VALOR
Fim de ano fraco impõe revisão para PIB de 2020
A queda do indicador de atividade do Banco Central em dezembro consolidou a percepção de que o crescimento no fim de 2019 foi mais fraco do que o esperado e levou economistas a revisarem suas projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2019 e, principalmente, o deste ano.
Ainda sem a ameaça de repetir um quarto ano seguido de crescimento na casa de 1%, cada vez mais as estimativas convergem para um patamar próximo de 2% em 2020, em vez de 2,5%. O Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) caiu 0,27% em dezembro, com ajustes ante mês anterior, após um novembro negativo em 0,11%, informou o BC na sexta-feira. No ano, o IBC-Br cresceu 0,89%, e, apesar de este ser o terceiro ano positivo seguido, significa desaceleração em relação à alta de 1,34% de 2018.
Em relatório, o Santander fala em “grande e disseminada frustração” a partir dos dados do quarto trimestre. O banco cortou pela metade sua estimativa para o PIB do período, de alta de 0,8% para 0,4%, abaixo do 0,6% registrado no terceiro trimestre de 2019. Com isso, reduziu a estimativa para o PIB de 2019, de 1,2% para 1,1%, mas o impacto mais expressivo fica para 2020, cuja projeção foi de 2,3% a 2%.
Já o banco inglês Barclays cortou sua previsão para quarto trimestre de 0,75% para 0,5%, enquanto o fechado do ano foi reduzido em 0,1 ponto, para 1,1%. A projeção para 2020 passou de 2,3% para 2,1%. O movimento dos bancos nas projeções de 2020 acompanha cortes promovidos na semana passada por Safra (de 2,3% para 2,1%) e Citi Brasil (de 2,2% para 2%) e, na semana anterior, por UBS (de 2,5% para 2,1%) e JPMorgan (de 2% para 1,9%).
O Itaú Unibanco revisou sua projeção para o PIB do quarto trimestre de 0,6% para 0,5%, mas ainda não mexeu nas estimativas para o ano passado (1,2%) e 2020 (2,2%), que têm viés de baixa. O Bradesco cortou o PIB do quarto trimestre para 0,5%, ante 0,7%. Com o desempenho surpreendente da atividade no terceiro trimestre e também em outubro, economistas estimaram aceleração do PIB no último período de 2019, impulsionado pelo consumo.
Nos últimos meses do ano, porém, acumularam frustrações. O varejo ampliado, que inclui veículos e material de construção, recuou 0,6% em novembro, ante outubro, e caiu 0,8% em dezembro. O setor de serviços cedeu 0,1% e 0,4%, respectivamente. “Antes eu via o quarto trimestre como o melhor do ano, hoje vejo como algo muito próximo do terceiro”, diz Thiago Xavier, economista da Tendências Consultoria Integrada.
Segundo especialistas, ajudam a explicar a quebra das expectativas fatores como o choque no preço dos alimentos e uma possível concentração de saques do FGTS em setembro e outubro. O consenso agora é que 2020 começa com ritmo mais fraco do que o previsto. “As quedas de novembro e dezembro levam um carrego estatístico negativo para o primeiro trimestre e reforçam a visão de que o PIB vai ser mais fraco do que no terceiro e quatro trimestres do ano passado, com um PIB mais próximo de 2% do que de 3% neste ano”, diz Luka Barbosa, economista do Itaú.
Indicadores antecedentes de janeiro dão sinais mistos. As métricas de confiança, com exceção da para serviços e consumidor, avançam, mas podem registrar um otimismo da virada de ano que já não encontra muito espaço. Indicadores coincidentes da indústria, como expedição de papel ondulado, cresceu, enquanto o emplacamento de veículos, sinalização para o varejo, recuou.
O Barclays vê avanço de 0,4% na atividade do período, revista de 0,6% anteriormente. Para o Santander, o PIB do primeiro trimestre deve ficar perto de 0,2%, acelerando para uma média de 0,6% nos trimestres seguintes, “o que é considerável”, diz o economista do banco Lucas Nobrega. A situação relativa ao coronavírus, ele ressalta, deve ser monitorada com atenção. Na conta do Santander, se o impacto da doença, que paralisa as China, começar a se normalizar a partir do segundo trimestre, o reflexo negativo seria de 0,1 ponto percentual no PIB brasileiro de 2020.
Impacto fiscal seguirá contracionista em 2020 e 2021, diz Itaú
Em terreno expansionista por mais de uma década, o impacto da política fiscal na economia brasileira inverteu sinal após o teto de gastos e deve seguir negativo nos próximos dois anos. A conclusão é de Pedro Schneider, economista do Itaú Unibanco, que calculou três métricas diferentes de impulso fiscal. Todas elas apontam efeito contracionista de 2019 a 2021. Assim, cada vez mais, o setor privado será o indutor do crescimento.
Esse impacto negativo das contas públicas sobre a demanda agregada também facilita o trabalho do Banco Central, ao abrir espaço para que os juros fiquem em patamar baixo por mais tempo. Em relatório antecipado ao Valor, a primeira medida estimada por Schneider foi o resultado primário (excluindo gastos com juros) estrutural.
Debatido por especialistas como alternativa que captura com maior exatidão os efeitos da política fiscal sobre a economia, esse indicador procura mostrar a situação das contas públicas quando são descontados o efeito do ciclo econômico e despesas e receitas extraordinárias.
Nesse conceito, gastos e receitas não recorrentes, como a arrecadação com o leilão da cessão onerosa da Petrobras, deixam de fazer parte da conta. O resultado fiscal também é ajustado pelo ciclo econômico, o que poderia conferir caráter anticíclico à postura fiscal, com maior poupança em tempos de crescimento elevado da receita, possibilitando economia menor quando a atividade estiver fraca.
Mesmo após esses ajustes, o Brasil ainda está longe de ter situação fiscal confortável, diz Schneider. Ele observa, porém, que houve melhora em 2019, que deve continuar. Em suas estimativas, o resultado primário estrutural foi negativo em 0,5% do PIB no ano passado, déficit que deve recuar a 0,4% do PIB neste ano, ficando praticamente zerado em 2021 (-0,1% do PIB).
Segundo o economista, a melhora deve ser mais significativa em 2021 porque o governo federal tem uma margem maior para gastar este ano: em 2019, a despesa primária da União ficou R$ 34 bilhões abaixo do limite do teto. Essa “folga” deve ser reduzida para R$ 10 bilhões ao fim de 2020, calcula Schneider.
Os gastos serão maiores em 2020 porque o impacto da reforma da Previdência sobre as contas públicas ainda será relativamente pequeno este ano. Além disso, as despesas com desoneração da folha de pagamentos e precatórios deixarão de ocorrer no ano seguinte, explica ele. Assim, o impulso fiscal, medido pela variação do resultado primário estrutural entre um ano e outro, será praticamente nulo no ano corrente (-0,05% do PIB), caindo para -0,3% do PIB em 2021.
De acordo com o Itaú, esse impulso foi positivo em 0,3% do PIB ao ano, em média, de 2001 a 2015. Mais simples, a segunda métrica usada para estimar o impacto da política fiscal na demanda compara a evolução do gasto público e do PIB potencial (aquele que, em tese, não acelera a inflação). Para que as contas públicas fiquem equilibradas, observou Schneider, o gasto do governo precisa crescer a um ritmo próximo do crescimento potencial do país, relação que ficou longe do observado entre 1997 e 2015.
Nesse período, os gastos primários federais avançaram cerca de 6% em termos reais ao ano, em média, ao passo que o PIB potencial estimado foi de 2,7% na mesma comparação, diz o economista. Já de 2016 a 2019, o crescimento do gasto desacelerou para 0,8% ao ano, em linha com o PIB potencial, trajetória atribuída à regra do teto de gastos, segundo Schneider.
Mesmo com algum ganho de fôlego, os gastos ainda vão se expandir em velocidade inferior à do produto potencial este ano, destaca Schneider, mantendo a postura contracionista da política fiscal. Em 2020 e 2021, o banco estima que o impulso fiscal dessa medida será negativo em 0,6% do PIB, também na média de cada ano, após ficar zerado entre 2016 e 2019.
Por fim, a terceira métrica, que busca incluir o impacto da política parafiscal, vai na mesma direção. O Itaú estimou o desempenho dos desembolsos do governo, somando os gastos da administração pública, o investimento público e a concessão de empréstimos do BNDES a empresas. Nessa medida ampliada, o “tamanho” do governo como proporção do PIB potencial chegou ao pico de 26% em 2014 e, desde então, passou a diminuir, chegando a 20,7% do produto ano passado.
“Mantido o ajuste fiscal, a medida continuará recuando, ratificando que a retomada da economia se dará com maior participação do setor privado”, diz Schneider. No cenário do banco, a demanda doméstica privada vai crescer acima do PIB neste ano e no próximo. Em 2020, a soma do consumo das famílias e do investimento deve avançar 3,3%, aponta Schneider, com alta de 2,2% no PIB total.
No ano seguinte, o crescimento da demanda privada vai acelerar a 4%, um ponto acima da alta esperada para a economia como um todo. “Quando a participação do governo na economia é maior, não necessariamente os melhores projetos são escolhidos”, afirma Schneider. O economista ainda ressalta os efeitos da política fiscal mais contracionista sobre a taxa de juros neutra, que permite o crescimento econômico sem pressões inflacionárias.
O Itaú estima que a taxa neutra estaria ao redor de 2% hoje, após ter ficado em 3,4% de 2015 a 2018. “É fundamental que a política fiscal e a parafiscal permaneçam controladas, mantendo o teto de gastos, para que o juro permaneça baixo”, avalia Schneider.
Copom dá pesos iguais às metas de 2020 e 2021
Vários analistas econômicos ficaram incomodados com o foco que o Banco Central passou a dar, de forma mais prematura do que de costume, para a meta de inflação do ano que vem, embora este ano mal tenha começado. Para alguns, seria apenas um expediente para não reduzir ainda mais os juros básicos agora, quando as projeções de inflação para 2020 indicam um bom espaço para a meta de taxa Selic cair abaixo dos atuais 4,25% ao ano. A explicação mais provável: o Banco Central não abandonou a meta de 2020, mas também está de olho na meta de 2021.
A política monetária, neste momento, foca com peso iguais os dois anos. É como se o alvo imediato fosse a média entre a meta de inflação deste ano, de 4%, e a do próximo, de 3,75%. O que levou o Comitê de Política Monetária (Copom) a anunciar a interrupção do ciclo de distensão monetária, na verdade, parece ter sido um balanço de riscos assimétrico, que atribui um peso maior aos fatores potencialmente altista da inflação do que os potencialmente baixistas.
Ao longo dos meses, o Banco Central desloca gradualmente o alvo da política monetária de um ano para o outro. Isso é feito com trocas sutis de termos e na ordem das palavras dos documentos oficiais do Copom, quase imperceptíveis a olhos menos atentos. Primeiro, o BC avisa que o foco da política “inclui, em menor grau, o ano seguinte”. Depois, diz que inclui o ano seguinte “de forma crescente, mas em menor grau”.
Mais adiante, diz apenas que “inclui de forma crescente” o ano seguinte. Por fim, tira o ano corrente do radar e diz que o foco é só o ano seguinte. Na ata de sua reunião mais recente, divulgada na semana passada, o Copom queimou uma etapa nesse ritual de comunicação. Disse que estava focando “de forma crescente” em 2021, sem dizer “em menor grau”, como a esta altura do campeonato costumava fazer.
A quebra do padrão levou analistas do mercado a acreditarem - com razão - que algo mudou na comunicação do BC e, portanto, na execução da política monetária. Uma interpretação muito comum, que não está correta, é que o Banco Central jogou a toalha sobre a meta de inflação deste ano, de forma prematura.
A inflação está projetada em 3,5% para 2020, bem abaixo da meta, de 4%, o que significa que havia espaço para baixar a Selic ainda mais, sem colocar em perigo o cumprimento do alvo deste ano. Mas a margem para juros menores desaparece se o Copom tiver deslocado o seu foco para apenas 2021. As projeções oficiais indicam uma inflação entre 3,7% e 3,8% no próximo ano, ante uma meta de 3,75%. Essas projeções significam que, se os juros caírem, a inflação ficará acima do alvo.
O pano fundo das queixas é que, na visão de muitos analistas do setor privado, o Copom está sendo conservador demais na condução da política monetária. Depois de uma safra de indicadores mais forte de retomada da economia em fins de 2019, os dados mais recentes voltaram a decepcionar. A inflação corrente segue muito baixa, e os núcleos, que excluem ruídos de curto prazo e mostram a tendência dos índices de preços, são benignos. Há, ainda os primeiros sinais de queda das expectativas de inflação de 2021, que estariam a um passo de se desancorarem.
Cerca de 20% dos analistas já preveem inflação abaixo de 3,75% no ano que vem; as projeções ficaram mais dispersas; e as estimativas atualizadas mais recentemente têm uma tendência de baixa. A pausa anunciada pelo BC no ciclo de corte de juros, porém, não tem relação com o deslocamento de alvo da política monetária.
