Quinta-feira

VALOR

PIB recua 4,1% e vê onda otimista ceder

A rápida recuperação da economia brasileira no segundo semestre não foi suficiente para evitar uma retração sem precedentes em 2020: duramente afetada pelas restrições à circulação especialmente no segundo trimestre, a economia encolheu 4,1% no ano passado, pior resultado da série histórica das Contas Nacionais do IBGE, iniciada em 1996.

É consenso entre economistas que sem medidas como o auxílio emergencial o tombo teria sido bem maior. Para a primeira metade de 2021, a expectativa é de um desempenho negativo, devido à combinação de piora da pandemia, vacinação lenta, suspensão do auxílio e incertezas fiscais.

Mesmo tendo perdido fôlego após a retomada em “V” no terceiro trimestre, a economia mostrou desempenho ainda robusto nos últimos meses três meses de 2020, sustentada pelas políticas de compensação de renda do governo e, também, pela maior normalização das atividades no período. Impulsionado por esses dois fatores, o PIB superou as estimativas do mercado e cresceu 3,2% de outubro a dezembro na comparação com o trimestre anterior, feitos o ajuste sazonal.

Com o crescimento mais forte nos últimos meses do ano, o chamado carregamento estatístico deixado por 2020 foi um pouco mais alto do que o previsto, ficando em 3,6%. Isso significa que, se o PIB ficar estável, ainda assim encerrará o ano atual com alta de 3,6% sobre a média do ano passado.

Em condições normais, a ajuda maior poderia ter desencadeado revisões para cima nas projeções para o PIB neste ano, mas as mudanças nas estimativas, que seguem concentradas na faixa de 3%, foram poucas e bastante tímidas.

Diante do recrudescimento da pandemia, da lentidão na vacinação e da piora nas condições financeiras, muitos analistas esperam queda da atividade no primeiro trimestre. Uma nova retração no segundo trimestre - que configuraria uma recessão técnica - não é considerada totalmente contratada.

Esse risco, contudo, ronda o primeiro semestre, e pode se materializar se o aumento de casos e mortes continuar, sem melhora na administração de vacinas. “A gente ainda está um pouco abaixo do nível pré-pandemia, mas já estamos acima do vale do pior momento da economia, que foi o segundo trimestre”, afirmou Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais do IBGE, ao apontar que o PIB está em patamar 1,2% inferior ao quarto trimestre de 2019.

“Uma onda de otimismo estava sendo formada no quarto trimestre, mas ela ficou para trás”, disse Emerson Marçal, coordenador do Centro de Macroeconomia Aplicada da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (CemapEESP/FGV). A economia estava ganhando ritmo no fim do ano passado, aponta Marçal, o que seria positivo, não fosse a segunda onda da pandemia a atingir o país neste primeiro trimestre.

A demanda doméstica - que soma o consumo das famílias, o consumo do governo e os investimentos dentro do PIB - mostrou comportamento ainda favorável nos últimos três meses de 2020, observou Tatiana Pinheiro, economista-chefe da BNP Paribas Asset Management. Em seus cálculos, a absorção interna subiu 5,8% sobre o trimestre anterior, ou 4,3% excluindo a importação contábil de plataformas de petróleo.

“Tivemos um quadro de demanda ainda forte. Além do auxílio emergencial, houve a influência de todos os demais programas que ainda estavam vigorando no quarto trimestre, com políticas de expansão fiscal e monetária”, afirmou Tatiana.

Outro fator que explicou a dinâmica positiva foi o arrefecimento da covid-19 e a consequente reabertura maior das atividades, acrescentou. Neste início de ano, porém, o quadro se inverteu, ressaltou Tatiana: a maior parte dos estímulos foi retirada e a pandemia se agravou, o que aponta para queda do PIB de janeiro a março, entre 0,5% e 0,8%.

Além disso, o aperto das condições financeiras, como reflexo do aumento da percepção de risco-país, também tem impacto negativo sobre a atividade, ao afetar as decisões de investimento e consumo. Levando em consideração apenas o desempenho do quarto trimestre, a herança estatística deixada por 2020 elevaria a estimativa para o crescimento deste ano em cerca de 0,7 ponto percentual, calcula a equipe econômica para Brasil do J.P. Morgan.

No entanto, o banco avalia que o recrudescimento da pandemia e seus efeitos sobre a economia devem anular boa parte da ajuda dada pelo carregamento estatístico. Por isso, a projeção para a alta do PIB em 2021 foi aumentada em somente 0,1 ponto, para 3,2%. “Com uma segunda onda severa de covid e aumento da incerteza política, a economia deve se enfraquecer significativamente, o que deve reduzir o crescimento no primeiro e no segundo trimestres”, destacaram os economistas Cassiana Fernandez e Vinicius Moreira.

