Quinta-feira

VALOR

Copom mantém taxa Selic a 2% ao ano

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manteve nesta quarta-feira a taxa básica de juros em 2% ao ano. Foi a terceira reunião consecutiva em que o colegiado manteve a Selic no atual patamar, o mais baixo da série histórica.

A decisão veio em linha com o que era esperado por todo o mercado. Pesquisa conduzida pelo Valor na semana passada mostrava que todas as 82 instituições financeiras e consultorias ouvidas esperavam manutenção da Selic em 2%.

A decisão foi unânime e tomada em meio a um repique de índices de inflação. No entanto, o grupo reiterou que considera que as pressões inflacionárias recentes são temporárias.

"As últimas leituras de inflação foram acima do esperado e, em dezembro, apesar do arrefecimento previsto para os preços dos alimentos, a inflação ainda deve se mostrar elevada", disse o Copom no comunicado divulgado após a reunião.

"Apesar da pressão inflacionária mais forte no curto prazo, o comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários, mas segue monitorando sua evolução com atenção, em particular as medidas de inflação subjacente."

Diversas medidas de inflação subjacente, por sua vez, "apresentam-se em níveis compatíveis com o cumprimento da meta". Os diretores do Banco Central reconhecem, porém, que o risco fiscal cria uma assimetria altista - quando há mais chances de a inflação ficar acima do que abaixo do projetado.

"Um prolongamento das políticas fiscais de resposta à pandemia que piore a trajetória fiscal do país, ou frustrações em relação à continuidade das reformas, podem elevar os prêmios de risco", afirmou a nota.

“Forward guidance”

O colegiado reformulou a sua visão sobre as projeções e expectativas de inflação, colocando em pauta pela primeira vez um horizonte para a possível retirada do “forward guidance” - a orientação futura da política monetária. Mas ressaltou que uma eventual retirada do “forward guidance” não significaria, automaticamente, uma alta dos juros básicos.

“A manutenção desse cenário de convergência da inflação sugere que, em breve, as condições para a manutenção do forward guidance podem não mais ser satisfeitas, o que não implica mecanicamente uma elevação da taxa de juros pois a conjuntura econômica continua a prescrever estímulo extraordinariamente elevado frente às incertezas quanto à evolução da atividade”, diz comunicado, que detalha a decisão de manter os juros básicos da economia em 2% ao ano.

Segundo o comunicado, “o Copom avalia que, desde a adoção do forward guidance, observou-se uma reversão da tendência de queda das expectativas de inflação em relação às metas para o horizonte relevante”.

O colegiado acrescenta que, ao longo dos próximos meses, "o ano-calendário de 2021 perderá relevância em detrimento ao de 2022, que está com projeções e expectativas de inflação em torno da meta.”

O documento esclarece que, no cenário de retirada do forward guidance, “a condução da política monetária seguirá o receituário do regime de metas para a inflação, baseado na análise da inflação prospectiva e de seu balanço de riscos”.

O Copom disse, porém, que por ora “considera adequado o atual nível extraordinariamente elevado de estímulo monetário que vem sendo produzido pela manutenção da taxa básica de juros em 2% ao ano e pelo forward guidance" adotado na sua reunião de agosto, segundo o qual o Copom não pretende reduzir o grau de estímulo monetário desde que determinadas condições sejam satisfeitas”.

O Copom avalia que essas condições seguem satisfeitas. “Apesar da elevação desde a última reunião, em particular para o ano de 2021, as expectativas de inflação, assim como as projeções de inflação de seu cenário básico, permanecem abaixo da meta de inflação para o horizonte relevante de política monetária; o regime fiscal não foi alterado; e as expectativas de inflação de longo prazo permanecem ancoradas”, diz o comunicado.

No parágrafo anterior, houve uma mudança em relação ao que o Copom havia afirmado em outubro. Naquela ocasião, havia descrito as projeções e expectativas de inflação como "significativamente" abaixo da meta de inflação. Agora, diz apenas que está abaixo da meta. O Copom realiza a sua primeira reunião de 2021 nos dias 19 e 20 de janeiro.

