Segunda-feira

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Intervenção na Petrobras mostra ‘mão pesada’ do controlador, diz Arminio

O episódio de intervenção do presidente Jair Bolsonaro na Petrobras demonstra a “mão pesada” do controlador em companhia estatal, e sugere que o mesmo pode ocorrer com outras empresas governamentais e com concessionárias de serviços públicos, diz o economista Arminio Fraga, sócio da Gávea Investimentos e ex-presidente do Banco Central (BC). Em entrevista ao Valor, Arminio afirma que, considerando a experiência brasileira, seria recomendável a privatização de todas as estatais. “O Estado como empresário tem sempre muitas dificuldades”, diz.

Mas ele não vê condições para privatizações de empresas públicas neste governo. “Esse governo privatizou zero até agora, zero.” Arminio vê o Banco do Brasil como estatal com boa governança, um caso que pode ser replicado e aprofundado inclusive no próprio banco público. No caso específico de Petrobras, considera “positiva” uma possível recondução do conselho da Petrobras, hipótese sugerida pelo próprio controlador.

O economista também acredita que a repercussão do caso Petrobras deve ser suficiente para impedir que a petroleira arque com os custos de um eventual subsídio para os caminhoneiros, base de apoio de Bolsonaro que tem pressionado o presidente no tema dos combustíveis.

Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: Qual é a sua percepção sobre a intervenção do governo na Petrobras?

Arminio Fraga – A Petrobras é uma empresa. A mão pesada do controlador, como agora, sugere que o mesmo pode ocorrer com outras estatais e também com concessionárias. O Brasil é um país carente de investimentos, que como um todo investe pouco e há muito tempo. E tanto do ponto de vista do volume de investimento quanto da qualidade do investimento esse tipo de atitude assusta muito. Um exemplo que me vem à cabeça: um avanço importante nos últimos tempos foi a lei do saneamento, área em que as carências no Brasil são imensas. É preciso que quem for investir nessa área se sinta seguro e não tenha medo de que em algum momento algum prefeito diga: ‘vamos segurar o reajuste, a população não está aguentando.’ Voltando às estatais, penso que a nossa experiência recomenda a privatização de todas. O Estado como empresário tem sempre muitas dificuldades. O modelo híbrido [da Petrobras] nem resolve as questões públicas, nem se aproveita do que o modelo empresarial tem a oferecer. Mesmo em uma empresa estruturada como a Petrobras, aconteceu o Petrolão, que beira o inacreditável, mas aconteceu. E não faz muito tempo outro governo segurou aumentos de preços de combustíveis, com custos enormes para a Petrobras e seus acionistas, inclusive o Estado.

Valor: Ainda vê espaço nesse governo para privatizações?

Fraga: Não vejo. Esse governo privatizou zero até agora, zero. Seria delírio de minha parte imaginar que isso fosse acontecer. Mas esses assuntos precisam ser debatidos. Nessas horas se constroem opiniões fundamentadas sobre o tema. As pessoas começam a entender o que quer dizer de fato privatizar. Foi bom no setor de telefonia, onde a população usufrui de grandes benefícios. Vamos fazer o raciocínio inverso. Por que o governo haveria de querer ser dono de uma empresa? Resposta: para desviar do modelo privado de busca de eficiência. Então estamos falando de gastos públicos implícitos que não estão no orçamento. Isso é inaceitável tanto do ponto de vista econômico como político. Se eu fosse um parlamentar, pensaria duas vezes antes de dar esse espaço para o executivo, a não ser que eu fosse parlamentar que estivesse na ‘boquinha’. Será que isso é bom? Claro que não. Então tenho dificuldade com o modelo de estatal. Entendo que possa ter empresa listada, com governança, controles e transparência. Mas a governança tem que ser blindada.

Valor: De que forma?