A ata do Copom informa que o anocalendário de 2021 tem peso crescente nas decisões de política monetária, mas não está dito que abandonou o ano de 2020 à própria sorte. O que mudou na comunicação do Copom foi deixar de dizer, como fizera em anos anteriores, que o ano de 2021 tem peso crescente, “mas menor” no manejo da política monetária. Isso significa que o colegiado está atribuindo pesos iguais para as metas dos anos calendário de 2020 e de 2021.
Em termos práticos, como já dito, o Copom está mirando algo como a média das metas de inflação desses dois anos. Como a média das projeções de inflação está abaixo da média das metas de inflação, em tese há espaço para cortar mais ainda a taxa básica de juros. Se, de fato, o Copom vai cortar, é outra história. O colegiado tem indicado que o balanço de riscos pende mais para o lado negativo, por isso hoje o Copom vê suas projeções de inflação no cenário básico com uma dose de cautela.
Vistos juntos, a soma das projeções e o balanço de riscos levou o Copom, de forma consensual, a decidir por uma interrupção nos cortes de juros a partir de março e a comunicar que precisa de alguns meses para observar o cenário econômico. O que o colegiado vai fazer depois desse período é, hoje, incerto.
Há um embate de visões de membros do Copom entre conservadores e moderados. Alguns receiam que a capacidade ociosa da economia poderá se esgotar mais rápido do que o previsto e outros enfatizam que os baixos núcleos de inflação mostram um bom espaço para a economia crescer sem causar pressão exagerada nos preços.
Por que o BC passou a dar peso a 2021 nas suas decisões mais cedo do que o costume? O Brasil está num processo de convergência para meta de inflação mais baixas, saindo de 4,5% em 2018 para provavelmente 3% até 2024. Isso provoca um problema prático na condução da política monetária. Se a inflação estiver muito baixa num ano, o BC deve procurar acelerá-la, cortando os juros.
Mais adiante, deve subir os juros, para cumprir a meta mais baixa do ano subsequente. Essa era teoria seguida até agora no BC, que focava nos anos-calendário. A abordagem é boa para a credibilidade da política monetária, pois fica fácil o Copom comunicar seus objetivos. O inconveniente é a volatilidade na taxa de juros, ora baixando para depois subir.
A nova forma de atuar do Banco Central, focando em alguns momentos em um ponto intermediário das metas de dois anos-calendário, atenua a volatilidade dos juros. Mas pode levar a alguns mal entendidos, como mostra a forma como analistas receberam a comunicação recente do Copom.
Santander reduz projeção de PIB de 2,3% para 2% em 2020
Citando o choque para a economia global da epidemia de coronavírus, que teria revertido pelo menos parte das expectativas de que 2020 seria o ano de recuperação da economia mundial, o Santander revisou para baixo suas projeções para o crescimento da economia brasileira de 1,2% para 1,1% em 2019, de 2,3% para 2,0% em 2020, e de 3,0% para 2,5% em 2021, em relatório assinado pela economista-chefe do banco, Ana Paula Vescovi.
“Os dados de atividade referentes ao quarto trimestre frustraram e o crescimento econômico em 2019 e 2020 deverá ser menor que o esperado em nosso último relatório mensal”, diz o texto. “Apesar das revisões baixistas, entendemos que a composição do crescimento doméstico segue positiva, em particular com a maior participação da demanda do setor privado”, pondera.
O banco avalia que “a agenda econômica reformista não será interrompida, mas poucas propostas devem ser aprovadas em 2020, tendo em vista a grande quantidade de PECs (Propostas de Emenda Constitucional) em tramitação no Congresso e o calendário parlamentar abreviado pelas eleições municipais”. O Santander prevê a aprovação de um “pacote emergencial de contenção de gastos obrigatórios este ano, o que permitirá manter a despesa federal abaixo do teto constitucional”.
Ganho com imóvel pode alcançar dois dígitos ao ano até 2022
Que o mercado imobiliário está em ascensão no país ninguém contesta. Mas qual o potencial de ganho de capital para o investidor no atual cenário? Especialistas ouvidos pelo Valor veem espaço para os preços de venda e os aluguéis crescerem, a partir do patamar atual, pelo menos, de dois a três pontos percentuais acima da inflação por três a até seis anos seguidos — o período e a intensidade vão depender da confirmação de catalisadores, como aprovação de reformas, aceleração do crescimento e estabilidade internacional. Porém, gestores e economistas já consideram grandes as chances de os valores subirem dois dígitos pelos próximos três anos ou além.
O diretor da Ourinvest Real Estate e professor do Insper, Rossano Nonino, estima uma elevação de preços do metro quadrado e de locação de 12% a 15% ao ano, em média, até 2025. Quem lidera o movimento hoje é a capital paulista, mas outras regiões devem seguir o avanço nos próximos anos. O especialista faz algumas ressalvas sobre a projeção. “O mercado imobiliário tem características muito específicas e o comportamento dos preços obedece a inúmeras variáveis, como localização — existem cidades em que o preço ainda cai —, tipo, ou seja, se é comercial ou residencial, perfil e diversas outras considerações”, pondera.
Apesar de os municípios e segmentos apresentarem ritmos de recuperação diferentes, existe uma tendência consolidada de os valores ou terem estabilidade ou subir. O CEO da RBR Asset Management, Ricardo Almendra, revela que seu cenário base para os imóveis comerciais contempla uma subida média de preços, tanto do metro quadrado quanto da locação, de 15% em 2020 e mais 10% em 2021 na capital paulista, o maior mercado do país.
Mas considera grande a possibilidade de as elevações se manterem nesse patamar por mais tempo. O gestor explica que hoje os preços de vendas de imóveis estão em torno de 20%, em média, abaixo dos valores atingidos antes do início da recessão, em 2014. “Vejo grande possibilidade de os valores, inclusive, superarem o pico visto cinco anos atrás” até o fim do atual ciclo, afirma Almendra.
Nesse cenário e com taxas praticadas hoje no crédito imobiliário na casa de um dígito, a valorização potencial de um imóvel pode até superar o custo do empréstimo. “É uma situação na qual a alavancagem pode se tornar vantajosa ao investidor, que pode arbitrar ganho entre o preço do financiamento e o de venda em um horizonte de até seis anos, se o cenário de expansão se concretizar”, avalia Nonino.
O índice Fipe-Zap, que mede a variação de preços anunciados de imóveis residenciais, mostra uma alta média nominal de 8,14% em São Paulo entre 2015 e 2019, para venda, e subida acumulada de 7,9% na locação. Mas quando se considera o resultado real, ou seja, corrigido pela inflação, os dados indicam perda de 16,64% no caso dos aluguéis e variação negativa de 16,46% para as negociações de compra e venda. No Rio de Janeiro, nas mesmas bases, a locação recuou 22,9% em termos nominais e 40,49% reais.
Os valores de venda, por sua vez, caíram 13,31% nominalmente e 33,03% com ajuste da inflação. Especialistas ressalvam, porém, que os preços anunciados, que é a base do índice Fipe-Zap, podem ser diferentes dos efetivamente transacionados. Nos últimos anos, para concluir as operações, proprietários tiveram de incluir, em grande parte das negociações, descontos de até 30% sobre os preços iniciais.
Nonino, do Insper, lembra ainda que, quando se fala em retomar o nível de preços de antes da crise, significa que o caminho de volta é maior em termos percentuais comparado à queda. Por exemplo, um imóvel que custava R$ 100 mil em 2014 e passou a valer R$ 70 mil no ano passado teve uma desvalorização de 30%. Mas para recuperar o valor de seis anos atrás teria de subir 43%. E, no caso de uma propriedade no qual o valor de venda caiu pela metade, então seria preciso uma alta de 100% para retomar o preço máximo alcançado.
O diretor financeiro do site Imovelweb, Tiago Galdino, tem uma visão mais cautelosa sobre o ritmo de alta dos imóveis. Segundo o especialista, uma variável essencial será a retomada do emprego e da renda. “Em 2020, estimo uma subida de preços em São Paulo no mesmo passo da inflação e em 2021 começa um incremento acima da inflação”, diz.
Para Galdino, se o índice de desemprego alcançar o mesmo patamar registrado em 2013, o ritmo de alta de preços imobiliário aceleraria. “No mínimo, alcançaria 2 a 3 pontos percentuais acima do IPCA, sem dúvida.” O coordenador de pesquisas da Fipe e responsável pelo índice Fipe-Zap, Eduardo Zylberstajn, explica haver, no entanto, velocidades diferentes de retomada entre as regiões do país. “Depende de cada cidade; o Rio de Janeiro, por exemplo, tem questões mais profundas a serem resolvidas.
Em outras capitais como Porto Alegre, Curitiba e João Pessoa, os preços ainda caem”, diz o economista. Por outro lado, além de São Paulo, segundo ele, Florianópolis tem exibido aumentos robustos. De acordo com Zylberstajn, os preços de venda em geral variam com menor intensidade do que os de locação em períodos de crise.
“A gente aprendeu com a crise que o preço de venda é mais rígido por vário fatores, porque, por exemplo, se sei que meu vizinho vendeu um imóvel por R$ 500 mil é difícil aceitar vender por muito menos.” No caso do aluguel, os proprietários se tornam mais propensos a negociar porque aceitar um desconto é melhor do que arcar com os custos de um imóvel fechado.
Mercado aguarda próximos passos do BC
Depois das intervenções do Banco Central (BC) que fizeram o dólar quebrar seis semanas consecutivas de valorização contra o real, o mercado começa a semana se questionando sobre possíveis novas ações da autoridade monetária no câmbio. Ao menos por ora o BC não anunciou um leilão de novos contratos de swap cambial, mas analistas não descartam que a autarquia possa se fazer presente no mercado caso haja um outro momento de estresse cambial.
No fim da tarde de sexta-feira, o dólar comercial fechou cotado a R$ 4,2997, em queda de 0,79%. Na semana, o recuo da moeda americana foi de 0,47%, a primeira baixa acumulada desde os últimos dias de dezembro, embora ainda suba 7,23% em 2020.
Os estrategistas Kenneth Lam, Andrea Kiguel e Dirk Willer, do Citi, acreditam que a ação do BC na semana passada “não foi surpreendente para nós e o mercado a antecipou até certo ponto”, após o dólar se aproximar da marca de R$ 4,40 na quinta-feira.
“A intervenção ajuda, mas o impacto tende a ter vida curta, mesmo que seja eficaz”, aponta o Citi, ao notar, ainda, que a taxa de câmbio efetiva real (REER) do Brasil “está em níveis mais fracos em comparação com as duas últimas intervenções” - o que mostra a fragilidade da divisa neste momento.
O economista-chefe do UBS Brasil, Tony Volpon, considera corretas as ações do BC, já que elas ocorreram em um momento no qual o real vinha registrando performance abaixo dos pares comparáveis por vários pregões seguidos. Para ele, “o desmonte de posições vendidas em dólar, especialmente por investidores locais, deixou o mercado um pouco desorbitado”. Daí a necessidade de intervenção do BC com a oferta nova de swaps.
Ao comentar sobre a necessidade de um programa de swap, com maior volume e duração como em outras ocasiões, Volpon, diz acreditar que tudo dependerá do fluxo de notícias. “Talvez o BC tenha que anunciar algo mais sistemático do que intervenções pontuais, mas ainda não estamos próximos do nível de volatilidade que levaria o BC a fazer algo sistemático”, afirma o economista, que já foi diretor de Assuntos Internacionais da autoridade monetária.
Para fontes do mercado, a ação do BC no câmbio serve para suprir uma demanda por proteção e barra o risco de um movimento mais especulativo. “Não tira a primazia do mercado em determinar a taxa de câmbio, mas ajuda a suavizar um movimento de volatilidade”, explica uma fonte, que vê a intervenção em momentos de estresse ou de falta de liquidez como adequada.
O estrategista-chefe para mercados emergentes do Deutsche Bank, Drausio Giacomelli, diz duvidar sobre uma mudança na política do BC após a intervenção. Ou seja, a autoridade monetária não deve subir juros para conter a escalada do dólar ou iniciar um programa mais sistemático de atuação no câmbio. “As declarações do ministro da economia e do presidente do BC reafirmam seu forte alinhamento nas questões econômicas e a convicção de que um real fraco é bom”, afirma Giacomelli.
Embora seja difícil de cravar, o profissional diz que a abordagem do BC sobre o câmbio “pode ter contribuído para o status do real”, de ser usado em operações de hedge contra riscos locais e do exterior. Também William Jackson, economista-chefe para mercados emergentes da Capital Economics, acredita que, com suporte do BC, o real pode recuperar terreno no curto prazo.
Ele, contudo, acredita no enfraquecimento contínuo da moeda brasileira diante do crescimento econômico mais lento e da taxa de juros nas mínimas históricas. Assim, a consultoria vê pouca justificativa para a visão de que o real terminará o ano muito mais forte do que os níveis atuais.
Assim, a consultoria alterou sua projeção e, agora, espera que o dólar termine 2020 em R$ 4,50 ante uma estimativa de dólar a R$ 4,25 antes. Na semana passada, os dados de varejo, serviços e o IBC-Br de dezembro mostraram uma desaceleração da atividade no quarto trimestre de 2019, o que pavimentou o caminho para as expectativas de Selic baixa por um período prolongado.