 

Análise: 'Forward guidance' do Banco Central poderá cair em janeiro

O “forward guidance”, que é a indicação de não subir os juros tão cedo, poderá cair já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, de janeiro. Já uma efetiva alta de juros é mais incerta. Vista com as informações hoje disponíveis, não deveria ocorrer antes de agosto – mas pode ser que leve mais tempo, ou seja feita antes.

A comunicação do BC é aberta o suficiente para se adaptar a mudanças no cenário inflacionário. O que leva a crer numa queda do “forward guidance” em janeiro é a avaliação do Copom de que, “em breve”, as condições para a sua manutenção podem não ser mais satisfeitas. Deve-se entender o “em breve” como uma indicação para a próxima reunião.

As condições devem ser satisfeitas em breve por dois motivos. Primeiro, porque as projeções de inflação do Banco Central no cenário básico e as expectativas de inflação subiram. Segundo, porque o horizonte relevante para as decisões de política monetária se deslocou mais em direção a 2022.

Na reunião de janeiro, o horizonte do Copom terá foco predominantemente no ano de 2022. Isso significa, em termos práticos, que vai mirar a inflação no período de 12 meses que termina em setembro de 2022, que inclui o último trimestre de 2021 e os três primeiros trimestres do ano seguinte.

O Copom vai mirar, em janeiro, uma meta de 3,56%, que é uma ponderação entre as metas de 2021 (3,75%) e de 2022 (3,5%), com um peso maior para esse último ano. O BC projeta no seu cenário básico uma inflação de 3,4% para 2021 e para 2022. Ou seja, muito próxima da meta. A ponderação das expectativas de inflação do mercado dá 3,45%.

Além dos números, é importante observar a linguagem do comunicado do Copom, que esvazia o seu cenário anterior de queda das projeções e expectativas.

Membros do colegiado haviam expressado nos últimos meses a avaliação de que a projeção de inflação de 2022 poderia cair no ano que vem, quando os estímulos fiscais saírem de cena e o peso do alto grau de ociosidade da economia se impuser no cenário inflacionário. “Desde a adoção do 'forward guidance', observou-se uma reversão da tendência de queda das expectativas de inflação em relação às metas para o horizonte relevante”.

E, uma vez retirado o “forward guidance”, quando os juros poderão subir? O BC deixa claro que, a partir de então, volta a valer a cartilha do regime de metas de inflação, guiando suas decisões em particular pelas projeções de inflação e pelo balanço de riscos.

As projeções de inflação do Banco Central, vistas de forma isolada do balanço de riscos, dizem que é preciso um aumento de juros no ano que vem. Se os juros fossem mantidos em 2% ao ano, o ano de 2022 terminaria com uma inflação de 4%, acima da meta.

Já a projeção no cenário Focus mostra que uma alta de juros a partir de agosto, conforme consenso dos analistas econômicos, seria adequada. Esse movimento levaria a taxa de juros para 3% ao final do ano que vem e a inflação ficaria em 3,4% em 2022. Mas as projeções de inflação seriam suficientes para determinar o timing e o grau de aperto monetário? Provavelmente, não.

O Copom, na sua formação atual, tem pesado muito o balanço de riscos nas suas decisões. E o comunicado do Copom destaca um item do balanço de riscos para indicar a adequação da manutenção de juros por um período não especificado. “A conjuntura econômica continua a prescrever estímulo extraordinariamente elevado frente às incertezas quanto à evolução da atividade”, diz o documento.

Note que o Copom não faz nenhuma menção do tempo de validade dessa avaliação. Em tese, duraria o tempo necessário para avaliar a evolução da atividade – e um dos componentes mais importantes é se a economia anda com as suas próprias pernas quando os estímulos fiscais saírem de cena.

Mas é bom notar que, a partir da saída do “forward guidance”, a política monetária volta a ser feita de forma convencional. Isso significa que notícias ruins que aumentem as projeções de inflação ou inclinem o balanço de riscos para o lado desfavorável podem levar a um aperto mais cedo das condições monetárias. Notícias boas, levariam a um adiamento.

