CLIPPING (13.02.2019)
VALOR
Unificação da Previdência é fundamental, diz Arminio Fraga
Defensor de uma reforma da Previdência “impactante”, o expresidente do Banco Central Arminio Fraga afirmou não ver “como uma proposta bem-sucedida possa acontecer sem que, no final, tendo sido superada a fase de transição, só exista um sistema no Brasil”. “Acho que isso é fundamental. A ideia é unificar o sistema público e o sistema privado, com contribuições absolutamente iguais. O desenho de reforma que, a meu ver, vai vingar, e creio que alguma coisa vai acontecer, vai ter essa cara, vai ficar igual para todo mundo”, disse, durante palestra na Associação Comercial do Rio de Janeiro.
Arminio defendeu ainda um modelo em que exista um benefício básico. “Aí pode ser rural ou não rural, também igual para todo mundo; existem várias nuances, paga ou não paga. O Brasil ainda está nessa de [ter] muita informalidade. O único caminho bom é o caminho de unificação geral”, disse.
Para sócio-fundador da Gávea Investimentos, a volta da ideia de aproveitar a reforma da Previdência apresentada pelo governo Temer seria um retrocesso em termos de impacto econômico das mudanças no sistema de aposentadoria. “Seria um retrocesso quantitativo; qualitativamente tudo bem. E se pegarmos o texto emendado, daí é que não funciona”, disse. >> Leia mais: Secretário apresenta reforma a Guedes e fala em diferenças
O aproveitamento da reforma de Temer foi defendido nesta manhã pelo senador Major Olímpio (PSL-SP), depois de encontro do parlamentar com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Para Arminio, mesmo a reforma desenhada pelo governo Bolsonaro não resultará no ajuste ideal para o equilíbrio das contas públicas.
Pelos cálculos do ex-presidente do BC, “o ideal seria uma reforma que gerasse [economia de] 2,5% do PIB ao ano”, e não de 1,5%, como seria o impacto da proposta do Executivo, que ainda passará por emendas no Congresso, com a possibilidade de redução de seu efeito. “Acho que o ideal seria uma reforma que gerasse 2,5% do PIB ao ano. É bastante.
A reforma que foi apresentada pelo governo agora e sinalizada está falando de R$ 1 tri. O PIB é R$ 7 trilhões. Então dá uns 15% do PIB em dez anos, 1,5% por ano. O risco é cair do 1,5%, o que em geral acontece no Congresso. O que nós precisamos é o oposto, de que ocorra mais. Não tenho muita esperança, mas quero registrar”, disse.
Para Arminio, “isso é absolutamente necessário e seria o início de um fantástico período de tranquilidade econômica para o Brasil crescer e arrumar a casa e se desenvolver”. “Muito complicado esse assunto. Espero que ainda haja tempo para fazer uma revisão para cima”, disse.
Otimismo com aprovação da Previdência aumenta no mercado, aponta Bofa
A reforma da Previdência é crucial para que as apostas do mercado se tornem mais favoráveis ao Brasil, de acordo com 82% de investidores consultados pelo Bank of America Merrill Lynch (Bofa). A relevância da medida é tamanha que esse percentual está inalterado há três meses, mas o nível de otimismo parece ter aumentado desta vez. A pesquisa do Bofa foi feita entre os dias 1º e 7 de fevereiro, com 28 gestores que têm aproximadamente US$ 86 bilhões em ativos sob administração.
Agora, um recorde de 93% dos investidores afirma que a reforma será aprovada este ano, contra 91% no mês passado e acima da mínima de 53% em junho do ano passado. Além disso, um terço dos entrevistados diz que a aprovação deve ocorrer ainda no primeiro semestre, acima da parcela de 22% em dezembro. O otimismo com a medida também se reflete nas apostas para os preços de mercado.
Quase 90% dos investidores afirma que o Ibovespa superará os níveis atuais, de cerca de 95 mil pontos, até o final do ano. A parcela é igual ao do mês passado, mas o patamar projetado agora é muito maior: 29% dos investidores veem o principal índice da Bolsa acima de 120 mil pontos, contra apenas 9% no mês passado. A expectativa de 64% dos participantes é de que as ações no Brasil terão desempenho superior à média nos próximos seis meses. A confiança também se reflete sobre o desempenho esperado do câmbio, já que 18% dos investidores acreditam que o real se destacará ante os pares.
Para 39% dos entrevistados, a taxa de câmbio terminará o ano abaixo de R$ 3,60 por dólar, mostrando uma ligeira melhora ante o mês passado (32%). As expectativas gerais em relação à nova administração também melhoraram e, agora, 82% dos entrevistados afirmam que o Brasil deve recuperar seu grau de investimento durante o governo de Jair Bolsonaro. Esse percentual subiu em relação aos 67% na pesquisa anterior.