Para a instituição, o PIB vai cair 1,5% entre janeiro e março, retração a ser seguida de alta fraca, de 0,4%, no trimestre seguinte. Os riscos políticos e da pandemia justificam a preocupação com a recuperação deste ano, na visão de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que agora trabalha com contração de 0,9% e 0,4% da economia no primeiro e no segundo trimestres, respectivamente.

A previsão abaixo do consenso de crescimento para o ano, de 2,6%, não foi alterada.

O cenário da consultoria, disse Vale, engloba um primeiro semestre afetado pela pandemia e um segundo semestre influenciado pelos desdobramentos de um governo mais intervencionista, com impacto em câmbio, inflação, juros e investimento.

O economista ressaltou, ainda, que o carregamento estatístico de 3,6% pode ser enganoso: nos últimos 25 anos, lembra, em oito deles o resultado do ano foi pior do que essa herança indicava, em torno de 1,4 ponto percentual.

Já o economista Luka Barbosa, do Itaú Unibanco, avalia que o efeito estatístico será relevante para explicar o crescimento estimado de 4% para o PIB em 2021. O banco é uma das poucas instituições que contam com alta da economia no primeiro trimestre, de 0,3%, previsão ainda preliminar. “Para o PIB ser negativo no primeiro trimestre, a produção industrial teria de cair bastante em janeiro, fevereiro e março e não vemos isso ocorrendo.”

Para Tatiana, da BNP Paribas Asset, o “carry over” coloca um leve viés de alta na projeção de expansão de 2,8% para o PIB no ano. O quadro, porém, é de cautela, diz ela, diante das condições financeiras mais apertadas e da evolução da pandemia. Por isso, por ora, o número está mantido.

 

Bancos e governo discutem volta de linhas emergenciais

Representantes da equipe econômica e de bancos começam a discutir a possibilidade de reeditar as linhas de crédito emergenciais criadas para empresas no início da pandemia diante do recrudescimento da crise. O Valor apurou que o setor financeiro tem sido procurado pelo governo para tratar da questão.

Uma fonte próxima aos bancos diz que o assunto começou a ser discutido há cerca de duas semanas, envolvendo técnicos do Ministério da Economia e do BNDES e executivos de instituições financeiras e de entidades como a Febraban (Federação Brasileira de Bancos).

Estão no radar novas rodadas do Pronampe, da linha assegurada por recursos do Fundo Garantidor de Investimentos (FGI) e do financiamento à folha de pagamentos de pequenas e médias empresas. Desta vez, no entanto, as instituições financeiras deverão assumir riscos maiores e o Tesouro Nacional empenhará menos recursos, diz um interlocutor a par das conversas.

Também há discussões para estender por mais 90 a 180 dias o prazo de carência do Pronampe, que começa a vencer em abril. Porém, há uma dificuldade técnica para se fazer isso porque o programa tem um prazo definido, segundo afirma outro interlocutor. Estender a carência levaria a um aumento no valor das prestações, o que seria um tiro no pé se o intuito é ajudar as empresas.

Seria necessário, portanto, mexer na legislação para viabilizar uma mudança. Reabrir as linhas emergenciais também implicará a necessidade de editar nova medida provisória ou alterar a lei. As contratações para essas modalidades só eram válidas no ano passado.

Além disso, a MP 992, que criava o Programa de Capital de Giro para Preservação de Empresas (CGPE), voltado a companhias com faturamento de até R$ 300 milhões, caducou no Congresso em novembro.

De acordo com um executivo do setor, uma reabertura do Pronampe seria uma notícia bem-vinda e viria com a maior participação dos bancos no risco de crédito. A linha é destinada ao capital de giro para micro e pequenas empresas e conta com garantia do Fundo de Garantia de Operações (FGO), administrado pelo Banco do Brasil.

Na versão atual, o fundo oferece cobertura de 85% em caso de inadimplência dos tomadores. Agora, a ideia é que os bancos assumam uma parcela maior do risco de crédito e o colchão do FGO seja reduzido para um patamar entre 60% e 70% — o número ainda está em aberto. Desta vez, há maior conforto das instituições financeiras em conceder crédito com uma garantia menor porque os riscos da pandemia já são mais conhecidos e a inadimplência do setor está muito baixa.

No entanto, as instituições financeiras vêm monitorando esses dados de perto, porque, com a piora da pandemia de covid-19 e uma nova paralisação das atividades não essenciais em diversos Estados e municípios, a preocupação aumentou.

As instituições financeiras também conversam sobre a extensão da linha coberta por recursos do FGI, destinada a empresas com receita anual de até R$ 300 milhões. Nesse caso, diz um executivo do setor, há, nos bancos, a percepção de que o formato foi bem-sucedido e não deveria mudar.