 

BC responde ao mercado e deve ajudar a baixar juro longo e dólar

Sem mexer na taxa Selic, o Copom conseguiu responder ao mercado e esvaziar algumas críticas que vinha sofrendo nas últimas semanas. No comunicado de sua decisão, traçou um cenário muito mais realista para a inflação - até levemente pior do que o da pesquisa Focus -, preparou o mercado para o fim do "forward guidance" e afastou a chance de um corte de juros no curto prazo.

E também autorizou a aposta de que, diante do comportamento da inflação corrente e prospectiva, o BC poderá subir a Selic em algum momento, possivelmente entre os segundo e terceiro trimestre deste ano. Essa mensagem terá impacto direto sobre as condições financeiras, aquelas que o BC vem acompanhando há meses.

Ao indicar ao mercado que está atento ao risco inflacionário, o BC produzirá o chamado “flattening” (achatamento) da curva a termo. Ou seja, os juros mais curto devem subir amanhã, ajustando-se ao cenário em que uma alta da Selic mais breve ficou mais provável.

Mas os juros longos podem ceder, o que acontece sempre que o BC indica que será mais firme contra a inflação. E isso é positivo, ao longo do tempo, para o crédito, para as ações.

E, de forma mais imediata, na tarefa do Tesouro Nacional de rolar a dívida pública. Esse movimento pode encorajar , inclusive, o Tesouro a colocar um lote robusto de títulos prefixados de prazo mais longo já no leilão de amanhã, um dos três últimos a serem realizados ainda em 2020.

Uma outra resposta do mercado ao Copom esperada é a queda do dólar contra o real. Como o juro de curto e médio prazo vai subir, com o mercado esperando agora que a Selic volta a ser elevada a partir do segundo trimestre, o Brasil se torna mais atrativo para o capital externo. E isso tende a trazer alívio ao câmbio. E dólar para baixo ameniza a pressão dos preços dos alimentos e da gasolina sobre a inflação.

O risco de o BC ficar “atrás da curva” foi tirado de cena com o comunicado de hoje. E a resposta do mercado a isso vai jogar a favor da política monetária daqui para frente. A dúvida continua sendo de que lado vai jogar a política fiscal.

 

 ‘Condições financeiras são mais importantes que expansão fiscal’

As condições financeiras da economia são muito mais importantes para o crescimento no ano que vem do que a expansão fiscal, diz a economista-chefe do Credit Suisse, Solange Srour. Para ela, a manutenção do auxílio emergencial não é essencial para a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) em 2021, que estima em 4%.

Solange considera fundamental assegurar a credibilidade das contas públicas, com respeito ao teto de gastos. Segundo ela, “o auxílio foi importante, sustentou o consumo e teve impacto em setores muito específicos, como alimentação e construção civil”, ajudando a construir “uma ponte para que não houvesse uma recessão perto de 10% e o desemprego não fosse para 20%.

“Mas agora o crescimento tem que ter outras bases”, diz Solange, enfatizando a importância de um ajuste fiscal crível. Se isso for feito, o câmbio vai se valorizar e haverá uma queda dos juros futuros, afrouxando com isso as condições financeiras. Uma eventual prorrogação do auxílio emergencial tenderia a levar a um desempenho melhor da economia no primeiro trimestre, “mas acaba sendo prejudicial para o crescimento ao longo do ano”, avalia Solange.

“A visão de que vamos estender uma parte do gasto deste ano para o próximo vai trazer consequências piores para a atividade econômica, enquanto fazer o ajuste fiscal terá impacto positivo nas condições financeiras, estimulando o consumo e a retomada do investimento”, afirma ela.

Na visão de Solange, é possível compatibilizar aumento do gasto social com o teto de gastos e a volta da trajetória fiscal sustentável no ano que vem. Solange diz que o crescimento de 4% estimado para 2021 não é otimista. A herança estatística que 2020 deixará para o ano que vem é de 2,9%, avalia ela. Isso significa que, se o PIB não crescer nada em relação ao fim deste ano, terminará 2021 com expansão de 2,9%.

Nas contas do Credit Suisse, o crescimento trimestral médio será de 0,5% em relação ao anterior. “É uma saída mais lenta de recessão e nós só não vamos conseguir atingir esse número se não fizermos o mínimo esforço fiscal necessário para voltar à trajetória antes da covid”, afirma ela.