A economista-chefe da BNP Paribas Asset Management, Tatiana Pinheiro, diz que o mercado tende a “exacerbar o tamanho do dano”, como visto com o dólar no nível recorde a R$ 4,3830. “Passado o susto com o coronavírus, acredito em um retorno do dólar em torno de R$ 4,25, mas não vejo um movimento muito maior do que esse”, afirma, dados os fatores estruturais que têm pesado sobre o câmbio.
FOLHA
Mercado já vê crescimento de 2% em 2020 mais como alvo do que como piso
Resultados de atividade abaixo dos esperados em dezembro e indicadores antecedentes um pouco contraditórios de janeiro tornam os próximos dois meses cruciais para determinar se o governo Jair Bolsonaro conseguirá entregar um crescimento do PIB superior a 2% neste ano.
Com rebaixamentos pontuais em algumas previsões, um crescimento ao redor de 2% em 2020 já é encarado por parte do mercado mais como alvo do que como piso.
Os dois maiores bancos privados do país, Itaú Unibanco e Bradesco, no entanto, mantêm por enquanto suas estimativas: 2,2% e 2,5%, respectivamente. Mas o viés é de leve baixa no caso do Itaú Unibanco.
O mercado ainda vê pontos favoráveis na construção civil, na safra agrícola recorde, no consumo das famílias, no mercado de trabalho e, principalmente, no aumento do crédito.
Embora a taxa geral de desemprego tenda a permanecer elevada, ao redor de 11%, a expectativa é de formalização mais acelerada das vagas hoje precárias, com impactos positivos na renda e na confiança dos consumidores.
Na contramão, persiste a incerteza em relação à indústria e, consequência disso, a falta de uma retomada mais firme nos investimentos produtivos —adiados diante da elevada capacidade ociosa.
Sobre esse panorama pairam dúvidas a respeito do equilíbrio das contas públicas e da agenda de reformas neste ano eleitoral, mais curto para o Congresso.
A falta de definição até agora do que será prioritário na pauta (PEC da Emergência Fiscal, reforma administrativa ou tributária) já é vista em alguma medida como a repetição da desordem política do ano passado, que acabou afetando o crescimento.
Mais otimista entre bancos e consultorias ouvidos pela Folha, o Bradesco manteve a previsão de 2,5% para o PIB apoiado em dois pilares: recuperação do emprego formal e aumento do crédito.
Segundo Fernando Honorato, economista-chefe do banco, a melhora do mercado de trabalho neste momento, levando em conta séries históricas, é compatível com um PIB até mais forte.
“É cedo para qualquer revisão, e encaramos os dados um pouco mais fracos no fim do ano como ruídos. O emprego formal vem superando bem nossas expectativas”, diz.
Sobre uma eventual desaceleração externa causada pelos impactos do coronavírus, Honorato diz que haveria algum espaço adicional para o Banco Central cortar mais o juro básico, hoje em 4,25% ao ano.
Para Luka Barbosa, economista sênior do Itaú Unibanco, os dados mais fracos do fim de 2019 vieram dentro das expectativas do banco.
O IBC-Br (Índice de Atividade Econômica do Banco Central) caiu 0,27% em dezembro na comparação dessazonalizada com o mês anterior. Foi influenciado pelas quedas de 0,7% na produção industrial, de 0,1% no varejo (-0,8% no varejo ampliado, que inclui veículos, motos, peças e material de construção) e de 0,4% nos serviços.
No ano, o crescimento verificado pelo BC foi de 0,89%, abaixo do 1,34% de 2018.
“Esperávamos isso [a queda de dezembro] em razão da diminuição dos efeitos da liberação do FGTS. São dados voláteis, assim como o próprio PIB em sua sequência trimestral. Não acho que a história da recuperação esteja mudando.”
O economista ressalta que não há estímulos fiscais (gastos públicos) ou um boom de preços de commodities ajudando o crescimento neste momento, o que torna a recuperação “mais moderada; porém, mais saudável”.
Mesmo em relação à indústria, sua expectativa é de paulatina recuperação após o tombo de 6% nas exportações de manufaturados em 2019 por causa das tensões entre Estados Unidos e China e da crise na Argentina.
Para o economista Fabio Klein, da Tendências, é cedo para determinar se os dados menos favoráveis de dezembro vão se repetir. Indicadores de janeiro relativos à produção de papelão ondulado (para caixas e embalagens) e o tráfego de veículos pesados apontam para “um certo otimismo”.
A Tendências manteve a sua previsão de 2,1% de alta do PIB, apoiada no aumento do volume do crédito. Haveria, assim, impactos positivos no consumo e na construção civil, com reflexos favoráveis no emprego.
Klein não vislumbra influência acentuada do coronavírus na economia brasileira. “O efeito pode ser temporário na receita de setores como soja, minério de ferro e petróleo.”
Em janeiro, segundo dados da FGV/Ibre, a confiança avançou em todos os setores, exceto serviços (-0,1 ponto). O destaque foi a construção, com trajetória ascendente desde o segundo semestre de 2019.
Por esses indicadores, a indústria passou a melhorar no quarto trimestre de 2019 e inicia o ano em uma zona de neutralidade.
Já a confiança do comércio se mantém na faixa entre 95 e 100 pontos desde julho de 2019, sugerindo que uma recuperação mais consistente dependerá do mercado de trabalho e da confiança dos consumidores.
Para Tony Volpon, economista-chefe do banco UBS, houve um “excesso de otimismo” no final de 2019 que não se confirmou. Na primeira semana de fevereiro, a instituição financeira já havia cortado de 2,5% para 2,1% sua previsão para o PIB deste ano.
“Foi mais em razão do coronavírus e da China. Mas 0,4 ponto percentual a menos não quer dizer muita coisa. Esperamos para ver, pois parece mais uma acomodação, não uma reversão de tendência.”
O UBS aponta para uma dicotomia no momento: crédito, consumo e emprego melhores e indústria retardando a retomada. Sobretudo pela queda das importações da Argentina e da atividade da Vale —cuja produção de minério de ferro encolheu 21,5% em 2019 após o acidente em Brumadinho (MG).
A MB Associados mantém sua previsão de crescimento em 2% para este ano e aposta em uma evolução relativamente lenta ao longo do tempo, com um 2021 melhor e assim por diante. “Os estragos do passado foram muito grandes”, diz Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria.
Inflação e juros baixos são apontados como fatores positivos, assim como o crédito em alta, a melhora no emprego formal e o aumento da massa de rendimentos —todos elementos que tendem a estimular o consumo.
O obstáculo continua localizado na indústria e na falta de investimentos para ampliar sua capacidade.
“No geral, nunca compramos muito o otimismo de alguns do mercado. Agora, há quem coloque o coronavírus como ‘bode na sala’ para justificar um corte nas expectativas”, diz Vale. Mesmo que a epidemia afete o comércio Brasil-China, diz, o estrago tende a ser passageiro.
José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Fator, afirma que o banco já considera rebaixar de 2,2% para “um teto” de 2% a previsão de crescimento do PIB neste ano.
Sua equipe detectou, em janeiro, queda tanto nas vendas de maquinário para o setor agrícola quanto para o elétrico.
A avaliação de Gonçalves é a de que um clima de “insegurança política” na relação (e na pauta) do governo com o Congresso vem ganhando peso como fator de incerteza na área fiscal. Assim como a “insegurança jurídica” contamina expectativas em relação às concessões de obras que ajudariam a deslanchar alguns investimentos.
Nessa área, o Ministério da Infraestrutura vem mantendo a previsão de ofertar 44 obras neste ano e de concluir outras 52 —o que alguns consideram metas ambiciosas demais.
“Não há dúvida conceitual ou empírica de que precisamos de mais investimentos para sairmos do ciclo de baixo crescimento”, diz.
No time dos mais otimistas, o economista-chefe da Genial Investimentos e professor da PUC-Rio, José Márcio Camargo, segue apostando em um crescimento ao redor de 2,5% neste ano.
Sobre a “rateada” de dezembro, Camargo avalia como um movimento normal de uma economia que se recupera lentamente —e que dados do mercado de trabalho melhoraram consideravelmente no final do ano.
“Isso já deve ter se refletido positivamente na atividade de janeiro e fevereiro”, afirma.
ESTADÃO
Fundos imobiliários perderam este ano R$ 3,28 bi em valor de mercado
Depois da bonança em 2019, os fundos imobiliários vivem neste começo de ano dias de tempestade. De 1.º de janeiro até a última sexta-feira, a classe de ativos que mais cresceu no ano passado (quase 36%) perdeu na Bolsa R$ 3,28 bilhões em valor de mercado, a maior desvalorização da história do investimento dentro de um intervalo de 45 dias.
No total, a cesta que congrega os 131 fundos mais negociados do mercado, o Ifix, encolheu 5,15% em 2020 – em fevereiro, apesar da melhora dos últimos dias, a queda é de quase 1%. Somente o Banco Itaú, que administra o principal fundo do setor, o KNRI11, com R$ 4, 1 bilhões aportados em imóveis, perdeu quase R$ 500 milhões no período.
Entretanto, apesar desse enxugamento em curso, especialistas afirmam que o investidor não precisa correr e liquidar as aplicações. O revés seria, na verdade, uma correção natural do que poderia se configurar no futuro como uma bolha de mercado, caso a demanda por fundos imobiliários continuasse no patamar dos últimos meses.
Para se ter uma ideia, depois de 2%, 3% e 4% ao mês, consecutivamente, o Ifix acumulou alta recorde de 10,6% em dezembro de 2019.
Responsável pelas recomendações de fundos imobiliários na corretora do banco Santander, Felipe Vaz chama atenção para a rápida valorização dos fundos, que, segundo ele, aconteceu sem um motivo aparente. “Os fundos imobiliários dobraram de tamanho no ano passado. E fecharam o ano com um resultado acima do esperado”, diz ele. “No dia 31 de novembro, eram 570 mil CPFs comprando cotas de fundos imobiliários. No final de dezembro, já eram 632 mil. É muita gente em muito pouco tempo”, diz Vaz.
Para o diretor-geral do banco Indosuez, Fabio Passos, a queda atual era esperada. Em suas redes sociais, ele já vinha alertando para o que chamou de “efeito manada” do investidor por produtos lastreados em imóveis desde o começo de dezembro. “Em média, os fundos vinham com oscilação de 10% de um mês para outro, em um ano muito positivo. Crescimentos maiores do que isso, mesmo em 2019, não se justificam, já que não houve ganho de patrimônio líquido que justifique.”
Fabio Passos credita a alta na procura por fundos imobiliários em 2019 à queda da taxa de juros, que está em seu piso histórico, a 4,25% ao ano. “Acho que o que aconteceu no ano passado foi um momento de paúra do investidor, que está procurando retorno loucamente”, conta. Felipe Vaz concorda. “Hoje, após essa correção, os preços dos fundos estão mais justos do que estavam no ano passado”, diz.
No geral, a expectativa dos analistas é de que, daqui para frente, os fundos, mais equilibrados, reduzam suas perdas e voltem ao curso normal do mercado. “Não vejo mais uma correção tão forte como a que vimos nos começo do ano”, diz o gestor de fundos imobiliários da RB Capital, Márcio Rocha. “Mas acho que vamos ter ainda oscilações”, completa Fabio Passos.
Lançados em 2011, os fundos imobiliários são produtos do mercado financeiro que se enquadram na categoria de renda variável, suscetíveis às oscilações e riscos de prejuízo. Os fundos investem diretamente em empreendimentos imobiliários ou em papéis que são lastreados por imóveis, como é o caso dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs).
Hoje, existem pouco mais de 500 fundos em operação no Brasil, sendo que 40% deles são negociados na Bolsa de São Paulo, a B3. A liquidez desses fundos ainda é baixa. Enquanto na Bolsa o giro médio de ações em um único dia ultrapassou os R$ 13 bilhões em 2019, o ritmo de venda das cotas dos fundos é bem menor: R$ 150 milhões por dia. Com isso, pode ser mais lento comprar e mesmo vender um papel do setor, que a exemplo das ações tem sempre prazo de liquidação de dois dias.
Os fundos adotam diferentes estratégias de investimento. Há aqueles que aportam em projetos de lajes corporativas e escritórios, os que compram shoppings centers, galpões logísticos e até participam do desenvolvimento de empreendimentos residenciais.
Para a especialista em fundos imobiliários do Itaú BBA, Larissa Nappo, os fundos voltados para a área de logística, que envolvem aluguéis de galpões por grandes comércios eletrônicos, puxaram a fila dos aportes no final do ano. “Olhando por segmentos, o logístico foi o que mais contribuiu com a alta em dezembro e também o que mais caiu em 2020”, diz.
Uma das explicações para essa tendência, diz Victor Penna, analista do Banco do Brasil, foi a expectativa do investidor com a retomada das vendas. “A possibilidade de melhora na economia animou o investidor em relação às empresas de varejo que estão investindo no comércio eletrônico. E houve fundos fechando contratos de aluguéis relevantes e de longo prazo com grandes empresas deste ramo”, diz.
Quando o PIB vai sair do 1%?