Apesar da empolgação no mercado, que tem derrubado também o nível do risco-país, especialistas já apontaram, anteriormente, ao Valor que a decisão de rating pelas principais classificadoras de risco é um processo lento e que a recuperação do grau de investimento só deve ocorrer com uma clara correção da dívida pública. Com expectativas elevadas, entretanto, há um risco crescente de decepção quando se trata de timing, destaca o Bofa, já que o governo está considerando enviar ao Congresso uma proposta totalmente nova de reforma previdenciária, prolongando o processo de votação.
O posicionamento de risco atingiu novas máximas e aumentou em todos os meses desde as eleições. Desta vez, quase metade dos participantes afirma estar assumindo riscos acima do normal, enquanto os níveis de caixa ainda estão próximos de mínimas históricos. Os “riscos de cauda” na América Latina - aqueles com baixa probabilidade de se concretizarem, mas alto impacto no mercado - continuam sendo a desaceleração econômica da China e a falta de reformas, mas agora um dólar forte se tornou um risco relevante.
Para aparar arestas, Bolsonaro dará 'repaginada' em MP do Saneamento
O governo Jair Bolsonaro pretende dar uma "repaginada" na proposta de novo marco legal do saneamento básico. A ideia é apresentar uma versão própria do texto que reforma a legislação do setor e está em tramitação no Congresso Nacional. Um encontro com executivos das companhias de água e esgoto, parlamentares e potenciais investidores deve ocorrer no fim deste mês ou início de março para a divulgação do conjunto de mudanças. Uma medida provisória foi reeditada na última semana de Michel Temer com a caneta presidencial, mediante o consentimento da equipe de transição, que reconheceu a necessidade de tratar o assunto com urgência.
Agora, o Ministério do Desenvolvimento Regional prepara ajustes no texto que saiu do Palácio do Planalto em 27 de dezembro. O prazo para emendas à MP 868 terminou na segunda-feira à noite. Deputados e senadores entregaram 477 propostas de alteração - número considerado bastante elevado e que reflete as controvérsias em torno do tema.
Logo no início do ano, paralelamente à tramitação legislativa, o ministério quis abrir um canal de diálogo com interessados e recebeu sugestões de aperfeiçoamentos à MP. Essa coleta de contribuições durou até meados da semana passada. Agora, a Secretaria de Saneamento Ambiental trabalha em um texto que será encaminhado para o futuro relator como possível substitutivo. "Mantivemos uma interlocução ampla com todo o setor", afirma o secretário Jônathas de Castro.
Ele garante que três linhas-mestras continuarão orientando o novo marco legal: abertura à iniciativa privada, segurança jurídica e estabilidade regulatória. "Não vamos tomar partido nem do mercado público, nem do mercado privado, mas do que for melhor para políticas públicas de saneamento."
A presidência da comissão mista responsável pelas discussões da medida provisória caberá a um deputado e a relatoria a um senador, conforme o rodízio das Casas. Os nomes serão definidos somente após a escolha das lideranças do governo no Senado e no Congresso. E o ministério prefere ter um relator já nomeado para apresentar o novo texto. Enquanto isso, há pressão de todos os interessados.
O deputado Samuel Moreira (SP) e o senador Izalci Lucas (DF), ambos do PSDB, protocolaram emendas pedindo a retirada do artigo 10-C - provavelmente o trecho mais polêmica da medida provisória. Esse ponto obriga as prefeituras a fazer chamamentos públicos para contratar obras e serviços de saneamento, estimulando a concorrência no setor. Antes, os municípios podiam fazer contratação direta com companhias públicas. Na semana passada, o vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (DEM), defendeu uma mudança na MP. Da forma atual, segundo ele, a Sabesp perderá competitividade e o governo seria praticamente forçado a privatizar a empresa.
Ele prefere a capitalização. "O que defendemos abertamente é que tenha uma emenda na medida provisória do saneamento excetuando as estatais não dependentes do Tesouro [da perda de preferência]. Com isso, a Sabesp poderia continuar competitiva e, a partir daí, o projeto de capitalização", disse Garcia. Uma carta entregue ao governo por quatro associações vai na mesma linha. "Se mantido, o dispositivo permitirá que a iniciativa privada dispute com as companhias públicas apenas os municípios superavitários.