Para 2020, o banco espera retração do PIB de 4,3%. Se a agenda fiscal não avançar, porém, o Brasil pode ter problemas, segundo Solange. “O mercado hoje está leniente porque o cenário externo é muito benigno, mas o Brasil não pode contar com isso por dois anos”, observa ela.

“Podemos diminuir essa projeção de PIB, que já não é nada maravilhosa, para um nível muito mais baixo, se nada for feito ou se a gente tentar qualquer tipo de quebra do teto.” Na visão de Solange, o Banco Central (BC) terá que elevar os juros a partir do meio do ano que vem, levando a Selic dos atuais 2% para 4,5% ao ano no fim de 2021.

Ela estima que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficará acima da meta neste ano e no próximo - 4,4% em 2020 e 4% em 2021, nível superior ao 4% do alvo deste ano e dos 3,75% do ano que vem. Ontem à noite, as projeções do Credit Suisse para 2021 e 2022 foram enviadas aos clientes e serão discutidas hoje, na tradicional apresentação de fim de ano do banco. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: O PIB teve uma forte alta no terceiro trimestre, com influência grande do auxílio emergencial. Como a sra. caracteriza o desempenho da economia em 2020?

Solange Srour: Em 2020 houve essa recuperação forte na segunda metade do ano. Tem o impacto da política fiscal, que sem dúvida foi bastante expansionista. Vamos gastar 8% do PIB no combate à covid, muito mais do que o Brasil poderia ter gasto. Em um ano excepcional, porém, isso não trouxe impactos negativos em termos de falta de credibilidade da política fiscal. Mas acho que, além do auxílio, as medidas de sustentação do emprego e do crédito tiveram impacto muito positivo para essa retomada. Muita gente foca no fim do auxílio, que seria uma grande derrocada no primeiro trimestre, mas houve outras medidas importantes.

Valor: O que a sra. destacaria?

Solange: A sustentação do emprego foi muito relevante. Não vimos queda tão forte do emprego como poderíamos ter visto. Essas medidas foram tomadas na Europa, e não nos EUA, e o desemprego lá explodiu. A maior parte das medidas expira no fim de dezembro, mas algumas de crédito não, porque o impacto fiscal delas é o que o Tesouro banca, e teremos impacto positivo no começo do ano que vem. O desemprego poderia começar 2021 muito pior do que vai se não fossem essas medidas. O auxílio foi importante, sustentou o consumo e teve impacto em setores muito específicos, como alimentação e construção civil, mas acho que ele não é, olhando para frente, essencial ao crescimento em 2021. Ele construiu uma ponte para que não tivéssemos uma recessão perto de 10% e o desemprego não fosse para 20%. Mas agora o crescimento tem que ter outras bases.

Valor: Quais seriam essas bases?

Solange: A continuidade de condições financeiras frouxas, juros baixos e confiança na economia, que se dá inclusive na taxa de câmbio. A taxa de câmbio depreciada muito além dos nossos pares é um indicador de perda de confiança. Ela não é boa para atividade como um todo, apesar da visão de que o câmbio depreciado ajuda a exportação. Quando há depreciação por falta de credibilidade, principalmente fiscal, o câmbio é deletério. Ele traz desconfiança de que o Brasil vai sustentar sua dívida e manter os juros baixos. Como crescer no ano que vem? Nesse caso, para trazer confiança, uma apreciação é bem-vinda. E é preciso manter os juros baixos, principalmente as taxas longas, que afetam a atividade. Para 2021, as condições financeiras são muito mais importantes do que expansão fiscal. A visão de que vamos estender uma parte do gasto deste ano para o próximo vai trazer consequências piores para a atividade economica, enquanto fazer o ajuste fiscal terá impacto positivo nas condições financeiras, estimulando o consumo e a retomada do investimento.

Valor: Se houver retomada da credibilidade fiscal, isso pode compensar parte ou todo o efeito do fim do auxílio?