Os resultados do IBC-Br de dezembro, quarto trimestre e ano fechado de 2019, divulgados sexta-feira (14/2), coroaram uma temporada de desapontamentos com os indicadores econômicos do final do ano passado.
Agora, as projeções de crescimento do PIB em 2020 encolhem na direção de 2%, e já começam a surgir prognósticos de que possa até ficar abaixo disso.
Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências, ressalta as decepções na indústria e no varejo (neste caso, sinalizando enfraquecimento no consumo) no final de 2019.
Como a projeção de PIB da Tendências para 2020 já estava no nível, até pouco tempo conservador, de 2,1%, a previsão por ora está mantida, mas Campos Neto nota que o risco é mais para baixo do que para cima no momento.
Ele ressalva que o repique da inflação no final do ano passado pode ter contribuído, como deflator, para deprimir os índices de atividade (o que seria um efeito episódico). Por outro lado, o impacto desapontador da liberação do FGTS preocupa.
De qualquer forma, o economista considera que um ritmo de 2% “é o que ainda está colocado” para a economia brasileira no momento, e a aceleração a médio e longo prazo depende da agenda de reformas e de aumento da produtividade.
É interessante contrastar a visão de Campos Neto, próxima à corrente principal do mercado, com dois analistas que têm leituras da atual conjuntura um pouco deslocadas, para direções opostas.
O economista José Márcio Camargo, da Genial Investimentos (grupo Plural) no Rio, ainda crê num crescimento de 2,5% em 2020, mas condicional a encrenca do coronavírus não se estender por mais de um trimestre.
Já Carlos Kawall, diretor do ASA Bank, ainda mantém 2% para 2020, mas diz que o risco é para baixo, e que pode acabar sendo algo entre 1,5% e 2%.
Mas o mais interessante é contrastar as narrativas dos dois economistas, que, aliás, convergem em termos de médio e longo prazo e no receituário para acelerar a economia.
Começando por Camargo, ele considera que o mercado, de forma geral, está muito sensível a indicadores de curto prazo, perdendo a perspectiva de um movimento mais estrutural que está em curso.
“O Brasil veio montando um conjunto de reformas que cria condições para que cresçamos 2,5% este ano, com aceleração para algo entre 3% e 3,5% em 2021 e 2022”, diz o economista.
Na área fiscal, Camargo dá grande importância à aprovação do teto de gastos no final de 2016. O passo seguinte foi a aprovação da reforma da Previdência, e agora foram enviadas diversas PECs ao Congresso.
Na visão do economista, é bem possível que, dessas PECs, passe o suficiente para que o teto seja cumprido até 2026, quando ele pode ser modificado. E isso resolve por alguns anos o problema fiscal (ele não disse que é uma solução definitiva).
A crença de Camargo num nível razoável de aprovação das PECs se dá por uma questão de incentivos. Com o Orçamento impositivo, quanto mais sobrar dinheiro para os gastos não obrigatórios, mais os parlamentares poderão gastar com suas emendas. Assim, eles se alinham com o objetivo da equipe econômica (e que é parte do conteúdo das PECs) de restringir o gasto obrigatório.
O analista também julga muito importante a reforma tributária, e acha que os líderes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, têm incentivos para apadrinhá-la.
Camargo, um especialista em mercado de trabalho, tem um particular entusiasmo pela reforma trabalhista que, para ele, já está tendo efeitos relevantes.
Ele vê potencial de ganho de produtividade no aumento dos trabalhadores por conta própria (especialmente com CNPJ), já que quem é patrão de si mesmo tem mais incentivos a produzir mais (já que isto se reverte imediatamente em mais ganhos) do que empregados.
O economista também cita efeitos sobre a produtividade a reforma do ensino médio, à medida que for sendo implementada. Os principais ganhos, para ele, são a redução do número de matérias ensinadas, o que facilita o aprendizado dos mais pobres, e a introdução de cadeiras profissionalizantes.
Fora isso, ele vê “algum grau de abertura econômica que já começa a acontecer, e observa que há toda a agenda microeconômica que vem se materializando, como a TLP e o cadastro positivo.
“O crescimento é um problema microeconômico e toda reforma que faz os mercados funcionarem melhor facilita a otimização da alocação de recursos, que conduz ao aumente da produtividade e à aceleração do crescimento”, sintetiza Camargo.
Na visão do economista, todos as diversas mudanças mencionadas acima vêm ganhando uma força cumulativa e devem garantir um melhor desempenho da economia brasileira nos próximos anos.
Kawall, por sua vez, começa dizendo estar muito alinhado com a visão de Camargo sobre os caminhos para o Brasil acelerar ao crescimento. Tanto que, pensando em 2021 e 2022, ele acha possível um ritmo de crescimento entre 2,5% e 3%, se de fato a agenda de reformas for implementada a contento.
O problema é que, por enquanto, ele vê um de crescimento de 1%, ou pouco mais do que isto, como um “ritmo basal” da economia brasileira.
O economista nota que o PIB cresceu em torno de 1%, ou ligeiramente mais, de 2017 a 2019. Ele estima que o crescimento (ante o tri anterior, dessazonalizado) do quarto trimestre de 2019, descontado o efeito do FGTS, deve ter sido de 0,2%. Já o crescimento que projeta para o primeiro trimestre de 2020 é 0,3%. Tomando os dois números, está se falando de uma economia que teria voltado a crescer a um ritmo anualizado em torno de 1%, na margem.
O ponto de Kawall, entretanto, é de que os analistas deveriam inverter o foco: em vez de sair em busca de choques que expliquem por que a economia mais uma vez não cresceu no ritmo esperado, agora de 2%, deveriam assumir que o “ritmo basal” é mesmo de 1% – e que, portanto, não deveria ser uma surpresa que o PIB reverta ao seu padrão médio recente.
O analista nota que, no movimentado período dos últimos anos, de fato a economia brasileira sofreu muitos choques, mas estes não foram apenas negativos: em 2017, por exemplo, a supersafra fez o PIB crescer a um ritmo bem mais forte no primeiro trimestre, mas ainda assim o ano não fugiu ao padrão em torno de 1%.
Um total de R$ 88 bilhões foi injetado na economia de 2017 a 2019, somando liberações de FGTS e PIS/PASEP. Ele acrescenta que se fala no choque da crise argentina agora, mas tomando como base as exportações brasileiras para o país vizinho em 2017, que tiveram o melhor resultado em nove anos. A média de crescimento argentino de 2011 a 2019 está em torno de 0,7%, o que mostra que o impulso das exportações para o parceiro não pode ser grandes coisas.
“O ‘outlier’ na verdade foi 2017”, diz Kawall.
Assim, o ritmo “normal” da economia brasileira nos últimos anos, e ainda agora, é mesmo em torno de 1% anual, com momentos em que os resultados trimestrais vão para cima deste nível, e outros em que vão para baixo.
Kawall concorda com Camargo que toda a agenda já em andamento de reformas macro e microeconômicas melhoraram a economia brasileira pelo lado da oferta, e aumentaram o crescimento potencial.
A curto prazo, porém, há o problema da demanda, e o ajuste fiscal pelo lado da receita e o ajuste parafiscal (Kawall apoia ambos) tornaram esse problema ainda mais complicado. A economia global também não está contribuindo.
Para o economista, o “driver” para a aceleração deve ser a agenda de privatizações e concessões em infraestrutura, e a retomada de grandes obras paralisadas pela Lava-Jato.
Mas a dificuldade é que, pelas questões envolvidas no trâmite desses projetos, a tração econômica dessa agenda deve ficar para 2021 e 2022, na sua visão. A recuperação da construção civil habitacional também pode ajudar, mas por enquanto ela ainda está muito localizada (o epicentro parece ser o município de São Paulo).
Dessa forma, Camargo e Kawall comungam da visão de um PIB que pode crescer até 3% ainda neste mandato presidencial, nas asas do atual momento reformista da economia brasileira (e supondo que ele continue). Mas há uma diferença de timing. Camargo pensa que já está acontecendo, e Kawall vê a aceleração como algo que talvez ainda esteja um pouco à frente.
O GLOBO
Economista do Citi Brasil diz que alta do dólar reflete fatores externos
Enquanto muitos bancos ainda nem refizeram as projeções de crescimento da economia da China para este ano, após o estouro da crise do coronavírus naquele país, o Citi já revisou para baixo suas estimativas duas vezes. E fez o mesmo para o Brasil, que deve crescer menos por causa da epidemia, segundo os cálculos do banco. Uma semana após o início do surto, a expectativa de crescimento chinês caiu de 5,8% para 5,5%. Duas semanas depois, o Citi a reduziu para 5,3%. Em entrevista ao GLOBO, o economista-chefe do banco no Brasil, Leonardo Porto, diz que o impacto inicial da crise já tirou quase 10% da estimativa de expansão do PIB este ano, sendo o país tão ligado comercialmente à China. Para ele, a escalada do dólar por aqui se deve principalmente à instabilidade global.
Qual será o impacto da crise do coronavírus para a economia brasileira?
Reduzimos a estimativa de crescimento de 2,2% para 2% este ano. Começamos a incorporar o impacto da epidemia pelo lado das exportações. A China compra 28% de tudo o que o Brasil exporta. Se as exportações caírem 50% durante o primeiro mês da epidemia, então o impacto será de 0,2 ponto percentual.
Os dados mais fracos da indústria, varejo e serviços no fim do ano passado no Brasil também foram levados em conta nessa revisão da taxa de expansão esperada para 2020?
O efeito dos dados mais fracos foi marginal. O grosso mesmo foi o do coronavírus.
Por que o Citi reduziu duas vezes a estimativa do crescimento chinês este ano?
Há uma incerteza gigantesca sobre quanto tempo vai demorar para o país controlar a epidemia. Quanto mais você isola as pessoas para controlar o vírus, mais os problemas econômicos crescem, vão se maximizando. As fábricas ficam fechadas. Ninguém sai para trabalhar. As informações são de que há um colapso na atividade chinesa, desde queda no consumo de carvão até venda de casas.
No Brasil, o dólar próximo de R$ 4,30 tem a ver com o coronavírus?
Há uma ansiedade grande quanto à trajetória da taxa de câmbio. Mas é preciso lembrar que esse dólar está refletindo os fatores externos. O coronavírus não é uma coisa pequena. Isso está afetando preços de commodities de forma significativa. E os três produtos mais exportados no ano passado pelo Brasil foram soja, minério de ferro e petróleo. Se nossos produtos estão valendo menos, nossa moeda vai acabar depreciando.
Qual é a expectativa do dólar para o fim deste ano?
Para o Citi, a expectativa é de um dólar a R$ 4,14 no final do ano, baseado na hipótese de que o coronavírus vai ser controlado até o fim do primeiro trimestre.
Esse dólar alto não trará impacto para a inflação?
A atual alta do câmbio está ligada à queda do preço das commodities, e isso não vai pressionar a inflação. Quando o valor das commodities cai no mercado internacional, tira o impacto inflacionário mesmo quando o dólar se aprecia.
O real depreciado não ajuda os exportadores?
O lado negativo é que não vai ajudar tanto o setor industrial. O que tem passado despercebido é que o setor industrial está com o desempenho muito pior que o da economia brasileira desde meados de 2018. E esse é um fenômeno global, outros países estão passando pelo mesmo problema.
O que explica essa estagnação da indústria mundial?
Primeiro, a queda do ritmo de crescimento da economia global. Em 2019, a economia mundial deve ter crescido 2,7%, frente aos cerca de 3% de 2018. Só isso já faria com que houvesse uma redução do comércio mundial. Em paralelo, a partir do ano passado, houve uma escalada na guerra comercial entre Estados Unidos e China. Houve um colapso do comércio mundial por causa dessa guerra. A performance pior do setor industrial tem a ver com o ciclo de negócios mundial.
O acordo comercial entre China e EUA em dezembro não representou uma trégua?
A assinatura do acordo foi positiva. Mas aí veio o coronavírus. Para este ano, projetamos um crescimento do PIB brasileiro de 2%, mas a produção industrial deve crescer cerca de 1,2%.
As reformas vão andar no Congresso?
A parte política será um desafio porque este ano tem um calendário mais curto (por causa das eleições municipais). Não que não possa aprovar nada no segundo semestre, mas como estamos falando de Propostas de Emenda à Constituição (PECs), fica mais difícil.
O senhor acredita na aprovação da reforma tributária?
A reforma tributária tem um caminho bastante longo para ser discutida. Tem proposta na Câmara, no Senado e o governo vai mandar a sua. É um tema bastante complicado, vai tratar de incentivos tributários, ICMS dos estados, e a maior parte tem uma situação fiscal frágil. Quem vai aceitar perder? Se tiver uma reforma tributária este ano, deve ser bastante diluída.
Qual deveria ser o foco do governo nas reformas?
O foco deveria ser a PEC Emergencial (conjunto de medidas de controle do crescimento das despesas obrigatórias e reequilíbrio fiscal, que está no Senado). A proposta não tem pontos conflitantes e ajuda os estados e o governo federal no ajuste fiscal.
O senhor está otimista quanto às chances de aprovação?
Ainda está faltando o governo e o Congresso alinharem as prioridades para termos uma visão mais clara do que pode ser aprovado.