Fraga: Tem que começar tirando o controle do governo, não vejo razão para o governo ter controle de empresa alguma. O governo pode até ter, para certos setores, como mencionei, algum tipo de veto estratégico, uma ‘golden share’, algo assim. ‘Não quero vender a Petrobras para a Petrobras da China’. Ok, eu também não quero, me considero bem liberal, mas não faria isso. Eu diria que o Banco do Brasil é o que temos de mais próximo nessa linha e funciona bem, é um bom exemplo. Tem alçadas, tem controles, comitês, transparência e clara cadeia de responsabilidade. Se esse caminho for seguido, o ‘brinquedo’ orçamentário [do governo], opaco, deixa de ter graça e, provavelmente, o governo acaba privatizando tudo. Cabe lembrar que o governo sempre vai ser o regulador, sempre vai ter poder de polícia, de fiscalização. Não há que temer.

Valor: A Lei das Estatais impede que o meio político queira fazer indicações para o conselho de administração da Petrobras?

Fraga: Li que o governo quer reconduzir os atuais conselheiros, o que seria positivo. Esse conselho tem muita gente boa, deixa a turma trabalhar. Ali há resistências a abusos de poder. Se for isso está bom. Mas se o governo aparecer com uma chapa que tenha por objetivo se apossar da empresa para atingir objetivos políticos, aí seria grave. A lei requer um rito: existe um comitê de nomeação onde se define perfil e se avaliam candidatos. O controlador pode encaminhar sua proposta, mas passa por escrutínio e tem que ser levado ao conselho. É verdade que o governo controla o conselho, então volta a questão maior do controle. Mas no mínimo o processo de eventual substituição do atual presidente passa por um filtro, o que não é irrelevante porque as pessoas envolvidas aprovando nomes vão adquirir o peso da responsabilidade.

Valor: Quais são as suas expectativas em relação à Petrobras depois dessa intervenção?

Fraga: Tenho dificuldade em fazer grandes previsões, mas acho que o assunto ficou público o suficiente para impedir que a Petrobras arque com os custos de um eventual subsídio para esse setor [dos caminhoneiros]. Aliás, subsídio ao combustível fóssil é considerado em quase todo o mundo como algo criminoso do ponto de vista ambiental. Se não houvesse estatal, não sei se haveria greve. Eles [os caminhoneiros] poderiam ir pedir ao governo. Mas aí caberia pensar: por que não um subsídio ao feijão, por exemplo? A coisa ia ficar mais óbvia. Essa [a dos caminhoneiros] é uma área em que o presidente tem uma base político-eleitoral forte e tem do outro lado, na mão dele, uma estatal, então ele fica meio refém dessa estória. O presidente também não é uma pessoa que quer privatizar, é o oposto. É curioso ter escolhido um ministro que queria privatizar. Suspeito que a Petrobras vai manter alguma regra razoável de paridade [de preços]. Não tenho a menor ideia o que vai acontecer com o subsídio, mas o que nós todos sabemos é que o orçamento [da União] está com espaço zero e se o governo esticar muito a corda o ambiente econômico-financeiro vai piorar, em função do estado frágil das finanças públicas do país. Não quer dizer que a ação da Petrobras vá voltar rapidamente porque quando se quebra a confiança a volta é lenta. Mas existem defesas armadas na forma de regras e políticas e não vai ser fácil para o novo presidente da Petrobras mudar isso. Essa é minha leitura, talvez um pouco otimista dessa situação.

 

Mercados devem enfrentar dia de turbulência

Apertem os cintos, que o dia promete muita turbulência. A crise que começou com o reajuste do preço dos combustíveis e a provável mudança na direção da Petrobras extrapolou a companhia depois que o presidente Jair Bolsonaro prometeu mais medidas de intervenção do governo na economia. Essa fala contamina a percepção de risco Brasil, o que deve se traduzir em alta do dólar e dos juros de longo prazo, e na queda da bolsa, ainda com Petrobras liderando as perdas.

“Até sexta-feira, era uma crise com efeitos restritos às ações da Petrobras. Depois da fala de Bolsonaro, virou algo mais amplo, que deve fazer o dólar e os juros de longo prazo subirem”, resume o sócio e gestor da Novus Capital, Luiz Portella. “Agora o mercado todo reage ao medo de haver uma guinada da política econômica.”