Com isso, as companhias públicas poderão perder o equilíbrio financeiro e serão obrigadas a atender os municípios mais problemáticos, o que limitará a capacidade de investimento do setor público e levará ao sucateamento dos serviços", afirmam a Abar (associação das agências reguladoras), Abes (engenharia ambiental), Aesbe (empresas estaduais de saneamento) e Assemae (municipais).
Outros pontos defendidos pelas entidades são a ampliação de tarifas sociais para consumidores de baixa renda e a desoneração de PIS/Cofins, segundo o presidente da Abar, Fernando Franco. Para o engenheiro Carlos Eduardo Castro, diretor do grupo privado Águas do Brasil, que detém 13 concessões espalhadas pela região Sudeste, a abertura de chamamentos públicos pelas prefeituras ou consórcios municipais é "extremamente relevante" para impulsionar investimentos no setor.
Ele contraria o argumento das associações de que as empresas privadas ficarão de olho só no "filé" e deixarão o "osso" de lado. "Estamos interessados em bons projetos, isso sim. Mais de 72% dos serviços de saneamento operados pela iniciativa privada estão em municípios com menos de 50 mil habitantes", rebate o executivo. Castro prefere ver a questão de outra forma. Hoje as estatais têm uma vantagem em cidades menores, mas não oferecem soluções atrativas. Resultado: 104 milhões de brasileiros não têm esgoto tratado. "É ingenuidade imaginar que vamos mudar tal cenário se essas questões não forem atacadas", afirma.
Desde 2007, segundo informações do governo federal, 160 contratos de Estados e municípios para obras e serviços foram cancelados. Esses projetos receberiam R$ 3,5 bilhões do Orçamento Geral da União (OGU), em repasses só do extinto Ministério das Cidades, a fundo perdido. "Os Estados e as concessionárias públicas não conseguiram executar os empreendimentos previstos, basicamente obras de saneamento ou elaboração de projetos executivos de engenharia", afirma trecho da exposição de motivos da MP 868.
'Vai demorar para consumo voltar a ser o que era em 2010'
Há uma demanda reprimida "gigantesca" na população e um otimismo "generalizado" entre os empresários, o que em tese pode levar a um crescimento mais forte da economia brasileira em 2019. Mas, depois de anos de recessão, de retomada frustrante da atividade e um desemprego insistentemente alto, cidadãos e empresas estão cautelosos, à espera de que as expectativas criadas durante a campanha eleitoral que levou Jair Bolsonaro à Presidência da República se tornem realidade.
Esse é o cenário traçado por Renato Meirelles, presidente e sócio do Locomotiva, Pesquisa e Estratégia, instituto que faz diagnósticos e mapeia tendências da sociedade e economia brasileiras. O Locomotiva tem registrado aumento significativo na demanda por informações de empresas que querem abrir fábricas, lançar linhas de produtos, investir em educação. Num otimismo moderado pelo alto desemprego, a população está menos animada que os empresários, mas ainda assim esperançosa, afirma o publicitário, que em 2012 fez parte da comissão que estudou a "nova classe média", na então Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República.
Especialista em consumo e opinião pública, Meirelles, que no início da década de 2010 fundou os institutos de pesquisa D ata Favela e o Data Popular, não prevê um boom de demanda doméstica tão cedo. "O consumo vai aumentar, mas vai demorar para alcançar o patamar de dez anos atrás. Enquanto a renda não voltar a crescer de forma consistente, não vamos restabelecer a sensação de bem-estar. Mais gente empregada e mais gente empreendendo são o que aumentam a sensação de bem-estar da população", afirma.
No front político, ele vê a sociedade brasileira mais exigente, disposta a fiscalizar o poder público e interessada em influenciar de alguma forma o rumo do país. Neste sentido, as redes sociais devem continuar importantes na mediação com o mundo político. "Isso cria um desafio adicional para os políticos, que é o de se manterem conectados a seus eleitores reais, sem achar que eles são apenas aqueles que os seguem nas redes sociais."
Meirelles diz que há um risco maior de frustração do eleitor, se o governo idealizado no processo eleitoral não se concretizar. Por outro lado, não concorda que as redes podem tudo. Em sua avaliação, a facada durante a campanha eleitoral fez Bolsonaro ter uma grande exposição nas reportagens de TV e isso contribuiu sua para a eleição, tanto quanto as redes. Confira a seguir os principais trechos da entrevista concedida pelo especialista:
Valor: Pesquisa feita pelo Locomotiva em meados do ano passado sobre a percepção do brasileiro a respeito de seu futuro pessoal e da economia mostrava certo pessimismo. Como está essa percepção hoje?