Solange: A gente acha que o auxílio não é indispensável para o crescimento, que no nosso cenário será de 4% em 2021. O auxílio pode ser positivo para o primeiro trimestre, mas acaba sendo prejudicial para o crescimento ao longo do ano. Se o governo não estender o auxílio e voltar à trajetória fiscal anterior à covid, isso traz juros mais baixos e câmbio mais apreciado, e as condições financeiras ficam mais frouxas. Se continuar com a expansão fiscal, isso traz um aperto muito maior dessas condições, que melhoraram nas últimas semanas por causa do cenário externo estimulativo, com liquidez abundante. O Brasil precisa aproveitar esse ambiente externo para continuar afrouxando as condições financeiras. Temos visto o país “performar” bem e em termos fiscais nada está decidido, nem para o bem nem para o mal. Continuamos vulneráveis, e essa vulnerabilidade deve permanecer até o fim do ano.

Valor: Quanto do crescimento de 2021 vai se dever ao carregamento estatístico deixado por 2020?

Solange: 2,9%. Temos crescimento de 4% para o ano que vem. Ele pode soar muito otimista quando comparamos com as projeções de média do mercado, mas nessa projeção o PIB cresce 0,5% em média por trimestre. Fizemos um estudo que mostra que, pegando a média de todas as recessões passadas, excluindo a de 2014 até 2016, no ano seguinte à recessão, o PIB cresce em média 1,3% por trimestre. Eu não vejo nada de muito extraordinário nesse 4%, é bem mediano. É uma saída mais lenta de recessão e só não vamos conseguir atingir esse número se não fizermos o mínimo esforço fiscal necessário para voltar à trajetória antes da covid.

Valor: A continuidade do auxílio não seria essencial ao crescimento, mas um programa novo de transferência de renda é necessário?

Solange: A covid vai trazer algumas cicatrizes de médio e longo prazo para a economia, mesmo com a chegada da vacina. A gente vai ter uma parcela da população que não vai voltar rapidamente para o mercado de trabalho, e a recuperação da economia a nível pré-covid não leva menos de dois anos. Claro que neste momento o Brasil deveria aumentar o gasto social, principalmente para incluir aqueles que estão mais tempo fora do mercado de trabalho, e melhorar a questão da educação. Teremos um problema sério de educação nos próximos anos devido à paralisação deste ano. O Brasil precisa lidar com essa situação, mas é possível compatibilizar aumento do gasto social com o teto de gastos e a volta da trajetória fiscal sustentável.

Valor: Como fazer isso?

Solange: Para isso é preciso aprovar a PEC que reduz gastos obrigatórios e fazer uma reformulação dos atuais programas sociais. A proposta do CDPP [Centro de Debates de Políticas Públicas, que prevê a fusão do Bolsa Família com o abono salarial, o salário-família e o seguro defeso] que pode ser levada adiante ao Senado é necessária não só para a gente melhorar a questão de desigualdade, mas também para aumentar o PIB potencial, e é completamente factível, mas a discussão está turva. É como se tivesse que abrir mão do fiscal para melhorar a desigualdade, não deveria ser visto dessa forma. Mas precisamos rever as despesas obrigatórias.

Valor: Para isso a PEC Emergencial seria essencial?

Solange: Vemos a PEC Emergencial como ponte. Ela não vai resolver nenhum problema de forma permanente, mas pode fazer com que o governo sobreviva os próximos dois, três anos sem quebrar o teto e sem gerar uma crise enorme de desconfiança. Dado que é muito difícil emplacar reformas estruturantes na segunda metade do governo, a PEC Emergencial faz com que consigamos chegar até 2023 sem quebrar a regra fiscal e sem entrar em uma crise profunda, e permite aumentar o espaço dentro do teto para aumentar algum gasto social e investimento, mas só conseguirá tudo isso se for mais parruda. A proposta divulgada nesta semana não abre espaço no teto para os gastos que estamos dizendo. Temos que voltar à discussão que foi interrompida de diminuir a carga de trabalho de servidores públicos, desindexar benefícios sociais acima, de dois a três salários mínimos para conseguirmos compatibilizar temporariamente o aumento do gasto social e aumento do investimento com o teto.

Valor: É possível cumprir o teto em 2021?