VALOR
Fim de ano fraco impõe revisão para PIB de 2020
A queda do indicador de atividade do Banco Central em dezembro consolidou a percepção de que o crescimento no fim de 2019 foi mais fraco do que o esperado e levou economistas a revisarem suas projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2019 e, principalmente, o deste ano.
Ainda sem a ameaça de repetir um quarto ano seguido de crescimento na casa de 1%, cada vez mais as estimativas convergem para um patamar próximo de 2% em 2020, em vez de 2,5%. O Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) caiu 0,27% em dezembro, com ajustes ante mês anterior, após um novembro negativo em 0,11%, informou o BC na sexta-feira. No ano, o IBC-Br cresceu 0,89%, e, apesar de este ser o terceiro ano positivo seguido, significa desaceleração em relação à alta de 1,34% de 2018.
Em relatório, o Santander fala em “grande e disseminada frustração” a partir dos dados do quarto trimestre. O banco cortou pela metade sua estimativa para o PIB do período, de alta de 0,8% para 0,4%, abaixo do 0,6% registrado no terceiro trimestre de 2019. Com isso, reduziu a estimativa para o PIB de 2019, de 1,2% para 1,1%, mas o impacto mais expressivo fica para 2020, cuja projeção foi de 2,3% a 2%.
Já o banco inglês Barclays cortou sua previsão para quarto trimestre de 0,75% para 0,5%, enquanto o fechado do ano foi reduzido em 0,1 ponto, para 1,1%. A projeção para 2020 passou de 2,3% para 2,1%. O movimento dos bancos nas projeções de 2020 acompanha cortes promovidos na semana passada por Safra (de 2,3% para 2,1%) e Citi Brasil (de 2,2% para 2%) e, na semana anterior, por UBS (de 2,5% para 2,1%) e JPMorgan (de 2% para 1,9%).
O Itaú Unibanco revisou sua projeção para o PIB do quarto trimestre de 0,6% para 0,5%, mas ainda não mexeu nas estimativas para o ano passado (1,2%) e 2020 (2,2%), que têm viés de baixa. O Bradesco cortou o PIB do quarto trimestre para 0,5%, ante 0,7%. Com o desempenho surpreendente da atividade no terceiro trimestre e também em outubro, economistas estimaram aceleração do PIB no último período de 2019, impulsionado pelo consumo.
Nos últimos meses do ano, porém, acumularam frustrações. O varejo ampliado, que inclui veículos e material de construção, recuou 0,6% em novembro, ante outubro, e caiu 0,8% em dezembro. O setor de serviços cedeu 0,1% e 0,4%, respectivamente. “Antes eu via o quarto trimestre como o melhor do ano, hoje vejo como algo muito próximo do terceiro”, diz Thiago Xavier, economista da Tendências Consultoria Integrada.
Segundo especialistas, ajudam a explicar a quebra das expectativas fatores como o choque no preço dos alimentos e uma possível concentração de saques do FGTS em setembro e outubro. O consenso agora é que 2020 começa com ritmo mais fraco do que o previsto. “As quedas de novembro e dezembro levam um carrego estatístico negativo para o primeiro trimestre e reforçam a visão de que o PIB vai ser mais fraco do que no terceiro e quatro trimestres do ano passado, com um PIB mais próximo de 2% do que de 3% neste ano”, diz Luka Barbosa, economista do Itaú.
Indicadores antecedentes de janeiro dão sinais mistos. As métricas de confiança, com exceção da para serviços e consumidor, avançam, mas podem registrar um otimismo da virada de ano que já não encontra muito espaço. Indicadores coincidentes da indústria, como expedição de papel ondulado, cresceu, enquanto o emplacamento de veículos, sinalização para o varejo, recuou.
O Barclays vê avanço de 0,4% na atividade do período, revista de 0,6% anteriormente. Para o Santander, o PIB do primeiro trimestre deve ficar perto de 0,2%, acelerando para uma média de 0,6% nos trimestres seguintes, “o que é considerável”, diz o economista do banco Lucas Nobrega. A situação relativa ao coronavírus, ele ressalta, deve ser monitorada com atenção. Na conta do Santander, se o impacto da doença, que paralisa as China, começar a se normalizar a partir do segundo trimestre, o reflexo negativo seria de 0,1 ponto percentual no PIB brasileiro de 2020.
Impacto fiscal seguirá contracionista em 2020 e 2021, diz Itaú
Em terreno expansionista por mais de uma década, o impacto da política fiscal na economia brasileira inverteu sinal após o teto de gastos e deve seguir negativo nos próximos dois anos. A conclusão é de Pedro Schneider, economista do Itaú Unibanco, que calculou três métricas diferentes de impulso fiscal. Todas elas apontam efeito contracionista de 2019 a 2021. Assim, cada vez mais, o setor privado será o indutor do crescimento.
Esse impacto negativo das contas públicas sobre a demanda agregada também facilita o trabalho do Banco Central, ao abrir espaço para que os juros fiquem em patamar baixo por mais tempo. Em relatório antecipado ao Valor, a primeira medida estimada por Schneider foi o resultado primário (excluindo gastos com juros) estrutural.
Debatido por especialistas como alternativa que captura com maior exatidão os efeitos da política fiscal sobre a economia, esse indicador procura mostrar a situação das contas públicas quando são descontados o efeito do ciclo econômico e despesas e receitas extraordinárias.
Nesse conceito, gastos e receitas não recorrentes, como a arrecadação com o leilão da cessão onerosa da Petrobras, deixam de fazer parte da conta. O resultado fiscal também é ajustado pelo ciclo econômico, o que poderia conferir caráter anticíclico à postura fiscal, com maior poupança em tempos de crescimento elevado da receita, possibilitando economia menor quando a atividade estiver fraca.
Mesmo após esses ajustes, o Brasil ainda está longe de ter situação fiscal confortável, diz Schneider. Ele observa, porém, que houve melhora em 2019, que deve continuar. Em suas estimativas, o resultado primário estrutural foi negativo em 0,5% do PIB no ano passado, déficit que deve recuar a 0,4% do PIB neste ano, ficando praticamente zerado em 2021 (-0,1% do PIB).
Segundo o economista, a melhora deve ser mais significativa em 2021 porque o governo federal tem uma margem maior para gastar este ano: em 2019, a despesa primária da União ficou R$ 34 bilhões abaixo do limite do teto. Essa “folga” deve ser reduzida para R$ 10 bilhões ao fim de 2020, calcula Schneider.
Os gastos serão maiores em 2020 porque o impacto da reforma da Previdência sobre as contas públicas ainda será relativamente pequeno este ano. Além disso, as despesas com desoneração da folha de pagamentos e precatórios deixarão de ocorrer no ano seguinte, explica ele. Assim, o impulso fiscal, medido pela variação do resultado primário estrutural entre um ano e outro, será praticamente nulo no ano corrente (-0,05% do PIB), caindo para -0,3% do PIB em 2021.
De acordo com o Itaú, esse impulso foi positivo em 0,3% do PIB ao ano, em média, de 2001 a 2015. Mais simples, a segunda métrica usada para estimar o impacto da política fiscal na demanda compara a evolução do gasto público e do PIB potencial (aquele que, em tese, não acelera a inflação). Para que as contas públicas fiquem equilibradas, observou Schneider, o gasto do governo precisa crescer a um ritmo próximo do crescimento potencial do país, relação que ficou longe do observado entre 1997 e 2015.
Nesse período, os gastos primários federais avançaram cerca de 6% em termos reais ao ano, em média, ao passo que o PIB potencial estimado foi de 2,7% na mesma comparação, diz o economista. Já de 2016 a 2019, o crescimento do gasto desacelerou para 0,8% ao ano, em linha com o PIB potencial, trajetória atribuída à regra do teto de gastos, segundo Schneider.
Mesmo com algum ganho de fôlego, os gastos ainda vão se expandir em velocidade inferior à do produto potencial este ano, destaca Schneider, mantendo a postura contracionista da política fiscal. Em 2020 e 2021, o banco estima que o impulso fiscal dessa medida será negativo em 0,6% do PIB, também na média de cada ano, após ficar zerado entre 2016 e 2019.
Por fim, a terceira métrica, que busca incluir o impacto da política parafiscal, vai na mesma direção. O Itaú estimou o desempenho dos desembolsos do governo, somando os gastos da administração pública, o investimento público e a concessão de empréstimos do BNDES a empresas. Nessa medida ampliada, o “tamanho” do governo como proporção do PIB potencial chegou ao pico de 26% em 2014 e, desde então, passou a diminuir, chegando a 20,7% do produto ano passado.
“Mantido o ajuste fiscal, a medida continuará recuando, ratificando que a retomada da economia se dará com maior participação do setor privado”, diz Schneider. No cenário do banco, a demanda doméstica privada vai crescer acima do PIB neste ano e no próximo. Em 2020, a soma do consumo das famílias e do investimento deve avançar 3,3%, aponta Schneider, com alta de 2,2% no PIB total.
No ano seguinte, o crescimento da demanda privada vai acelerar a 4%, um ponto acima da alta esperada para a economia como um todo. “Quando a participação do governo na economia é maior, não necessariamente os melhores projetos são escolhidos”, afirma Schneider. O economista ainda ressalta os efeitos da política fiscal mais contracionista sobre a taxa de juros neutra, que permite o crescimento econômico sem pressões inflacionárias.
O Itaú estima que a taxa neutra estaria ao redor de 2% hoje, após ter ficado em 3,4% de 2015 a 2018. “É fundamental que a política fiscal e a parafiscal permaneçam controladas, mantendo o teto de gastos, para que o juro permaneça baixo”, avalia Schneider.
Copom dá pesos iguais às metas de 2020 e 2021
Vários analistas econômicos ficaram incomodados com o foco que o Banco Central passou a dar, de forma mais prematura do que de costume, para a meta de inflação do ano que vem, embora este ano mal tenha começado. Para alguns, seria apenas um expediente para não reduzir ainda mais os juros básicos agora, quando as projeções de inflação para 2020 indicam um bom espaço para a meta de taxa Selic cair abaixo dos atuais 4,25% ao ano. A explicação mais provável: o Banco Central não abandonou a meta de 2020, mas também está de olho na meta de 2021.
A política monetária, neste momento, foca com peso iguais os dois anos. É como se o alvo imediato fosse a média entre a meta de inflação deste ano, de 4%, e a do próximo, de 3,75%. O que levou o Comitê de Política Monetária (Copom) a anunciar a interrupção do ciclo de distensão monetária, na verdade, parece ter sido um balanço de riscos assimétrico, que atribui um peso maior aos fatores potencialmente altista da inflação do que os potencialmente baixistas.
Ao longo dos meses, o Banco Central desloca gradualmente o alvo da política monetária de um ano para o outro. Isso é feito com trocas sutis de termos e na ordem das palavras dos documentos oficiais do Copom, quase imperceptíveis a olhos menos atentos. Primeiro, o BC avisa que o foco da política “inclui, em menor grau, o ano seguinte”. Depois, diz que inclui o ano seguinte “de forma crescente, mas em menor grau”.
Mais adiante, diz apenas que “inclui de forma crescente” o ano seguinte. Por fim, tira o ano corrente do radar e diz que o foco é só o ano seguinte. Na ata de sua reunião mais recente, divulgada na semana passada, o Copom queimou uma etapa nesse ritual de comunicação. Disse que estava focando “de forma crescente” em 2021, sem dizer “em menor grau”, como a esta altura do campeonato costumava fazer.
A quebra do padrão levou analistas do mercado a acreditarem - com razão - que algo mudou na comunicação do BC e, portanto, na execução da política monetária. Uma interpretação muito comum, que não está correta, é que o Banco Central jogou a toalha sobre a meta de inflação deste ano, de forma prematura.
A inflação está projetada em 3,5% para 2020, bem abaixo da meta, de 4%, o que significa que havia espaço para baixar a Selic ainda mais, sem colocar em perigo o cumprimento do alvo deste ano. Mas a margem para juros menores desaparece se o Copom tiver deslocado o seu foco para apenas 2021. As projeções oficiais indicam uma inflação entre 3,7% e 3,8% no próximo ano, ante uma meta de 3,75%. Essas projeções significam que, se os juros caírem, a inflação ficará acima do alvo.
O pano fundo das queixas é que, na visão de muitos analistas do setor privado, o Copom está sendo conservador demais na condução da política monetária. Depois de uma safra de indicadores mais forte de retomada da economia em fins de 2019, os dados mais recentes voltaram a decepcionar. A inflação corrente segue muito baixa, e os núcleos, que excluem ruídos de curto prazo e mostram a tendência dos índices de preços, são benignos. Há, ainda os primeiros sinais de queda das expectativas de inflação de 2021, que estariam a um passo de se desancorarem.
Cerca de 20% dos analistas já preveem inflação abaixo de 3,75% no ano que vem; as projeções ficaram mais dispersas; e as estimativas atualizadas mais recentemente têm uma tendência de baixa. A pausa anunciada pelo BC no ciclo de corte de juros, porém, não tem relação com o deslocamento de alvo da política monetária.
