorou os indicadores. O que pode se esperar?

A eleição de Biden ajuda.  Mas nosso problema não é bem internacional. É doméstico. Com toda a ajuda internacional advinda da vitória de Biden, se o Brasil não resolver o seu problema doméstico, não vai andar muitos metros. Refluiu um pouco por causa da euforia com a eleição do Biden. Mas é um movimento transitório. Não é permanente. Para botar o câmbio de novo num nível mais forte, menos depreciado, tem que tirar o risco fiscal, garantir que essa trajetória  seja sustentável. Para isso, é preciso uma âncora fiscal. A âncora que existe hoje é do teto de gastos. O governo tem um dilema que é voltar para o teto de gastos ainda que a pandemia continue.  Se não mantiver o teto, o prêmio de risco vai depreciar mais o real e alta do dólar acaba migrando para os preços domésticos e produzindo subida de inflação, que em certo sentido já vem ocorrendo.

● Esse movimento, que seria transitório, dá um tempo maior para o Banco Central?

O BC não tem de agir agora. Roda o filme para frente. Se o câmbio para de depreciar ou valoriza, não tem problema de inflação. Agora, desde o começo do ano, ele não parou de depreciar porque existem dúvidas sobre a ancoragem fiscal. O problema não é do BC. É do Ministério da Economia e do governo. Eles têm de enfrentar para que o País saia dessa armadilha fiscal na qual estamos. Se sairmos, o câmbio talvez até valorize e esses sinais de inflação que estão começando a acontecer murcham. O BC não teria de subir os juros. Mas, se ficar validada uma certa teoria que existe dentro do governo, principalmente de alguns ministros, de que deveria aumentar gasto...

● Qual a saída para se evitar a crise fiscal?

Fazer uma transferência de renda cortando gastos. Não significa aumentar gastos. Se o governo fizer reformas que economiza outros gastos e, com isso, transferir renda para quem estiver desempregado, não é um erro. É remanejamento de gastos.

● Não poderia haver um ajuste no teto, um meio termo? Uma flexibilização transparente do teto para permitir mais investimento ao mesmo tempo em que são feitas as reformas, como defendeu o economista Armínio Fraga em entrevista ao “Estadão”?

O Armínio é um sujeito respeitável, mas eu discordo do que ele está dizendo. Se tivéssemos um governo com uma agenda de reformas, que tivesse enfrentando seriamente, corrigindo as distorções que existem no Brasil com um programa bem feito, talvez aquilo que o Armínio está propondo funcione. Agora, nós não temos um governo com essa qualidade. Eu discordo do Armínio porque ele está supondo que nós temos um governo.  A minha hipótese é que temos um governo muito fraco. Um presidente da República que não tem um programa. Um ministro da Economia que não tem um programa e vários outros ministros gastadores que têm programas demais. E em vez de pensar em resolver o problema do País, o nosso presidente pensa na sua eleição em 2022 para manter a sua popularidade. Isso faz que o esquema proposto pelo Armínio não tenha qualquer chance de frutificar e dar bom resultado.

● Por quê?

Quando há um governo de má qualidade, é preciso impor a esse governo a restrição fiscal de fora para dentro. Essa restrição está implantada na Constituição. Se esse governo resolver mudar de roupagem, de ideologia, de forma de pensar sobre o Brasil e disser “não, desculpe, eu cometi um erro, vou sim fazer uma reforma administrativa dura, que pega os funcionários atuais e os que vão entrar” e, com isso, abrir espaço no teto para fazer transferência para as famílias de renda mais básica, eu retiro as minhas críticas. Mas o que eu estou vendo esse governo fazer não é isso. O que se discute é uma forma de flexibilizar o teto para, no fundo, continuar gastando. Um País que já gastou tudo que podia gastar. Nas condições de governo que temos, não podemos deixar de exigir que se mantenha a âncora fiscal.

● Há risco de o governo tentar segurar a inflação com intervenção maior no câmbio?

A única coisa que eu digo é: o risco é fiscal. Ele se manifesta nos mercados. Ou ele se manifesta no mercado de juros, e se manifestou e inclinou a curva, ou se manifesta no mercado de câmbio, e se manifestou e depreciou (o real). Se intervier no mercado de juros achatando a curva de juros, não elimina o risco. O risco vai para o câmbio e aumenta a pressão sobre o câmbio. Se intervier no mercado de câmbio e evitar uma depreciação, o risco não foi eliminado, ele migra para o mercado de juros. Você não escapa. Não tem capacidade se segurar esse câmbio.

● O ambiente político, com uma disputa ferrenha pela eleição da Câmara, atrapalha?