É difícil prever a intensidade das perdas desta segunda-feira. Até porque, o ambiente internacional é muito favorável e, em alguns momentos, consegue contrabalançar os efeitos negativos do noticiário local. Foi o que aconteceu na sexta-feira passada, quando o dólar caiu 0,99%, para R$ 5,3874, e o Ibovespa recuou apenas 0,64%, para 118.430 pontos, num dia em que Bolsonaro manifestou intenção de fazer algum tipo de ingerência após o reajuste de preços dos combustíveis.

Mas, para dar uma ideia do que parte do mercado espera, pesquisa feita pela XP junto a gestores aponta para hoje uma queda de 2% do real, uma perda de 4% do Ibovespa e uma desvalorização de 10% das ações da Petrobras.

“A deterioração da percepção de risco se acentua, em razão da adoção de medidas intervencionistas e da visão de enfraquecimento das posições do Paulo Guedes no governo”, afirma Sergio Goldenstein, consultor independente e estrategista na Omninvest e ex-chefe do Departamento de Operações de Mercado Aberto do BC.

Para ele, não se vê disposição do Congresso e do governo para a adoção de medidas sólidas que permitam a volta ao trilho do equilíbrio fiscal no médio prazo. “O foco está apenas nas eleições de 2022”, acrescenta. Dessa forma, o resultado desse imbróglio tende a ser a desvalorização dos ativos financeiros, além do recuo dos indicadores de confiança do empresário e do consumidor.

“O resultado final acaba sendo mais inflação e recuperação lenta da atividade, o que pode estimular a adoção de mais medidas populistas. A natureza do escorpião não muda.” O momento de desconfiança perpassa até a capacidade de o ministro da Economia, Paulo Guedes, colocar a economia nos trilhos. “Guedes parece o violinista do Titanic. Continua tocando para nos acalmar, os passageiros do navio naufragando.

Resiliência dele é de fato impressionante, como falou o [ex-secretário de desestatização] Salim Mattar, mas não sei se vai ajudar muito daqui para frente”, escreveu Marcos Mollica, gestor do Opportunity Total, no Twitter. “Muitos investidores acabaram seduzidos pelo discurso do Guedes, mas os fatos vêm mostrando a opção do presidente do país pelo populismo econômico”, afirma Goldenstein.

Para ele, a interferência “agressiva” em uma estatal listada na bolsa é mais um capítulo de uma narrativa que já contava com “falta de empenho pelas reformas, posições contrárias às medidas voltadas ao equilíbrio fiscal e favorecimento a determinados grupos”.

Bolsonaro criticou o mercado financeiro pela reação à sua decisão de mexer no comando da Petrobras. E disse que vai “meter o dedo” na energia elétrica. “É um choque de realidade para o mercado que ainda sonhava com uma agenda construtiva”, afirma o gestor de um fundo multimercado.

Nos últimos dias, parte do mercado vinha melhorando sua visão sobre o cenário local por causa dos sinais de entendimento entre o novo comando do Congresso e o Ministério da Economia. Mas, para esse profissional, agora fica “mais difícil acreditar que o governo vai defender reformas que mexam com interesses de grupos organizados se ele nem enfrenta os caminhoneiros”.

Para outro profissional, a postura do governo no caso da Petrobras coloca a perder um cenário otimista de alinhamento entre Poderes. “Logo agora que o mercado estava animado com a vitória de Lira e Pacheco, com esperança de andamento de reformas, o presidente cria um caos.”

Para o diretor do ASA Investments, Carlos Kawall, a decisão de Bolsonaro de mexer no comando da Petrobras é “desastrosa” e desfaz anos de esforços para recuperar a credibilidade não só da empresa, mas também do governo e da economia brasileira.

Em sua opinião, a crise aberta na estatal com a interferência do presidente também não se esgota com o ato, uma vez que o nome de Luna e Silva e eventuais alterações na política de preços precisam ser debatidos dentro do conselho de administração.