A ata do Copom informa que o anocalendário de 2021 tem peso crescente nas decisões de política monetária, mas não está dito que abandonou o ano de 2020 à própria sorte. O que mudou na comunicação do Copom foi deixar de dizer, como fizera em anos anteriores, que o ano de 2021 tem peso crescente, “mas menor” no manejo da política monetária. Isso significa que o colegiado está atribuindo pesos iguais para as metas dos anos calendário de 2020 e de 2021.
Em termos práticos, como já dito, o Copom está mirando algo como a média das metas de inflação desses dois anos. Como a média das projeções de inflação está abaixo da média das metas de inflação, em tese há espaço para cortar mais ainda a taxa básica de juros. Se, de fato, o Copom vai cortar, é outra história. O colegiado tem indicado que o balanço de riscos pende mais para o lado negativo, por isso hoje o Copom vê suas projeções de inflação no cenário básico com uma dose de cautela.
Vistos juntos, a soma das projeções e o balanço de riscos levou o Copom, de forma consensual, a decidir por uma interrupção nos cortes de juros a partir de março e a comunicar que precisa de alguns meses para observar o cenário econômico. O que o colegiado vai fazer depois desse período é, hoje, incerto.
Há um embate de visões de membros do Copom entre conservadores e moderados. Alguns receiam que a capacidade ociosa da economia poderá se esgotar mais rápido do que o previsto e outros enfatizam que os baixos núcleos de inflação mostram um bom espaço para a economia crescer sem causar pressão exagerada nos preços.
Por que o BC passou a dar peso a 2021 nas suas decisões mais cedo do que o costume? O Brasil está num processo de convergência para meta de inflação mais baixas, saindo de 4,5% em 2018 para provavelmente 3% até 2024. Isso provoca um problema prático na condução da política monetária. Se a inflação estiver muito baixa num ano, o BC deve procurar acelerá-la, cortando os juros.
Mais adiante, deve subir os juros, para cumprir a meta mais baixa do ano subsequente. Essa era teoria seguida até agora no BC, que focava nos anos-calendário. A abordagem é boa para a credibilidade da política monetária, pois fica fácil o Copom comunicar seus objetivos. O inconveniente é a volatilidade na taxa de juros, ora baixando para depois subir.
A nova forma de atuar do Banco Central, focando em alguns momentos em um ponto intermediário das metas de dois anos-calendário, atenua a volatilidade dos juros. Mas pode levar a alguns mal entendidos, como mostra a forma como analistas receberam a comunicação recente do Copom.
Santander reduz projeção de PIB de 2,3% para 2% em 2020
Citando o choque para a economia global da epidemia de coronavírus, que teria revertido pelo menos parte das expectativas de que 2020 seria o ano de recuperação da economia mundial, o Santander revisou para baixo suas projeções para o crescimento da economia brasileira de 1,2% para 1,1% em 2019, de 2,3% para 2,0% em 2020, e de 3,0% para 2,5% em 2021, em relatório assinado pela economista-chefe do banco, Ana Paula Vescovi.
“Os dados de atividade referentes ao quarto trimestre frustraram e o crescimento econômico em 2019 e 2020 deverá ser menor que o esperado em nosso último relatório mensal”, diz o texto. “Apesar das revisões baixistas, entendemos que a composição do crescimento doméstico segue positiva, em particular com a maior participação da demanda do setor privado”, pondera.
O banco avalia que “a agenda econômica reformista não será interrompida, mas poucas propostas devem ser aprovadas em 2020, tendo em vista a grande quantidade de PECs (Propostas de Emenda Constitucional) em tramitação no Congresso e o calendário parlamentar abreviado pelas eleições municipais”. O Santander prevê a aprovação de um “pacote emergencial de contenção de gastos obrigatórios este ano, o que permitirá manter a despesa federal abaixo do teto constitucional”.
Ganho com imóvel pode alcançar dois dígitos ao ano até 2022
Que o mercado imobiliário está em ascensão no país ninguém contesta. Mas qual o potencial de ganho de capital para o investidor no atual cenário? Especialistas ouvidos pelo Valor veem espaço para os preços de venda e os aluguéis crescerem, a partir do patamar atual, pelo menos, de dois a três pontos percentuais acima da inflação por três a até seis anos seguidos — o período e a intensidade vão depender da confirmação de catalisadores, como aprovação de reformas, aceleração do crescimento e estabilidade internacional. Porém, gestores e economistas já consideram grandes as chances de os valores subirem dois dígitos pelos próximos três anos ou além.
O diretor da Ourinvest Real Estate e professor do Insper, Rossano Nonino, estima uma elevação de preços do metro quadrado e de locação de 12% a 15% ao ano, em média, até 2025. Quem lidera o movimento hoje é a capital paulista, mas outras regiões devem seguir o avanço nos próximos anos. O especialista faz algumas ressalvas sobre a projeção. “O mercado imobiliário tem características muito específicas e o comportamento dos preços obedece a inúmeras variáveis, como localização — existem cidades em que o preço ainda cai —, tipo, ou seja, se é comercial ou residencial, perfil e diversas outras considerações”, pondera.
Apesar de os municípios e segmentos apresentarem ritmos de recuperação diferentes, existe uma tendência consolidada de os valores ou terem estabilidade ou subir. O CEO da RBR Asset Management, Ricardo Almendra, revela que seu cenário base para os imóveis comerciais contempla uma subida média de preços, tanto do metro quadrado quanto da locação, de 15% em 2020 e mais 10% em 2021 na capital paulista, o maior mercado do país.
Mas considera grande a possibilidade de as elevações se manterem nesse patamar por mais tempo. O gestor explica que hoje os preços de vendas de imóveis estão em torno de 20%, em média, abaixo dos valores atingidos antes do início da recessão, em 2014. “Vejo grande possibilidade de os valores, inclusive, superarem o pico visto cinco anos atrás” até o fim do atual ciclo, afirma Almendra.
Nesse cenário e com taxas praticadas hoje no crédito imobiliário na casa de um dígito, a valorização potencial de um imóvel pode até superar o custo do empréstimo. “É uma situação na qual a alavancagem pode se tornar vantajosa ao investidor, que pode arbitrar ganho entre o preço do financiamento e o de venda em um horizonte de até seis anos, se o cenário de expansão se concretizar”, avalia Nonino.
O índice Fipe-Zap, que mede a variação de preços anunciados de imóveis residenciais, mostra uma alta média nominal de 8,14% em São Paulo entre 2015 e 2019, para venda, e subida acumulada de 7,9% na locação. Mas quando se considera o resultado real, ou seja, corrigido pela inflação, os dados indicam perda de 16,64% no caso dos aluguéis e variação negativa de 16,46% para as negociações de compra e venda. No Rio de Janeiro, nas mesmas bases, a locação recuou 22,9% em termos nominais e 40,49% reais.
Os valores de venda, por sua vez, caíram 13,31% nominalmente e 33,03% com ajuste da inflação. Especialistas ressalvam, porém, que os preços anunciados, que é a base do índice Fipe-Zap, podem ser diferentes dos efetivamente transacionados. Nos últimos anos, para concluir as operações, proprietários tiveram de incluir, em grande parte das negociações, descontos de até 30% sobre os preços iniciais.
Nonino, do Insper, lembra ainda que, quando se fala em retomar o nível de preços de antes da crise, significa que o caminho de volta é maior em termos percentuais comparado à queda. Por exemplo, um imóvel que custava R$ 100 mil em 2014 e passou a valer R$ 70 mil no ano passado teve uma desvalorização de 30%. Mas para recuperar o valor de seis anos atrás teria de subir 43%. E, no caso de uma propriedade no qual o valor de venda caiu pela metade, então seria preciso uma alta de 100% para retomar o preço máximo alcançado.
O diretor financeiro do site Imovelweb, Tiago Galdino, tem uma visão mais cautelosa sobre o ritmo de alta dos imóveis. Segundo o especialista, uma variável essencial será a retomada do emprego e da renda. “Em 2020, estimo uma subida de preços em São Paulo no mesmo passo da inflação e em 2021 começa um incremento acima da inflação”, diz.
Para Galdino, se o índice de desemprego alcançar o mesmo patamar registrado em 2013, o ritmo de alta de preços imobiliário aceleraria. “No mínimo, alcançaria 2 a 3 pontos percentuais acima do IPCA, sem dúvida.” O coordenador de pesquisas da Fipe e responsável pelo índice Fipe-Zap, Eduardo Zylberstajn, explica haver, no entanto, velocidades diferentes de retomada entre as regiões do país. “Depende de cada cidade; o Rio de Janeiro, por exemplo, tem questões mais profundas a serem resolvidas.
Em outras capitais como Porto Alegre, Curitiba e João Pessoa, os preços ainda caem”, diz o economista. Por outro lado, além de São Paulo, segundo ele, Florianópolis tem exibido aumentos robustos. De acordo com Zylberstajn, os preços de venda em geral variam com menor intensidade do que os de locação em períodos de crise.
“A gente aprendeu com a crise que o preço de venda é mais rígido por vário fatores, porque, por exemplo, se sei que meu vizinho vendeu um imóvel por R$ 500 mil é difícil aceitar vender por muito menos.” No caso do aluguel, os proprietários se tornam mais propensos a negociar porque aceitar um desconto é melhor do que arcar com os custos de um imóvel fechado.
Mercado aguarda próximos passos do BC
Depois das intervenções do Banco Central (BC) que fizeram o dólar quebrar seis semanas consecutivas de valorização contra o real, o mercado começa a semana se questionando sobre possíveis novas ações da autoridade monetária no câmbio. Ao menos por ora o BC não anunciou um leilão de novos contratos de swap cambial, mas analistas não descartam que a autarquia possa se fazer presente no mercado caso haja um outro momento de estresse cambial.
No fim da tarde de sexta-feira, o dólar comercial fechou cotado a R$ 4,2997, em queda de 0,79%. Na semana, o recuo da moeda americana foi de 0,47%, a primeira baixa acumulada desde os últimos dias de dezembro, embora ainda suba 7,23% em 2020.
Os estrategistas Kenneth Lam, Andrea Kiguel e Dirk Willer, do Citi, acreditam que a ação do BC na semana passada “não foi surpreendente para nós e o mercado a antecipou até certo ponto”, após o dólar se aproximar da marca de R$ 4,40 na quinta-feira.
“A intervenção ajuda, mas o impacto tende a ter vida curta, mesmo que seja eficaz”, aponta o Citi, ao notar, ainda, que a taxa de câmbio efetiva real (REER) do Brasil “está em níveis mais fracos em comparação com as duas últimas intervenções” - o que mostra a fragilidade da divisa neste momento.
O economista-chefe do UBS Brasil, Tony Volpon, considera corretas as ações do BC, já que elas ocorreram em um momento no qual o real vinha registrando performance abaixo dos pares comparáveis por vários pregões seguidos. Para ele, “o desmonte de posições vendidas em dólar, especialmente por investidores locais, deixou o mercado um pouco desorbitado”. Daí a necessidade de intervenção do BC com a oferta nova de swaps.
Ao comentar sobre a necessidade de um programa de swap, com maior volume e duração como em outras ocasiões, Volpon, diz acreditar que tudo dependerá do fluxo de notícias. “Talvez o BC tenha que anunciar algo mais sistemático do que intervenções pontuais, mas ainda não estamos próximos do nível de volatilidade que levaria o BC a fazer algo sistemático”, afirma o economista, que já foi diretor de Assuntos Internacionais da autoridade monetária.
Para fontes do mercado, a ação do BC no câmbio serve para suprir uma demanda por proteção e barra o risco de um movimento mais especulativo. “Não tira a primazia do mercado em determinar a taxa de câmbio, mas ajuda a suavizar um movimento de volatilidade”, explica uma fonte, que vê a intervenção em momentos de estresse ou de falta de liquidez como adequada.
O estrategista-chefe para mercados emergentes do Deutsche Bank, Drausio Giacomelli, diz duvidar sobre uma mudança na política do BC após a intervenção. Ou seja, a autoridade monetária não deve subir juros para conter a escalada do dólar ou iniciar um programa mais sistemático de atuação no câmbio. “As declarações do ministro da economia e do presidente do BC reafirmam seu forte alinhamento nas questões econômicas e a convicção de que um real fraco é bom”, afirma Giacomelli.
Embora seja difícil de cravar, o profissional diz que a abordagem do BC sobre o câmbio “pode ter contribuído para o status do real”, de ser usado em operações de hedge contra riscos locais e do exterior. Também William Jackson, economista-chefe para mercados emergentes da Capital Economics, acredita que, com suporte do BC, o real pode recuperar terreno no curto prazo.
Ele, contudo, acredita no enfraquecimento contínuo da moeda brasileira diante do crescimento econômico mais lento e da taxa de juros nas mínimas históricas. Assim, a consultoria vê pouca justificativa para a visão de que o real terminará o ano muito mais forte do que os níveis atuais.
Assim, a consultoria alterou sua projeção e, agora, espera que o dólar termine 2020 em R$ 4,50 ante uma estimativa de dólar a R$ 4,25 antes. Na semana passada, os dados de varejo, serviços e o IBC-Br de dezembro mostraram uma desaceleração da atividade no quarto trimestre de 2019, o que pavimentou o caminho para as expectativas de Selic baixa por um período prolongado.