Alguns já começam a estudar também a possibilidade de reabrir seus programas de prorrogação de parcelas de crédito. No ano passado, os bancos concederam carências de dois a seis meses em operações que totalizam um saldo de R$ 971,5 bilhões. A maior parte já voltou a ser paga e tem mostrado inadimplência controlada.

Procurado, o Ministério da Economia afirmou que uma nova etapa do Pronampe e uma prorrogação da carência estão em discussão no Congresso. O BNDES não havia se pronunciado até o fechamento desta edição.

 

BC não deve se preocupar com quem perde no câmbio, diz Figueiredo

O ex-diretor do Banco Central Luiz Fernando Figueiredo, sócio da Mauá Capital, diz que a autoridade monetária deve intervir no mercado de câmbio com vistas ao interesse do país, e não de investidores que eventualmente estão perdendo dinheiro com a suavização da oscilação da cotação do dólar.

“Sempre tem quem perde no mercado. Por que o BC tem que se preocupar com o cara que comprou bolsa e comprou câmbio?”, questiona Figueiredo. “Ele não tem que se preocupar com isso, ele tem que se preocupar com o país.” Nos últimos dias, cresceram as queixas em setores do mercado com a presença mais forte do BC no mercado de câmbio, com a venda de US$ 5 bilhões em moeda estrangeira.

As críticas são vocais, em particular, entre os gestores que investiram em bolsa e compraram dólar para se proteger — mas não estão se beneficiando plenamente dessa proteção devido à atuação do BC.

“O cara acha que pode fazer um negócio infalível? O mundo real não é infalível. A verdade é que os bancos centrais do mundo, desde 2008, têm uma postura de intervenção gigante, nunca imaginável”, afirma Figueiredo, que comandou as mesas de câmbio e juros do BC no começo do século, quando o país foi sacudido por uma série de crises. “O mercado quer o purismo até que se machuque, aí ele quer uma boia. Não tem essa”, segue.

Para ele, a atuação do BC no câmbio pode até ter afetado o mercado de juros, mas de longe o fator principal é a incerteza fiscal. “Claro que vaza, se o BC vende o câmbio, vaza para o DI. Naturalmente. Isso é mercado, faz parte. Eu até acho que a curva DI está muito acima do que deveria estar”, diz Figueiredo.

Ele também discorda da tese, defendida em setores do mercado financeiro, de que a atuação do BC está mascarando a mensagem de desagrado que os preços de ativos dão para o parlamentares e governo. "Olha o que aconteceu na taxa de câmbio. Nossa taxa de câmbio é o lixo do mundo. Nossa Bolsa, curva de juros, tudo", argumenta. “O câmbio a R$ 5,70 ou R$ 5,65, como assim não está refletindo a realidade? Desculpe, na minha humilde opinião, o cara que diz isso é um doido”, sustenta.

Abaixo, os principais trechos da entrevista:

Valor: Qual é a sua visão sobre a atuação do BC nos mercados? Luiz Fernando Figueiredo: O BC está sendo mais firme, enfático. Minha visão é que, para o BC, existe um enorme exagero nos mercados. Por isso ele está mais pesado na taxa de câmbio. Todo mundo fala: ''ele tem um teto para a taxa de câmbio''. Todas as vezes que as pessoas falaram isso, erraram, e vão errar de novo. Nunca vai se tratar disso. O câmbio é flutuante e ponto. Mas o Banco Central está atuando. E tem a ver com a situação nesta semana, que é decisiva para o fiscal. É razoável ter uma atuação mais forte.

Valor: A intervenção se justificaria para conter a volatilidade?

Figueiredo: Sem dúvida. Porque, às vezes, a situação exige. Risco é uma situação que você consegue medir, incerteza não consegue. Como você está diante da situação em que o Congresso pode passar algo bom ou ruim, é uma situação de incerteza. Como você precifica isso? É difícil. Por isso tem, às vezes, que vir o regulador e segurar mesmo. Não o preço, mas essa volatilidade.

Valor: Tem muitos gestores de fundos que compraram dólar para proteger posições em bolsa, e agora reclamam que o BC segura o dólar. Isso não é uma distorção de preços e do mercado?

Figueiredo: Mas isso é problema do mercado. Sempre tem quem perde no mercado. Por que o BC tem que se preocupar com o cara que comprou bolsa e comprou câmbio? Ele não tem que se preocupar com isso, ele tem que se preocupar com o país. O câmbio é um preço importante para o país. O BC não está querendo controlar, está querendo reduzir a volatilidade. São reclamações de quem está perdendo dinheiro. O cara acha que pode fazer um negócio infalível? O mundo real não é infalível. A verdade é que os bancos centrais do mundo, desde 2008, têm uma postura de intervenção gigante, nunca imaginável. Na minha época no BC, se a gente fizesse 10% do que os bancos centrais fazem, iriam surtar. É uma loucura, impensável, sandice. O nosso Banco Central, na verdade, é um dos menos intervencionistas.