Renato Meirelles: Aquela pesquisa mostrava uma grande dissonância entre expectativa de melhora das finanças pessoais versus a melhora da economia brasileira. Quase 20 pontos percentuais separavam essas duas percepções. Em nosso último levantamento, esse número caiu para três pontos percentuais. Empresas e pessoas estão mais otimistas porque esperam crescimento do país após as eleições. Esse otimismo é maior entre os mais ricos e entre os empresários. A quantidade de novos briefings, de demanda de trabalho que estamos recebendo de companhias que querem abrir fábricas, lançar linhas de produtos, que querem voltar a investir em educação é gigante. A população está menos otimista que os empresários, mas acha que agora vai ser diferente, que vai ser melhor.
Valor: Por que a população está menos otimista?
Meirelles: Porque o emprego não voltou com a velocidade e o poder de compra do salário não se restabeleceu da forma que todos gostariam.
Valor: Os empresários já estão partindo para investir ou é mais prospecção?
Meirelles: Existe um otimismo generalizado e temos visto aumentar a quantidade de análises de cenários prospectivos pelo setor produtivo. As empresas devem investir mais neste ano que nos anos anteriores. O empresário está tentando entender o mercado e fazendo contas. O Brasil tem uma demanda reprimida gigantesca. O brasileiro quer voltar a ter um padrão de vida perdido na crise. Acredito que esse otimismo aponta para uma retomada real da economia.
Valor: Podemos estar às portas de um boom de consumo?
Meirelles: Teremos crescimento do consumo, sim, mas não será algo como em 2010 [quando o PIB cresceu 7,5%, com forte demanda das famílias]. Temos várias pesquisas que mostram que mesmo quem está empregado tem receio de consumir. Na crise, o brasileiro passou a fazer mais pesquisa de preço, aprendeu a escolher, ficou mais seletivo. Também ficou mais empoderado e usa muito as redes sociais para reclamar das empresas. São coisas que não devem mudar com a retomada da economia. Independentemente da velocidade da retomada da economia, a da demanda deve ser mais lenta porque o consumidor está mais cauteloso. Vai demorar para chegarmos ao patamar de consumo de dez anos atrás.
Valor: Existem riscos para a retomada da demanda?
Meirelles: Sim. Eventuais casos de corrupção no governo, que se elegeu sobre uma plataforma anticorrupção, que poderiam criar um sentimento de frustração. Uma eventual diminuição de benefícios sociais é outro risco, embora o presidente Jair Bolsonaro tenha prometido criar o 13º salário para os beneficiários do Bolsa Família. O governo tem um semestre para mostrar a que veio e para fazer efeito no bolso do consumidor. Isso mantém o bom humor das pessoas.
Valor: Podemos dizer que aquela nova classe média que surgiu com o crescimento da economia nos anos 2000 ainda existe?
Meirelles: Estamos no meio de um estudo muito grande para enxergar o impacto que essa nova classe média tem no Brasil de hoje. Sob um recorte puramente econômico, ainda há uma grande parcela - 54% - dos brasileiros na classe C. Ela continua o vetor principal da economia. Em termos de renda, a chamada nova classe média diminuiu menos na crise do que ela cresceu nos anos 2000. Ela é fundamental para o crescimento do país, mas é bem menos homogênea do que a gente acreditava.
Valor: Houve alguma mudança de comportamento do consumidor depois de três anos seguidos de queda de inflação?
Meirelles: A população não enxerga a queda da inflação como os economistas. Para ela, inflação é sempre um problema. Sempre existe a percepção de que as coisas estão mais caras. Enquanto a renda não voltar a crescer de forma consistente, não vamos restabelecer a sensação de bemestar das pessoas. Mais gente empregada e mais gente empreendendo são o que aumentam a sensação de bem-estar.
Valor: O trabalho do Locomotiva envolve mapeamento e análise das redes sociais e vimos que mesmo no pós-eleição elas parecem influenciar o debate, vide o processo de escolha da presidência do Senado. Qual o papel das redes sociais na política a partir de agora?
Meirelles: O papel real das redes continua grande na mediação entre políticos e população, mais que em qualquer outro momento, mas menos do que parte dos analistas considera. Na eleição presidencial, por exemplo, muita gente creditou a vitória de Jair Bolsonaro às redes sociais. Isso é meia verdade. A outra metade da verdade é que, por causa da facada, Bolsonaro foi o candidato que teve mais exposição na TV. Assim, não é verdade que a televisão não teve papel na eleição. Bolsonaro só conseguiu crescer e se consolidar após a facada [em setembro do ano passado, em Juiz de Fora]. Houve muita cobertura, dos detalhes da operação no intestino até seu processo de recuperação. A TV foi fundamental, na minha opinião, para que ele se consolidasse como o candidato antissistema.