A economista-chefe da BNP Paribas Asset Management, Tatiana Pinheiro, diz que o mercado tende a “exacerbar o tamanho do dano”, como visto com o dólar no nível recorde a R$ 4,3830. “Passado o susto com o coronavírus, acredito em um retorno do dólar em torno de R$ 4,25, mas não vejo um movimento muito maior do que esse”, afirma, dados os fatores estruturais que têm pesado sobre o câmbio.
FOLHA
Mercado já vê crescimento de 2% em 2020 mais como alvo do que como piso
Resultados de atividade abaixo dos esperados em dezembro e indicadores antecedentes um pouco contraditórios de janeiro tornam os próximos dois meses cruciais para determinar se o governo Jair Bolsonaro conseguirá entregar um crescimento do PIB superior a 2% neste ano.
Com rebaixamentos pontuais em algumas previsões, um crescimento ao redor de 2% em 2020 já é encarado por parte do mercado mais como alvo do que como piso.
Os dois maiores bancos privados do país, Itaú Unibanco e Bradesco, no entanto, mantêm por enquanto suas estimativas: 2,2% e 2,5%, respectivamente. Mas o viés é de leve baixa no caso do Itaú Unibanco.
O mercado ainda vê pontos favoráveis na construção civil, na safra agrícola recorde, no consumo das famílias, no mercado de trabalho e, principalmente, no aumento do crédito.
Embora a taxa geral de desemprego tenda a permanecer elevada, ao redor de 11%, a expectativa é de formalização mais acelerada das vagas hoje precárias, com impactos positivos na renda e na confiança dos consumidores.
Na contramão, persiste a incerteza em relação à indústria e, consequência disso, a falta de uma retomada mais firme nos investimentos produtivos —adiados diante da elevada capacidade ociosa.
Sobre esse panorama pairam dúvidas a respeito do equilíbrio das contas públicas e da agenda de reformas neste ano eleitoral, mais curto para o Congresso.
A falta de definição até agora do que será prioritário na pauta (PEC da Emergência Fiscal, reforma administrativa ou tributária) já é vista em alguma medida como a repetição da desordem política do ano passado, que acabou afetando o crescimento.
Mais otimista entre bancos e consultorias ouvidos pela Folha, o Bradesco manteve a previsão de 2,5% para o PIB apoiado em dois pilares: recuperação do emprego formal e aumento do crédito.
Segundo Fernando Honorato, economista-chefe do banco, a melhora do mercado de trabalho neste momento, levando em conta séries históricas, é compatível com um PIB até mais forte.
“É cedo para qualquer revisão, e encaramos os dados um pouco mais fracos no fim do ano como ruídos. O emprego formal vem superando bem nossas expectativas”, diz.
Sobre uma eventual desaceleração externa causada pelos impactos do coronavírus, Honorato diz que haveria algum espaço adicional para o Banco Central cortar mais o juro básico, hoje em 4,25% ao ano.
Para Luka Barbosa, economista sênior do Itaú Unibanco, os dados mais fracos do fim de 2019 vieram dentro das expectativas do banco.
O IBC-Br (Índice de Atividade Econômica do Banco Central) caiu 0,27% em dezembro na comparação dessazonalizada com o mês anterior. Foi influenciado pelas quedas de 0,7% na produção industrial, de 0,1% no varejo (-0,8% no varejo ampliado, que inclui veículos, motos, peças e material de construção) e de 0,4% nos serviços.
No ano, o crescimento verificado pelo BC foi de 0,89%, abaixo do 1,34% de 2018.
“Esperávamos isso [a queda de dezembro] em razão da diminuição dos efeitos da liberação do FGTS. São dados voláteis, assim como o próprio PIB em sua sequência trimestral. Não acho que a história da recuperação esteja mudando.”
O economista ressalta que não há estímulos fiscais (gastos públicos) ou um boom de preços de commodities ajudando o crescimento neste momento, o que torna a recuperação “mais moderada; porém, mais saudável”.
Mesmo em relação à indústria, sua expectativa é de paulatina recuperação após o tombo de 6% nas exportações de manufaturados em 2019 por causa das tensões entre Estados Unidos e China e da crise na Argentina.
Para o economista Fabio Klein, da Tendências, é cedo para determinar se os dados menos favoráveis de dezembro vão se repetir. Indicadores de janeiro relativos à produção de papelão ondulado (para caixas e embalagens) e o tráfego de veículos pesados apontam para “um certo otimismo”.
A Tendências manteve a sua previsão de 2,1% de alta do PIB, apoiada no aumento do volume do crédito. Haveria, assim, impactos positivos no consumo e na construção civil, com reflexos favoráveis no emprego.
Klein não vislumbra influência acentuada do coronavírus na economia brasileira. “O efeito pode ser temporário na receita de setores como soja, minério de ferro e petróleo.”
Em janeiro, segundo dados da FGV/Ibre, a confiança avançou em todos os setores, exceto serviços (-0,1 ponto). O destaque foi a construção, com trajetória ascendente desde o segundo semestre de 2019.
Por esses indicadores, a indústria passou a melhorar no quarto trimestre de 2019 e inicia o ano em uma zona de neutralidade.
Já a confiança do comércio se mantém na faixa entre 95 e 100 pontos desde julho de 2019, sugerindo que uma recuperação mais consistente dependerá do mercado de trabalho e da confiança dos consumidores.
Para Tony Volpon, economista-chefe do banco UBS, houve um “excesso de otimismo” no final de 2019 que não se confirmou. Na primeira semana de fevereiro, a instituição financeira já havia cortado de 2,5% para 2,1% sua previsão para o PIB deste ano.
“Foi mais em razão do coronavírus e da China. Mas 0,4 ponto percentual a menos não quer dizer muita coisa. Esperamos para ver, pois parece mais uma acomodação, não uma reversão de tendência.”
O UBS aponta para uma dicotomia no momento: crédito, consumo e emprego melhores e indústria retardando a retomada. Sobretudo pela queda das importações da Argentina e da atividade da Vale —cuja produção de minério de ferro encolheu 21,5% em 2019 após o acidente em Brumadinho (MG).
A MB Associados mantém sua previsão de crescimento em 2% para este ano e aposta em uma evolução relativamente lenta ao longo do tempo, com um 2021 melhor e assim por diante. “Os estragos do passado foram muito grandes”, diz Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria.
Inflação e juros baixos são apontados como fatores positivos, assim como o crédito em alta, a melhora no emprego formal e o aumento da massa de rendimentos —todos elementos que tendem a estimular o consumo.
O obstáculo continua localizado na indústria e na falta de investimentos para ampliar sua capacidade.
“No geral, nunca compramos muito o otimismo de alguns do mercado. Agora, há quem coloque o coronavírus como ‘bode na sala’ para justificar um corte nas expectativas”, diz Vale. Mesmo que a epidemia afete o comércio Brasil-China, diz, o estrago tende a ser passageiro.
José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Fator, afirma que o banco já considera rebaixar de 2,2% para “um teto” de 2% a previsão de crescimento do PIB neste ano.
Sua equipe detectou, em janeiro, queda tanto nas vendas de maquinário para o setor agrícola quanto para o elétrico.
A avaliação de Gonçalves é a de que um clima de “insegurança política” na relação (e na pauta) do governo com o Congresso vem ganhando peso como fator de incerteza na área fiscal. Assim como a “insegurança jurídica” contamina expectativas em relação às concessões de obras que ajudariam a deslanchar alguns investimentos.
Nessa área, o Ministério da Infraestrutura vem mantendo a previsão de ofertar 44 obras neste ano e de concluir outras 52 —o que alguns consideram metas ambiciosas demais.
“Não há dúvida conceitual ou empírica de que precisamos de mais investimentos para sairmos do ciclo de baixo crescimento”, diz.
No time dos mais otimistas, o economista-chefe da Genial Investimentos e professor da PUC-Rio, José Márcio Camargo, segue apostando em um crescimento ao redor de 2,5% neste ano.
Sobre a “rateada” de dezembro, Camargo avalia como um movimento normal de uma economia que se recupera lentamente —e que dados do mercado de trabalho melhoraram consideravelmente no final do ano.
“Isso já deve ter se refletido positivamente na atividade de janeiro e fevereiro”, afirma.
ESTADÃO
Fundos imobiliários perderam este ano R$ 3,28 bi em valor de mercado
Depois da bonança em 2019, os fundos imobiliários vivem neste começo de ano dias de tempestade. De 1.º de janeiro até a última sexta-feira, a classe de ativos que mais cresceu no ano passado (quase 36%) perdeu na Bolsa R$ 3,28 bilhões em valor de mercado, a maior desvalorização da história do investimento dentro de um intervalo de 45 dias.
No total, a cesta que congrega os 131 fundos mais negociados do mercado, o Ifix, encolheu 5,15% em 2020 – em fevereiro, apesar da melhora dos últimos dias, a queda é de quase 1%. Somente o Banco Itaú, que administra o principal fundo do setor, o KNRI11, com R$ 4, 1 bilhões aportados em imóveis, perdeu quase R$ 500 milhões no período.
Entretanto, apesar desse enxugamento em curso, especialistas afirmam que o investidor não precisa correr e liquidar as aplicações. O revés seria, na verdade, uma correção natural do que poderia se configurar no futuro como uma bolha de mercado, caso a demanda por fundos imobiliários continuasse no patamar dos últimos meses.
Para se ter uma ideia, depois de 2%, 3% e 4% ao mês, consecutivamente, o Ifix acumulou alta recorde de 10,6% em dezembro de 2019.
Responsável pelas recomendações de fundos imobiliários na corretora do banco Santander, Felipe Vaz chama atenção para a rápida valorização dos fundos, que, segundo ele, aconteceu sem um motivo aparente. “Os fundos imobiliários dobraram de tamanho no ano passado. E fecharam o ano com um resultado acima do esperado”, diz ele. “No dia 31 de novembro, eram 570 mil CPFs comprando cotas de fundos imobiliários. No final de dezembro, já eram 632 mil. É muita gente em muito pouco tempo”, diz Vaz.
Para o diretor-geral do banco Indosuez, Fabio Passos, a queda atual era esperada. Em suas redes sociais, ele já vinha alertando para o que chamou de “efeito manada” do investidor por produtos lastreados em imóveis desde o começo de dezembro. “Em média, os fundos vinham com oscilação de 10% de um mês para outro, em um ano muito positivo. Crescimentos maiores do que isso, mesmo em 2019, não se justificam, já que não houve ganho de patrimônio líquido que justifique.”
Fabio Passos credita a alta na procura por fundos imobiliários em 2019 à queda da taxa de juros, que está em seu piso histórico, a 4,25% ao ano. “Acho que o que aconteceu no ano passado foi um momento de paúra do investidor, que está procurando retorno loucamente”, conta. Felipe Vaz concorda. “Hoje, após essa correção, os preços dos fundos estão mais justos do que estavam no ano passado”, diz.
No geral, a expectativa dos analistas é de que, daqui para frente, os fundos, mais equilibrados, reduzam suas perdas e voltem ao curso normal do mercado. “Não vejo mais uma correção tão forte como a que vimos nos começo do ano”, diz o gestor de fundos imobiliários da RB Capital, Márcio Rocha. “Mas acho que vamos ter ainda oscilações”, completa Fabio Passos.
Lançados em 2011, os fundos imobiliários são produtos do mercado financeiro que se enquadram na categoria de renda variável, suscetíveis às oscilações e riscos de prejuízo. Os fundos investem diretamente em empreendimentos imobiliários ou em papéis que são lastreados por imóveis, como é o caso dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs).
Hoje, existem pouco mais de 500 fundos em operação no Brasil, sendo que 40% deles são negociados na Bolsa de São Paulo, a B3. A liquidez desses fundos ainda é baixa. Enquanto na Bolsa o giro médio de ações em um único dia ultrapassou os R$ 13 bilhões em 2019, o ritmo de venda das cotas dos fundos é bem menor: R$ 150 milhões por dia. Com isso, pode ser mais lento comprar e mesmo vender um papel do setor, que a exemplo das ações tem sempre prazo de liquidação de dois dias.
Os fundos adotam diferentes estratégias de investimento. Há aqueles que aportam em projetos de lajes corporativas e escritórios, os que compram shoppings centers, galpões logísticos e até participam do desenvolvimento de empreendimentos residenciais.
Para a especialista em fundos imobiliários do Itaú BBA, Larissa Nappo, os fundos voltados para a área de logística, que envolvem aluguéis de galpões por grandes comércios eletrônicos, puxaram a fila dos aportes no final do ano. “Olhando por segmentos, o logístico foi o que mais contribuiu com a alta em dezembro e também o que mais caiu em 2020”, diz.
Uma das explicações para essa tendência, diz Victor Penna, analista do Banco do Brasil, foi a expectativa do investidor com a retomada das vendas. “A possibilidade de melhora na economia animou o investidor em relação às empresas de varejo que estão investindo no comércio eletrônico. E houve fundos fechando contratos de aluguéis relevantes e de longo prazo com grandes empresas deste ramo”, diz.
Quando o PIB vai sair do 1%?