Para o economista, essa foi uma “decisão errada na hora errada, criando turbulência onde não tinha e lançando cada vez mais dúvidas sobre capacidade de conseguir restaurar condições de credibilidade do ponto de vista da condução da política econômica”.

Para Portella, da Novus, o que poderia trazer algum alento ao mercado e diminuir o efeito negativo nos próximos dias seria a apresentação de um texto mais positivo da PEC Emergencial, com contrapartidas à extensão do auxílio emergencial. E também declarações por parte de Guedes, que ainda não se manifestou nesta crise.

“O cenário externo é muito positivo, e se houver algum sinal mais favorável de atenção ao fiscal, pode até haver um fluxo comprador, aproveitando os preços muito baixos dos ativos.” De todo modo, até lá, a reação do dólar deve trazer uma pressão adicional para a alta dos juros. “O mercado vai pedir um aumento da Selic superior a 0,5 ponto em março”, diz Portella.

Para Goldenstein, da Omninvest, a elevação da taxa básica de juros em março ajudaria a reforçar a credibilidade da autoridade monetária. “A curva de juros já precifica aumento acima de 30 pontos-base na reunião do Copom de março. Não elevar a Selic seria um tremendo tiro no pé, mais um, e o ideal é que o ajuste inicial seja de 50 pontos-base, o que reforçaria a credibilidade do BC e diminuiria a probabilidade de deterioração das expectativas de inflação”, diz.

“O efeito do câmbio sobre a inflação foi subestimado, em 2020, pelo BC e por alguns analistas. Junte-se a isso o agravamento do quadro fiscal e a elevação lenta, mas contínua, das expectativas de inflação para 2021”, afirma.

 

XP rebaixa recomendação para Petrobras de ‘neutro’ para ‘venda’

A onda de incertezas em torno da Petrobras deixa a empresa quase sem defesa contra uma onda de venda de suas ações. Hoje, a XP Investimentos rebaixou a recomendação das ações da Petrobras de neutro para venda em relatório intitulado “Não há mais como defender, rebaixamos para venda”, no qual o preço-alvo foi revisado, de R$ 32 para R$ 24 nas ações ordinárias e preferenciais. O que detonou a mudança foi o recente anúncio de que o governo federal decidiu substituir o CEO da companhia, Roberto Castello Branco, pelo general Joaquim de Silva e Luna.

“Vemos esse anúncio como uma sinalização negativa, tanto de uma perspectiva de governança, dados os riscos para a independência de gestão da Petrobras, como também por implicar riscos de que a companhia continue a praticar uma política de preços de combustíveis em linha com referências internacionais de preços, ou seja, que reflitam as variações dos preços de petróleo e câmbio”, dizem os analistas Gabriel Francisco e Maíra Maldonado, em relatório.

Para eles, existem muitas incertezas para justificar uma tese de investimento na Petrobras, e “acreditamos que as ações deverão daqui em diante negociar com um desconto mais alto em relação ao histórico e a outras petroleiras globais."

Nos cáculos da XP, a Petrobras negocia a uma média de 5,15x EV / EBITDA em 2021- 22, um modesto desconto de -6,5% para níveis históricos de 5,5x e um desconto de -26,4% para os níveis de múltiplos das grandes petroleiras americanas (Chevron, ExxonMobil e ConocoPhilips), ante níveis históricos de desconto de -33,0%.

Para colocar em perspectiva, durante períodos de instabilidades macroeconômicas e políticas no Brasil, como a crise política de maio de 2017 e a greve dos caminhoneiros em maio de 2018, as ações da Petrobras negociavam em um patamar de 4,5x EV / EBITDA, ou níveis de desconto em relação às petroleiras americanas entre -40% e -45%. “Em nossa opinião, as ações da Petrobras devem passar por uma penalização no mercado semelhante ao que foi observado nos períodos acima mencionados de instabilidades no Brasil, e não deverão refletir o seu valor intrínseco (ou seja, projetado com base em fluxos de caixa futuros) ou o elevado perfil de geração de caixa da companhia enquanto o ambiente atual de incertezas persistir”, acrescentam.

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