No passado, tínhamos uma coisa que se chamava presidencialismo de coalizão. Ela existiu no governo FHC, quando tinha três partidos, o PMDB, PSDB e PFL, que fizeram um acordo prévio. A reeleição foi um erro que trouxe consequências. Depois, tivemos a derrubada da cláusula de  barreira pelo Supremo (exigência para que partidos atinjam desempenho mínimo na votação para continuar tendo direito à propaganda gratuita e ao fundo partidário). De lá para cá, liquidou-se com a possibilidade de ter um presidencialismo de coalizão. A pulverização partidária aumentou e hoje temos vinte e poucos partidos e o governo tem de fazer uma coalizão em torno de interesses pessoais e de facções dos partidos. O que estou fazendo é uma crítica direta ao Centrão, que dá suporte o presidente no Congresso. O Centrão não é um grande partido de centro, mas uma coalizão de partidos fisiológicos que só aprovam à custa de transferência de renda para o seu Estado, uma determinada estatal, o que no fundo torna extremamente difícil fazer reformas que cortem gastos.

● Mas o presidente também não mostra disposição de perder a popularidade com medidas duras de corte de gastos…

Não, não tem da parte do presidente simpatia por um modelo que produz mais austeridade fiscal. E não há da parte do Congresso o desprendimento de saber que o Brasil precisa de apoio. Numa situação como esta, vamos chegar ao fim deste ano com desemprego em 16%. É só fazer conta. Não é o pico. No começo de 2021, vai subir ainda mais. Vira o ano com zero de ajuda emergencial para os 66 milhões que recebiam e um desemprego de 16%. Olha a pressão que vem para aumentar gasto!

● Como se responde a essa pressão?

Fazer uma transferência de renda cortando gastos. Não significa aumentar gastos. Se o governo fizer reformas que economiza outros gastos e, com isso, transferir renda para quem estiver desempregado, não é um erro. É remanejamento de gastos.

● Há um movimento nessa direção?

Não. Então, vemos pressão sobre o câmbio, inflação e o coitado do BC tendo de conviver com esse tipo de dilema.

● O BC vai responder como?

Já vimos algumas reações. Estamos vendo o Roberto Campos Neto (presidente do BC) lutando e conseguindo uma vitória importante quando convenceu o Davi Alcolumbre  (presidente do Senado) a votar a autonomia do BC. Ele tem de ter autonomia. Ele pode mexer na taxa de juros à vontade, mas se o presidente quiser demitir o presidente do BC , ele põe alguém mais dócil e está tudo feito. O BC sabe que corre o risco de subir juros. Se ele não tiver as condições adequadas e o câmbio começar a depreciar, vai ser compelido a subir. Se ele subir a taxa, precisa ter independência política. Se a parte fiscal falhar, o risco de subir é muito alto.

● O presidente do BC estaria, então, se preparando, com a autonomia, para pressões futuras no caso de ter de subir os juros?

Isso. Ele jamais vai confessar. Se eu estivesse no lugar dele, estaria fazendo a mesma coisa.

● Há condições de avançar até final do ano a votação das propostas econômicas?

Eu gostaria que pelo menos a PEC emergencial (com medidas de cortes de despesas, principalmente relacionadas a servidores) fosse aprovada até o final do ano. Não tenho esperança que saia a reforma tributária, administração, nada disso.

● Como a economia do Brasil entra 2021?

Entra com muita incerteza, entra com investimento lá embaixo, economia andando de lado, pressão sobre o câmbio e o risco da inflação subir em 2021. É um cenário muito feio.

● A equipe econômica do ministro Paulo Guedes está negando essa visão?

Não consigo ver uma estratégia que faça sentido para resolver o problema. Não sei o que eles estão querendo ganhar de tempo. Mas sou crítico à forma como estão conduzindo a situação. Ela vem falhando muito na concepção da agenda de reformas e está com timing e  objetivos errados.

● O que pode ajudar a melhorar a economia?

Uma reforma administrativa bem feita que abranja tudo e uma reforma tributária que tire as distorções, a PEC 45 (proposta de reforma tributária que tramita na Câmara). Essas duas coisas ajudam muito.

● Há risco de dominância fiscal?

É uma situação na qual, devido à expansão fiscal muito forte, a eficácia da política monetária desaparece. A capacidade da política monetária controlar a inflação,  no limite, pode até desaparecer. Se o governo ficar preso ao teto, não vejo esse risco. Vejo a potência da política se mantendo e a capacidade de o BC controlar a inflação. Mas, se abandonar e furar o teto, aí sem dúvida ficamos sujeitos à dominância fiscal.

 

 

 

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