Valor: Como foi essa consolidação, já que no início da campanha adversários o apontavam como um candidato de dentro do sistema político, com 28 anos de Congresso Nacional?
Meirelles: Todos os nossos trackings [pesquisas de monitoramento] mostravam que ele tinha caído três ou quatro pontos [nas intenções de voto] após a primeira semana eleitoral [na TV e no rádio], entre o dia 31 de agosto ao dia 6 de setembro, dia da facada. Com ela, mudaram as premissas que faziam Bolsonaro cair: o caso da "Val do açaí" [então assessora do parlamentar que foi acusada de ser funcionária fantasma], a atuação de décadas como deputado. Naquele fim de semana, entendemos que as premissas iniciais tinham acabado e vimos que Bolsonaro tinha virado o favorito. A partir dali, ele conseguiu uma exposição que até então não tinha e conseguiu uma boa explicação para não ir aos debates, que poderiam ser um tiro no pé. Bolsonaro conseguiu ocupar o espaço que não é o do novo, mas que era do antissistema. Dito isso, há 137 milhões de pessoas com mais de dez anos de idade que acessam a internet diariamente no Brasil. Três quartos dos eleitores acessam redes sociais, em grupos cada vez mais homogêneos entre si e heterogêneos entre eles. Isso leva a um processo de radicalização. Alguns políticos entenderam essa força.
Valor: Qual o risco que essa força traz para o mundo político?
Meirelles: Os políticos passarem a acreditar que o universo total dos brasileiros é o que ele vê pelas suas redes sociais.
Valor: Isolando-se mais dentro das bolhas?
Meirelles: Mais dentro da bolha. E este é o momento em que o eleitor quer ser o protagonista de tudo. Quando a referência do político passa a ser o que ele observa nas redes sociais dele, esse político passa a ser um sujeito mais manipulável. Não se sabe o quanto as redes representam de fato a sua base eleitoral. Existem os robôs. O sucesso da renovação política virá da capacidade dessa classe de se manter conectada com seus eleitores reais.
Valor: Do lado do eleitor, as redes embutem um risco maior de frustração?
Meirelles: A eleição do ano passado trouxe um desejo de renovação política e as pessoas não querem mais do mesmo. Parte das dificuldades do primeiro mês de governo do Bolsonaro tem a ver com isso. A continuidade de práticas que eram condenadas, como nas indicações para cargos do governo, abre espaço para o eleitor rapidamente se frustrar. Mas não estou dizendo que isso vai acontecer.
Valor: As redes sociais podem funcionar como um escudo do governo contra uma eventual frustração?
Meirelles: Se de um lado há uma parcela de eleitores que começa a pressionar e a questionar a adoção de antigas práticas políticas pelo governo, de outro tem um número grande de eleitores que quer acreditar na sua escolha. Agora vai ser o momento de o brasileiro tirar a prova da aposta que fez na eleição. Porque agora o governo vai ter que entregar resultados. Então, o sucesso ou não da nova administração, a continuidade ou não da lua de mel, está diretamente relacionada à capacidade de oferecer uma perspectiva de futuro diferente para a população. E à velocidade da retomada da economia.
Valor: Analistas condicionam a retomada da economia à aprovação da reforma da Previdência, que é um assunto impopular...
Meirelles: A população entende a reforma como algo que retira direitos de quem mais precisa. Não estou dizendo que não é ou é assim. Mas acho que a narrativa sobre a reforma da Previdência terá que ser mais que econômica para conseguir ganhar a opinião pública. Dito isso, acho que alguma reforma da Previdência vai ser aprovada. Não sei se toda, ou fatiada, mas algo vai ser dado. Se ela de fato vai combater privilégios, é o que garantirá ou não a pressão da população sobre o Parlamento.
Valor: O sr. já disse em outras ocasiões que pautas comportamentais ganham força em épocas de crise. Se a economia melhorar, a pauta de costumes do governo, que é polêmica, tenderá a submergir?
Meirelles: Acho que a estratégia do governo será colocar a pauta de costumes para ajudar a pauta econômica. A ministra Damares [Alves, da pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos] e o ministro da Educação [Ricardo Vélez Rodríguez] vão tocar essa pauta para manter a base coesa e não ter uma discussão de fundo com a população sobre economia. Não digo que essa pauta de costumes passará pelo Congresso, mas o debate será colocado. Com isso você divide o "share" de tempo da atenção publica entre a causa do combate à corrupção, a pauta de costumes e as reformas econômicas.
Valor: Dá para saber o que o brasileiro quer nos próximos anos?