Solange: É possível, mas não sem problemas. Vai ter que diminuir muito o gasto discricionário. Primeiro vamos ver se o governo vai ganhar a questão da reoneração da folha da pagamentos. Provavelmente essa questão vai ser judicializada. Com o descasamento entre o INPC e o IPCA [o primeiro corrige vários gastos obrigatórios, e o segundo, o teto], vai precisar de uma queda forte dos gastos discricionários. No nosso cenário, o governo aprova a PEC Emergencial mais forte do que a discutida hoje em 2021 e aí o teto é cumprido em 2022. O que eu não consigo ver é o teto sendo cumprido em 2022 sem uma PEC mais abrangente do que essa que está aí. Valor: Há uma desarticulação política do governo, que não votou a LDO, e dúvidas sobre a prorrogação do auxílio. A incerteza fiscal e a falta de coordenação política colocam viés de baixa no cenário de crescimento para 2021? Solange: Sim. O grande viés de baixa não é o recrudescimento da doença, que pode afetar o primeiro trimestre com medidas de restrição à mobilidade. O maior risco à nossa projeção é a falta de articulação política e a agenda fiscal não andar. Nosso cenário é de crescimento razoável, mas ele parte do pressuposto de que voltaremos para a trajetória fiscal pré-covid. Essa paralisia da agenda fiscal é muito negativa para a atividade. O mercado hoje está leniente porque o cenário externo é muito benigno, mas o Brasil não pode contar com isso por dois anos. Ele pode mudar por diversos motivos. Podemos diminuir essa projeção de PIB, que já não é nada maravilhosa, para um nível muito mais baixo, se nada for feito ou se a gente tentar qualquer tipo de quebra do teto.

Valor: O comportamento da inflação preocupa? Vai exigir aumento da Selic?

Solange: Já estamos muito preocupados com a inflação há algum tempo. Temos 4,4% para a alta do IPCA em 2020 e 4% para 2021, também acima da meta [3,75%], e 3,5% para 2022. Por trás da inflação temos um choque de oferta importante de commodities, principalmente agrícolas, mas da parte industrial também, desvalorização grande da taxa de câmbio e o efeito de mudanças de consumo derivadas da pandemia, que pressionou mais alguns setores. Mas o grande componente para as expectativas inflacionárias estarem ameaçadas é a possibilidade de perder a âncora fiscal. No Brasil, choques de oferta e a depreciação cambial começam a passar indiretamente para os demais preços quando não existe credibilidade fiscal. Vimos isso fortemente em 2015, quando o Brasil perdeu essa âncora. Agora começamos a ver números de inflação acima das expectativas e essa pressão de custos, com o IGP-M fechando o ano em quase 25%, vai continuar, porque a boca de jacaré entre IGP-M e IPCA não vai ficar aberta por tanto tempo. Se o câmbio continuar apreciando, o IGP-M vai diminuir, mas o IPCA vai subindo em direção a ele porque a pressão de custos está muito forte e os estoques estão baixos na economia. Parte desse choque será repassada ao IPCA no ano que vem, principalmente no primeiro trimestre. Outro fator que vai fazer a inflação ficar forte em 2021 é a retomada dos serviços. Neste ano, vários preços ficaram congelados, e eles vão voltar no ano que vem. Nesse cenário, a inflação pode não só divergir do centro da meta, mas 2022 também fica em risco. Então o Banco Central precisa reagir para controlar as expectativas. Com a economia retomando, a taxa de juros de 2%, utilizada em um momento extraordinário de parada súbita da oferta, tem que voltar a um nível mais próximo do neutro. No nosso cenário, o BC começa a subir os juros em junho, com 0,5 ponto a cada reunião do Copom, fechando o ano em 4,5%. Nesse período todo revisamos o IPCA para cima, mas mantivemos o ciclo de Selic.

Valor: Quando a relação dívida bruta/PIB começa a se estabilizar?