Os resultados do IBC-Br de dezembro, quarto trimestre e ano fechado de 2019, divulgados sexta-feira (14/2), coroaram uma temporada de desapontamentos com os indicadores econômicos do final do ano passado.
Agora, as projeções de crescimento do PIB em 2020 encolhem na direção de 2%, e já começam a surgir prognósticos de que possa até ficar abaixo disso.
Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências, ressalta as decepções na indústria e no varejo (neste caso, sinalizando enfraquecimento no consumo) no final de 2019.
Como a projeção de PIB da Tendências para 2020 já estava no nível, até pouco tempo conservador, de 2,1%, a previsão por ora está mantida, mas Campos Neto nota que o risco é mais para baixo do que para cima no momento.
Ele ressalva que o repique da inflação no final do ano passado pode ter contribuído, como deflator, para deprimir os índices de atividade (o que seria um efeito episódico). Por outro lado, o impacto desapontador da liberação do FGTS preocupa.
De qualquer forma, o economista considera que um ritmo de 2% “é o que ainda está colocado” para a economia brasileira no momento, e a aceleração a médio e longo prazo depende da agenda de reformas e de aumento da produtividade.
É interessante contrastar a visão de Campos Neto, próxima à corrente principal do mercado, com dois analistas que têm leituras da atual conjuntura um pouco deslocadas, para direções opostas.
O economista José Márcio Camargo, da Genial Investimentos (grupo Plural) no Rio, ainda crê num crescimento de 2,5% em 2020, mas condicional a encrenca do coronavírus não se estender por mais de um trimestre.
Já Carlos Kawall, diretor do ASA Bank, ainda mantém 2% para 2020, mas diz que o risco é para baixo, e que pode acabar sendo algo entre 1,5% e 2%.
Mas o mais interessante é contrastar as narrativas dos dois economistas, que, aliás, convergem em termos de médio e longo prazo e no receituário para acelerar a economia.
Começando por Camargo, ele considera que o mercado, de forma geral, está muito sensível a indicadores de curto prazo, perdendo a perspectiva de um movimento mais estrutural que está em curso.
“O Brasil veio montando um conjunto de reformas que cria condições para que cresçamos 2,5% este ano, com aceleração para algo entre 3% e 3,5% em 2021 e 2022”, diz o economista.
Na área fiscal, Camargo dá grande importância à aprovação do teto de gastos no final de 2016. O passo seguinte foi a aprovação da reforma da Previdência, e agora foram enviadas diversas PECs ao Congresso.
Na visão do economista, é bem possível que, dessas PECs, passe o suficiente para que o teto seja cumprido até 2026, quando ele pode ser modificado. E isso resolve por alguns anos o problema fiscal (ele não disse que é uma solução definitiva).
A crença de Camargo num nível razoável de aprovação das PECs se dá por uma questão de incentivos. Com o Orçamento impositivo, quanto mais sobrar dinheiro para os gastos não obrigatórios, mais os parlamentares poderão gastar com suas emendas. Assim, eles se alinham com o objetivo da equipe econômica (e que é parte do conteúdo das PECs) de restringir o gasto obrigatório.
O analista também julga muito importante a reforma tributária, e acha que os líderes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, têm incentivos para apadrinhá-la.
Camargo, um especialista em mercado de trabalho, tem um particular entusiasmo pela reforma trabalhista que, para ele, já está tendo efeitos relevantes.
Ele vê potencial de ganho de produtividade no aumento dos trabalhadores por conta própria (especialmente com CNPJ), já que quem é patrão de si mesmo tem mais incentivos a produzir mais (já que isto se reverte imediatamente em mais ganhos) do que empregados.
O economista também cita efeitos sobre a produtividade a reforma do ensino médio, à medida que for sendo implementada. Os principais ganhos, para ele, são a redução do número de matérias ensinadas, o que facilita o aprendizado dos mais pobres, e a introdução de cadeiras profissionalizantes.
Fora isso, ele vê “algum grau de abertura econômica que já começa a acontecer, e observa que há toda a agenda microeconômica que vem se materializando, como a TLP e o cadastro positivo.
“O crescimento é um problema microeconômico e toda reforma que faz os mercados funcionarem melhor facilita a otimização da alocação de recursos, que conduz ao aumente da produtividade e à aceleração do crescimento”, sintetiza Camargo.
Na visão do economista, todos as diversas mudanças mencionadas acima vêm ganhando uma força cumulativa e devem garantir um melhor desempenho da economia brasileira nos próximos anos.
Kawall, por sua vez, começa dizendo estar muito alinhado com a visão de Camargo sobre os caminhos para o Brasil acelerar ao crescimento. Tanto que, pensando em 2021 e 2022, ele acha possível um ritmo de crescimento entre 2,5% e 3%, se de fato a agenda de reformas for implementada a contento.
O problema é que, por enquanto, ele vê um de crescimento de 1%, ou pouco mais do que isto, como um “ritmo basal” da economia brasileira.
O economista nota que o PIB cresceu em torno de 1%, ou ligeiramente mais, de 2017 a 2019. Ele estima que o crescimento (ante o tri anterior, dessazonalizado) do quarto trimestre de 2019, descontado o efeito do FGTS, deve ter sido de 0,2%. Já o crescimento que projeta para o primeiro trimestre de 2020 é 0,3%. Tomando os dois números, está se falando de uma economia que teria voltado a crescer a um ritmo anualizado em torno de 1%, na margem.
O ponto de Kawall, entretanto, é de que os analistas deveriam inverter o foco: em vez de sair em busca de choques que expliquem por que a economia mais uma vez não cresceu no ritmo esperado, agora de 2%, deveriam assumir que o “ritmo basal” é mesmo de 1% – e que, portanto, não deveria ser uma surpresa que o PIB reverta ao seu padrão médio recente.
O analista nota que, no movimentado período dos últimos anos, de fato a economia brasileira sofreu muitos choques, mas estes não foram apenas negativos: em 2017, por exemplo, a supersafra fez o PIB crescer a um ritmo bem mais forte no primeiro trimestre, mas ainda assim o ano não fugiu ao padrão em torno de 1%.
Um total de R$ 88 bilhões foi injetado na economia de 2017 a 2019, somando liberações de FGTS e PIS/PASEP. Ele acrescenta que se fala no choque da crise argentina agora, mas tomando como base as exportações brasileiras para o país vizinho em 2017, que tiveram o melhor resultado em nove anos. A média de crescimento argentino de 2011 a 2019 está em torno de 0,7%, o que mostra que o impulso das exportações para o parceiro não pode ser grandes coisas.
“O ‘outlier’ na verdade foi 2017”, diz Kawall.
Assim, o ritmo “normal” da economia brasileira nos últimos anos, e ainda agora, é mesmo em torno de 1% anual, com momentos em que os resultados trimestrais vão para cima deste nível, e outros em que vão para baixo.
Kawall concorda com Camargo que toda a agenda já em andamento de reformas macro e microeconômicas melhoraram a economia brasileira pelo lado da oferta, e aumentaram o crescimento potencial.
A curto prazo, porém, há o problema da demanda, e o ajuste fiscal pelo lado da receita e o ajuste parafiscal (Kawall apoia ambos) tornaram esse problema ainda mais complicado. A economia global também não está contribuindo.
Para o economista, o “driver” para a aceleração deve ser a agenda de privatizações e concessões em infraestrutura, e a retomada de grandes obras paralisadas pela Lava-Jato.
Mas a dificuldade é que, pelas questões envolvidas no trâmite desses projetos, a tração econômica dessa agenda deve ficar para 2021 e 2022, na sua visão. A recuperação da construção civil habitacional também pode ajudar, mas por enquanto ela ainda está muito localizada (o epicentro parece ser o município de São Paulo).
Dessa forma, Camargo e Kawall comungam da visão de um PIB que pode crescer até 3% ainda neste mandato presidencial, nas asas do atual momento reformista da economia brasileira (e supondo que ele continue). Mas há uma diferença de timing. Camargo pensa que já está acontecendo, e Kawall vê a aceleração como algo que talvez ainda esteja um pouco à frente.
O GLOBO
Economista do Citi Brasil diz que alta do dólar reflete fatores externos
Enquanto muitos bancos ainda nem refizeram as projeções de crescimento da economia da China para este ano, após o estouro da crise do coronavírus naquele país, o Citi já revisou para baixo suas estimativas duas vezes. E fez o mesmo para o Brasil, que deve crescer menos por causa da epidemia, segundo os cálculos do banco. Uma semana após o início do surto, a expectativa de crescimento chinês caiu de 5,8% para 5,5%. Duas semanas depois, o Citi a reduziu para 5,3%. Em entrevista ao GLOBO, o economista-chefe do banco no Brasil, Leonardo Porto, diz que o impacto inicial da crise já tirou quase 10% da estimativa de expansão do PIB este ano, sendo o país tão ligado comercialmente à China. Para ele, a escalada do dólar por aqui se deve principalmente à instabilidade global.
Qual será o impacto da crise do coronavírus para a economia brasileira?
Reduzimos a estimativa de crescimento de 2,2% para 2% este ano. Começamos a incorporar o impacto da epidemia pelo lado das exportações. A China compra 28% de tudo o que o Brasil exporta. Se as exportações caírem 50% durante o primeiro mês da epidemia, então o impacto será de 0,2 ponto percentual.
Os dados mais fracos da indústria, varejo e serviços no fim do ano passado no Brasil também foram levados em conta nessa revisão da taxa de expansão esperada para 2020?
O efeito dos dados mais fracos foi marginal. O grosso mesmo foi o do coronavírus.
Por que o Citi reduziu duas vezes a estimativa do crescimento chinês este ano?
Há uma incerteza gigantesca sobre quanto tempo vai demorar para o país controlar a epidemia. Quanto mais você isola as pessoas para controlar o vírus, mais os problemas econômicos crescem, vão se maximizando. As fábricas ficam fechadas. Ninguém sai para trabalhar. As informações são de que há um colapso na atividade chinesa, desde queda no consumo de carvão até venda de casas.
No Brasil, o dólar próximo de R$ 4,30 tem a ver com o coronavírus?
Há uma ansiedade grande quanto à trajetória da taxa de câmbio. Mas é preciso lembrar que esse dólar está refletindo os fatores externos. O coronavírus não é uma coisa pequena. Isso está afetando preços de commodities de forma significativa. E os três produtos mais exportados no ano passado pelo Brasil foram soja, minério de ferro e petróleo. Se nossos produtos estão valendo menos, nossa moeda vai acabar depreciando.
Qual é a expectativa do dólar para o fim deste ano?
Para o Citi, a expectativa é de um dólar a R$ 4,14 no final do ano, baseado na hipótese de que o coronavírus vai ser controlado até o fim do primeiro trimestre.
Esse dólar alto não trará impacto para a inflação?
A atual alta do câmbio está ligada à queda do preço das commodities, e isso não vai pressionar a inflação. Quando o valor das commodities cai no mercado internacional, tira o impacto inflacionário mesmo quando o dólar se aprecia.
O real depreciado não ajuda os exportadores?
O lado negativo é que não vai ajudar tanto o setor industrial. O que tem passado despercebido é que o setor industrial está com o desempenho muito pior que o da economia brasileira desde meados de 2018. E esse é um fenômeno global, outros países estão passando pelo mesmo problema.
O que explica essa estagnação da indústria mundial?
Primeiro, a queda do ritmo de crescimento da economia global. Em 2019, a economia mundial deve ter crescido 2,7%, frente aos cerca de 3% de 2018. Só isso já faria com que houvesse uma redução do comércio mundial. Em paralelo, a partir do ano passado, houve uma escalada na guerra comercial entre Estados Unidos e China. Houve um colapso do comércio mundial por causa dessa guerra. A performance pior do setor industrial tem a ver com o ciclo de negócios mundial.
O acordo comercial entre China e EUA em dezembro não representou uma trégua?
A assinatura do acordo foi positiva. Mas aí veio o coronavírus. Para este ano, projetamos um crescimento do PIB brasileiro de 2%, mas a produção industrial deve crescer cerca de 1,2%.
As reformas vão andar no Congresso?
A parte política será um desafio porque este ano tem um calendário mais curto (por causa das eleições municipais). Não que não possa aprovar nada no segundo semestre, mas como estamos falando de Propostas de Emenda à Constituição (PECs), fica mais difícil.
O senhor acredita na aprovação da reforma tributária?
A reforma tributária tem um caminho bastante longo para ser discutida. Tem proposta na Câmara, no Senado e o governo vai mandar a sua. É um tema bastante complicado, vai tratar de incentivos tributários, ICMS dos estados, e a maior parte tem uma situação fiscal frágil. Quem vai aceitar perder? Se tiver uma reforma tributária este ano, deve ser bastante diluída.
Qual deveria ser o foco do governo nas reformas?
O foco deveria ser a PEC Emergencial (conjunto de medidas de controle do crescimento das despesas obrigatórias e reequilíbrio fiscal, que está no Senado). A proposta não tem pontos conflitantes e ajuda os estados e o governo federal no ajuste fiscal.
O senhor está otimista quanto às chances de aprovação?
Ainda está faltando o governo e o Congresso alinharem as prioridades para termos uma visão mais clara do que pode ser aprovado.
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