Meirelles: O brasileiro quer se ver como protagonista, mais até do que ser. Isso é bom. A consequência disso na política é uma vontade maior de fiscalizar o poder público, interferir nos processos de votação e de alguma forma influenciar o rumo do país. Se o empoderamento da população não acontecer na vida real, a revolta vai ser maior que a que vimos nos últimos anos.
Valor: Um novo 2013?
Meirelles: Se as expectativas criadas no processo eleitoral não forem realizadas, acho que temos um risco maior do que em 2013. O brasileiro quer a mudança que ele idealizou. Qual o risco de isso acontecer? Não sabemos. Ainda tem muita água para rolar embaixo da ponte. Mais importante para saber para onde o Brasil está caminhando é saber quais são as premissas e ir monitorando.
Valor: E quais são as premissas do Brasil hoje?
Meirelles: A relação do governo com o Congresso, sua capacidade de sustentar uma imagem de honestidade, a velocidade do crescimento da economia e também da renda do brasileiro das classes C e D.
Valor: Se sair desse trilho...
Meirelles: Começa a dar errado. Mas de outro lado é importante observar o quanto a oposição será capaz de dar atenção à sociedade, e não para brigas internas partidárias. Desde o processo do impeachment [de Dilma Rousseff, em 2016], PT e PSDB, o establishment, fizeram política olhando para si mesmos, e não para a sociedade. Naquela época, a demanda do eleitor não era pelo [Michel] Temer, a demanda era para tirar Dilma e ter novas eleições. E o maior partido do país se recusou a defender novas eleições e impediu partidos menores da esquerda de propor isso. Se essa demanda tivesse sido atendida, talvez a situação seria diferente hoje. Os grupos que ocuparam o poder desde a redemocratização abriram mão de falar com a sociedade.
Valor: Tivemos avanço grande de pautas de gênero e de raça nos últimos anos. Essas pautas podem retroceder a partir de agora?
Meirelles: A população costuma apoiar políticas de inclusão como cotas, Bolsa Família. Mas a pauta de costumes, como união civil entre pessoas do mesmo sexo, interrupção da gravidez, direitos da população LGBT, é mais complicada. Não acredito que haverá retrocesso. Pode haver interrupção [da evolução]. Nas empresas, ao menos, não há perigo de retrocesso. Os departamentos de recursos humanos estão colocando isso cada vez mais em pauta. É um movimento sem volta.
Copom: Cenário prescreve política de juros que estimule economia
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central avalia que a conjuntura econômica admite uma política de juros que incentive o crescimento da atividade produtiva. Essa análise se baseou em "expectativas de inflação ancoradas, medidas de inflação subjacente em níveis apropriados ou confortáveis, projeções que indicam inflação em direção às metas para 2019 e 2020 e elevado grau de ociosidade na economia", diz a ata da mais recente reunião do grupo, de 6 de fevereiro, quando a taxa básica Selic foi mantida em 6,5% anuais.
Os formuladores da política monetária brasileira acreditam que, embora haja incertezas, esse patamar de juros reais tem "efeito estimulativo sobre a economia”. Para a autoridade monetária, o grau de estímulo adequado depende de fatores como expectativas de inflação, capacidade ociosa na economia e balanço de riscos, que envolve, por exemplo, as reformas estruturais. “A provisão de estímulo monetário requer ambiente com expectativas de inflação ancoradas”, diz o texto. “O Copom reitera sua visão de que a continuidade do processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para a queda da sua taxa de juros estrutural, cujas estimativas serão continuamente reavaliadas pelo Comitê.”
A autoridade monetária avalia que os núcleos de inflação se encontram em níveis apropriados ou confortáveis e aponta que as expectativas inflacionárias estão em 3,9%, 4,0% e 3,75%, respectivamente para 2019, 2020 e 2021. Por outro lado, o colegiado do Banco Central aponta que o cenário externo permanece desafiador, mas com redução de riscos, que também ganharam perfil diferente.
“Por um lado, diminuíram os riscos de curto prazo associados à normalização das taxas de juros em algumas economias avançadas. Por outro lado, aumentaram os riscos associados a uma desaceleração da economia global, em função de diversas incertezas, como as disputas comerciais e o Brexit”, diz o documento.
Dadas as incertezas envolvendo os cenários econômicos, o grupo defende que é importante trabalhar com maior flexibilidade na condução da política monetária, sem dar indicações sobre seus próximos passos. “Os membros do Comitê reafirmaram sua preferência por explicitar condicionalidades sobre a evolução da política monetária, o que melhor transmite a racionalidade econômica que guia suas decisões. Isso contribui para aumentar a transparência e melhorar a comunicação do Copom.