Solange: Pelos nossos exercícios, mesmo com uma taxa de juros real de 2,5% e 2% de crescimento, só conseguimos estabilizar a relação dívida/PIB em 2030, e mantendo o teto de gastos. Se por algum motivo resolvermos gastar mais fora do teto, ainda que a lei mude para isso ser legal, só conseguimos estabilizar a dívida se o crescimento do PIB for muito maior do que 2%. Para o ano que vem, revimos a projeção de dívida bruta para 96,2% do PIB porque o PIB nominal será maior do que o que tínhamos um mês atrás pela revisão do IBGE e por causa do deflator maior do PIB [para 2020, a previsão é de 94,6% do PIB]. Mas para mim, 95% ou 100% do PIB de dívida não é o grande foco, mas sim a trajetória de gastos. Se melhorarmos essa trajetória via reforma administrativa a redução da vinculação, a gente vai conseguir ter uma trajetória muito melhor da dívida/PIB. Daria para fechar o ano com uma relação até maior se tivéssemos sinalizado controle de gastos, mas estamos fazendo o contrário. Muita gente acha que a dívida pode ficar alta porque os juros vão ficar baixos para sempre, mas isso não é a verdade. A curva já está super esticada, mesmo melhorando nas últimas semanas. Temos que olhar não a Selic de 2%, mas os juros de mercado, que definem como o Tesouro vai conseguir financiar sua dívida.

Valor: Os números indicam um aumento do número de casos e mortes por covid. O recrudescimento da doença é outro grande risco para 2021?

Solange: Esse é um grande risco para o nosso cenário de atividade, tanto para o quarto trimestre, se tivermos um dezembro muito ruim, quanto para o começo do ano que vem. As pessoas esperam que a vacinação seja de fato ampla no primeiro trimestre, mas não vai ser. Se ela começar no primeiro trimestre, só vai conseguir atingir mais a população a partir do segundo e terceiro trimestres. O risco para atividade é de fazer medidas de restrição à mobilidade, mas ainda que a segunda onda seja tão grave como a primeira, um fator que impede desaceleração maior da atividade é o fato de a vacina estar chegando. Ela impede que o recuo da atividade seja tão forte, porque o aumento dos casos não causa um efeito tão negativo nas expectativas de consumidores, empresários e investidores. Estamos vendo isso acontecer nos países desenvolvidos. Os casos subiram fortemente na Europa e nos Estados Unidos e medidas de restrição foram adotadas, mas não vimos uma queda de confiança tão grande. Eles estão sempre alguns meses à frente da gente e a mesma coisa deve acontecer no Brasil.

 

ESTADÃO

Com incertezas econômicas, analistas preveem alta da Selic no começo de 2021

Diante do aumento da inflação, em meio ao ambiente de incerteza fiscal e à recuperação econômica mais rápida que o esperado, as apostas de economistas e agentes do mercado para uma alta dos juros estão sendo antecipadas. No Boletim Focus, do Banco Central, a alta da Selic é esperada para setembro, mas cada vez mais analistas passam a projetar uma elevação da taxa Selic já em meados do ano.

Para o economista da MB Associados e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, José Roberto Mendonça de Barros, a inflação está terminando o ano bastante pressionada, o que mexe nas previsões sobre os juros. “Para o ano que vem, a inflação para o consumidor vai continuar subindo em 12 meses, com um pico por volta de maio. E os preços no atacado continuarão bastante pressionados. Muitas empresas vão preferir perder mercado e elevar preços.”

Ele ressalta que a inflação seguirá bastante pressionada no avançar do ano que vem. “Por essa razão, o BC vai acabar tendo de se render à realidade e começar a elevar a taxa Selic no mês de junho, mais ou menos. Com isso, a política monetária deve se alterar. É preciso lembrar também que as taxas longas de juros estão muito altas.”

Outro exemplo é o JP Morgan. O banco antecipou a estimativa para o início do ciclo de alta de juros do início de 2022 para agosto de 2021. A economista-chefe do banco, Cassiana Fernandez, explica que a revisão foi motivada pelo cenário mais favorável para a recuperação econômica, principalmente no fim de 2021 e início de 2022, com a perspectiva de vacinação de ampla parcela da população contra a covid-19.

“Os números recentes de inflação começaram a incomodar. Desde o último Copom, a mediana do Focus para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor - Amplo (IPCA) de 2021 passou de 3,0% para 3,47%. É um aumento relevante que deve acender a luz amarela.”

No início de novembro, o Credit Suisse já havia alterado o cenário para a política monetária, prevendo início do aumento de juros em junho, em vez de no segundo semestre do ano que vem, levando a Selic a terminar dezembro em 4,50%.