Nesse contexto, voltaram a ressaltar que os próximos passos na condução da política monetária continuarão dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação”, diz o texto.
A autoridade monetária reforçou seu compromisso em conduzir sua política de forma a manter a trajetória de inflação em linha com as metas fixadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). “Os membros do Comitê debateram a melhor forma de atuação da política monetária diante de incertezas quanto aos cenários econômicos. Concluíram que a melhor forma de manter a trajetória da inflação em direção às metas é atuar com cautela, serenidade e perseverança nas decisões de política monetária, inclusive diante de cenários voláteis”, ressaltou o BC.
Atividade econômica
Na ata da reunião deste mês, o Copom aponta que os indicadores recentes seguem mostrando recuperação gradual da economia brasileira. “A economia segue operando com alto nível de ociosidade dos fatores de produção, refletido nos baixos índices de utilização da capacidade da indústria e, principalmente, na taxa de desemprego”, relata o documento. O colegiado disse ter debatido as evidências de perda de fôlego da atividade econômica no quarto trimestre de 2018, quando comparado ao terceiro trimestre.
“Considerando os choques que incidiram ao longo de 2018, concluíram que a evolução da atividade econômica tem sido consistente com o cenário básico do Copom, de recuperação gradual da economia brasileira”, diz o texto. Para eles, uma aceleração de ritmo de retomada da economia dependerá da diminuição das incertezas em relação à aprovação e à implementação das reformas, notadamente as de natureza fiscal, e de ajustes na economia brasileira.
“Além disso, destacaram também a importância de outras iniciativas que visam aumento de produtividade, ganhos de eficiência, maior flexibilidade da economia e melhoria do ambiente de negócios. Esses esforços são fundamentais para a retomada da atividade econômica e da trajetória de desenvolvimento da economia brasileira”, afirma o BC na ata.
Ibovespa retoma os 96 mil pontos
Uma combinação de fatores levou o Ibovespa a deixar de lado os dias de movimento modesto e ter uma recuperação mais sustentada, que o colocou a apenas 4% da simbólica marca dos 100 mil pontos, tão aguardada pelo mercado. Depois de começar a segunda-feira estendendo as perdas acumuladas na semana anterior, o índice aproveitou nesta terça o avanço de Petrobras e a maior demanda por risco no exterior para retomar o nível dos 96 mil pontos. O Ibovespa terminou o pregão em alta de 1,86%, aos 96.168 pontos — maior patamar desde o último dia 5, período em que renovava recordes e oscilava na casa dos 98 mil pontos.
Na máxima intradiária, o índice chegou aos 96.571 pontos, em ganho de 2,29%. O giro financeiro das ações do índice foi de R$ 13,8 bilhões, ligeiramente mais forte do que as últimas sessões e do que a média diária negociada em 2019. Altas firmes acompanhadas de volume financeiro mais robusto sinalizam, segundo operadores, que houve uma nova entrada de fluxo comprador na bolsa, com a volta de parte dos recursos que foram retirados nas últimas sessões.
Entre os destaques desta terça, Banco do Brasil encerrou em alta de 6,16%, seguido por Vale (5,43%) e Bradespar (4,89%), que é acionista da mineradora. A ação preferencial da Petrobras subiu 3,54%, enquanto o papel ordinário avançou 3,60%. Segundo Luis Gustavo Pereira, estrategista da Guide Investimentos, o ambiente positivo que embalou as bolsas americanas e ativos emergentes, incluindo moedas, acabou dando suporte para que os investidores voltassem a levar a bolsa brasileira a níveis mais altos.
Em Nova York, o iShares MSCI Brazil Capped, maior fundo de índice (ETF) ligado a ações brasileiras, teve um ganho robusto de 2,84%. Já o índice Dow Jones Brazil Titans, que mede o desempenho dos 20 maiores recibos de ações (ADRs) brasileiros, avançou 2,76%. Na frente doméstica, certo bom humor no mercado derivou também da melhor condição de saúde do presidente Jair Bolsonaro, que pode receber alta hospitalar em breve — o avanço da pauta da reforma da Previdência depende da apreciação do presidente. “Isso significa que perdas sequenciais como as que vimos em algumas das últimas sessões abrem oportunidade de compra em alguns papéis”, afirma Pereira.
No mês até esta terça, o Ibovespa cai 1,26%, mas, no ano, o índice ainda acumula alta de 9,42%. De acordo com Ari Santos, gerente da mesa de operações da H. Commcor, a reforma da Previdência só vai andar de fato com a anuência de Bolsonaro. E, considerando os melhores fundamentos do país, não há motivo para as valorizações dos ativos da bolsa serem interrompidas. “Não tem motivo para a bolsa não subir, com os juros em patamares baixos, expectativa de crescimento da atividade e do lucro das empresas. Em linhas gerais, estamos falando de um ambiente, de um conjunto positivo para a renda variável”, afirma Santos.
Essa é, inclusive, a premissa que levou algumas varejistas a terem importante recuperação, caso de B2W (alta de 4,62%) e Lojas Renner (3,86%). Quem ficou de fora da lista foi a ação da Lojas Americanas, que liderou as baixas desta terça, em queda de 3,16%. No caso da Petrobras, não foi apenas o exterior que contribuiu com o crescimento da demanda pelo papel. Além da alta do petróleo, o investidor se animou com a perspectiva de continuidade do processo de venda de ativos.
Essa leitura garantiu o avanço forte das ações da estatal, de ponta a ponta do pregão. Conforme informou o Valor, o processo de venda da Transportadora Associada de Gás (TAG) entrou em fase de finalização — trata-se do maior ativo isolado da Petrobras dentro do programa de desinvestimento da companhia.
Já no caso do estatal Banco do Brasil, o diretor da CM Capital Markets, Fernando Barroso, afirma que a alta forte é uma consequência do maior “desconto” que esse papel carrega em relação aos demais pares privados do setor. Em um dia de alta para o setor bancário, portanto, o maior potencial de ganho é do BB. A ação ordinária do Bradesco encerrou em alta de 2,15%, enquanto o papel preferencial do banco ganhou 2%; já o Itaú Unibanco registrou avanço de 2,39%.
ESTADÃO
Construção civil tem plano para 1 milhão de empregos
Atingido em cheio pelas investigações da Lava Jato e pela recessão econômica, o setor de construção civil quer virar o jogo e protagonizar a retomada do crescimento do País. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic) apresenta nesta quarta-feira, 12, aos parlamentares um plano que promete criar 1 milhão de empregos sem nenhum centavo de subsídios do governo. A articulação do setor com o governo também tem sido intensa.
“Da mesma forma que as privatizações puxaram a economia nos anos 90, agora é a hora da construção civil”, avalia o presidente da CBIC, José Carlos Martins. A retomada das 4.738 obras que se encontram paradas é um ponto prioritário. “Isso é emprego na veia”, afirmou. “E não é em uma cidade A, B, ou C, é em todo o País.”
Segundo o presidente da CBIC, há muitos casos de obras que são tocadas entre o governo federal e as prefeituras que, por alguma razão, não começaram. Estima-se que haja entre R$ 2 bilhões e R$ 8 bilhões em recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) depositados em contas de prefeituras e sem uso por causa de dificuldades burocráticas e jurídicas. “Tem de achar uma solução técnica para isso.”
A reforma da Previdência, prioridade do governo federal em sua relação com o Congresso, é o item número um da lista de 18 pontos elaborada pela entidade que será entregue aos parlamentares. “Mas não é só ela”, diz Martins. Ele explica que, sem eliminar pontos inibidores do investimento, a melhora no ambiente macroeconômico com a aprovação da reforma da Previdência trará resultados menores do que poderia.
As propostas passam por um novo marco legal para a concessão de licenças ambientais para a realização de obras, que são uma etapa muito demorada do processo. A CBIC defende que as análises pelos órgãos federais envolvidos, como Ibama, Funai e Instituto de Patrimônio Histórico, por exemplo, corram em paralelo. “E queremos regras claras, porque hoje elas não são.”
FGTS
Outro ponto que preocupa o setor é a possibilidade do uso de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para outras finalidades que não sejam aposentadoria ou aquisição da casa própria. O FGTS é a principal fonte de financiamento do mercado imobiliário, respondendo por dois terços do total. O recado aos parlamentares é que, por mais bem intencionadas que sejam eventuais novas liberações, o impacto é negativo para o setor de habitação.
Martins defende também a reversão de um veto do ex-presidente Michel Temer a um projeto de lei de autoria do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) que buscava reduzir a insegurança jurídica para a atuação de empresas do setor. Hoje, explica Martins, o risco de ter o patrimônio pessoal comprometido faz com que os funcionários públicos prefiram não decidir nada. Isso provoca uma paralisia na relação do Estado com as empresas e afeta, por exemplo, as concessões em infraestrutura.
Num quadro onde nem prefeituras nem governo federal têm recursos, a aposta é nas concessões e Parcerias Público-Privadas. A proposta da CBIC é usar técnicos da Caixa para ajudar a estruturar concessões nos municípios. E, no caso federal, reformar o modelo que, avalia Martins, foi construído para beneficiar grandes empreiteiras.
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