Da mesma forma, o Banco BV recentemente antecipou a expectativa de início da alta de juros de outubro para agosto de 2021, devido à retomada mais rápida da economia global, que deve “levar pressão” para 2022. A taxa Selic deve terminar o ano que vem em 3% e, depois de um ciclo longo, chegar a 6%.

Reajuste

No curto prazo, porém, o aumento das projeções de IPCA em 2020 devido à antecipação da retomada da bandeiras tarifárias pela Aneel não deve ser problema para o BC. “Isso deve dar mais conforto para o Banco Central, pois a inflação tende a ficar menor, gerando uma inércia menor para 2022”, diz o economista Carlos Lopes, do Banco BV.

O Banco Safra também já admite antecipar sua aposta para o início do aperto monetário do quarto trimestre “para o terceiro ou possivelmente para finais do segundo trimestre”, conforme relatório semanal. Segundo o banco, as seguidas revisões para cima nas projeções de inflação de 2021 têm levado ao questionamento sobre as condições para a manutenção dos juros no nível atual.

Para Gino Olivares, economista do Insper e da consultoria Galápagos, em algum momento esses juros têm de subir, mas as discussões sobre quando deve acontecer estão sendo muito influenciadas pela inflação mais recente. “Honestamente, não é que seja um problema. Quando acontece um terremoto, logo depois tem uma série de pequenos tremores, a terra continua tremendo até que se estabilize novamente. A covid-19 foi o terremoto e esses números de inflação são as acomodações, mas vão começar a diminuir de intensidade. Pesa, sim, sobre os mais pobres, mas é algo passageiro.”

 

'Redução da Selic foi um pouco além do necessário', diz ex-diretor do BC

Para o chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) e ex-diretor do Banco Central, José Julio Senna, o BC foi “um pouco além do necessário” ao colocar a Selic em 2% ao ano na última quarta-feira, 9.

O economista também alerta para a manutenção de desequilíbrios fiscais “importantes” e diz que, reduzir ainda mais os juros no atual momento da economia do País seria "imprudente". A seguir, trechos da entrevista ao Estadão.

Os juros, mantidos em 2% ao ano, estão no patamar correto?

Apesar de o Banco Central estar fazendo um bom trabalho, é possível que tenha reduzido a Selic um pouco além do necessário. O Brasil ainda apresenta desequilíbrios fiscais significativos, a situação é de instabilidade e talvez tivesse sido mais adequado não ir tão longe. Nada muito diferente dos atuais 2% ao ano, mas talvez devesse ter parado em 2,5% ou 3%, o que sinalizaria uma preocupação maior com o desequilíbrio fiscal, e a curva de juros não tivesse ficado como ficou. Evidentemente, reduzir mais os juros seria imprudente.

O BC ainda não sinaliza um novo ciclo de alta dos juros?

Quando há razão para mudar o rumo da política monetária, a primeira coisa a ser feita é alterar o forward guidance (prescrição futura, na expressão em inglês). Mudar a Selic só será considerado depois. E o fator determinante será o receituário básico do regime de metas de inflação, que deve ser entendido como um regime de metas para as projeções de inflação. E, de concreto, não aconteceu nada na área fiscal ainda.

Não está dado que será preciso novo ciclo de alta de juros?

Muita gente raciocina da seguinte maneira: vamos reduzir os juros e, se passar do ponto, a gente aumenta. Esse raciocínio é inadequado, pois reduzir juros é sempre muito mais simples do que elevar juros. O aumento esgarça o tecido, gera perdas e expectativas adversas, porque nunca se sabe onde a alta de juros vai parar. Nos Estados Unidos, por exemplo, na virada de 2018 para 2019, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) tinha elevado bastante os juros e muitos esperavam que faria mais três aumentos. Só serviu para formar expectativas. Subir juros alimenta a impressão de que o processo de alta terá continuidade. Não está dado que a Selic vai entrar em um ciclo de altas.

O que deve determinar a revisão da política de juros?

A direção do ajuste fiscal e os efeitos sobre o câmbio serão determinantes para o futuro da Selic. Depois do recesso do Congresso, todos ficarão preocupados com a questão fiscal, a contenção das despesas obrigatórias. O mercado vai ficar de olho nisso.

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