Valor: Mas existe o argumento no mercado de que o BC, quando age no câmbio, empurra os fundos a buscar proteção no mercado de juro. Isso não eleva a curva e, no final, poderá forçar o BC a fazer um aperto monetário mais forte?

Figueiredo: Minha humilde opinião: bobagem. Isso é conversa mole. Não existe país do mundo em que o Banco Central não intervenha. Não existe esse purismo. O mercado quer o purismo até que se machuque, aí ele quer uma boia. Não tem essa. O Banco Central tem que atuar na hora que ele achar que tem que atuar. O cara que está no mercado assume o risco, inclusive o risco de o BC atuar.

Valor: Mas e o efeito que isso provoca na curva de juro?

Figueiredo: Não acho, essa curva está apertando as condições financeiras. Está tornando a política monetária mais contracionista. Isso é o que está acontecendo. Quando o câmbio deprecia assim, você tem o choque de oferta, acho que é uma resposta natural. O câmbio a R$ 5,70 ou R$ 5,65, como assim não está refletindo a realidade? Desculpe, na minha humilde opinião, o cara que diz isso é um doido. Não tem essa de deixar ocorrer qualquer preço, que pode subir mais. É um preço que já foi, já subiu, tem todo o prêmio e risco e mais um pouco. O BC está lotado de reservas internacionais. Acho que, nesse preço, faz bem de vender. Não faz mal. Tem reserva excessiva.

Valor: Mas e o impacto no juro?

Figueiredo: Quando tem essa pressão fiscal, vai para todos os mercados. O câmbio está indo muito para cima. A curva de juros, absurdamente para cima, também. E a bolsa, caindo. Os ativos de risco no Brasil estão sofrendo. Por quê? Por conta do risco fiscal. Claro que vaza, se o BC vende o câmbio, vaza para o DI. Naturalmente. Isso é mercado, faz parte. Eu até acho que a curva DI está muito acima do que deveria estar. Mas quem sou eu para achar qualquer coisa? Acho que está muito fora. É o prêmio de risco que o mercado está colocando neste momento.

Valor: Tem gente que defende que o BC deixe o dólar subir para não esconder a insatisfação do mercado com os rumos que Congresso e governo estão tomando.

Figueiredo: Olha o que aconteceu na taxa de câmbio. Nossa taxa de câmbio é o lixo do mundo. Nossa bolsa, curva de juros, tudo. Não acho que precisa ser na plenitude, senão o mundo político não sente. Isso é conversa de quem está revoltado porque tem uma posição que achou que estava bem protegida com o câmbio. Todo banco central do mundo intervém. De um jeito ou de outro. Tem bancos centrais mais intervencionistas. Essa história de purismo é conversa mole. Infelizmente, tem um aspecto megarrelevante, um dado da realidade, os mercados antes refletiam as incertezas. Toda vez que tinha um risco maior, o mercado ia lá e colocava nos preços. Só que, desde 2008, os bancos centrais mudaram muito a atuação. Ficaram com uma atuação muito mais forte. Muito mais abrangente. Na própria Mauá, vivo lembrando a turma, o mercado não é mais o termômetro, os bancos centrais atuando como atuam. Podemos até discordar. Mas, esquece, os mercados não são termômetro mais, são apenas parcialmente.

Valor: Muita gente no mercado argumenta que o câmbio dispara porque os juros estão muito baixos. Faz sentido?

Figueiredo: Acho esse argumento muito errado. Que juro reduziria a volatilidade no câmbio? De 10%? 15%? Quando você vê a volatilidade do câmbio, achar que o juro 0,5 ponto percentual ou 1 ponto percentual mais alto vai fazer qualquer diferença é uma loucura. O câmbio oscila 1,5% por dia. É fiscal, é fiscal, é fiscal, é fiscal. Cem vezes fiscal. Tem que atuar na origem do problema.

Valor: O que conta mais na pressão do dólar, fatores domésticos ou externos?

Figueiredo: É a questão fiscal. O Brasil é o país mais endividado do mundo emergente, com déficit crônico e que ainda anda falando que vai gastar mais. Os ativos brasileiros estão ficando barbaramente para trás em relação ao mundo inteiro. O que acontece com a bolsa, a curva de juros, o câmbio, é dramático. É um país que tem se mostrado muito irresponsável do ponto de vista fiscal. Não há muita crítica em relação ao que foi feito em termos de gastos na emergência da pandemia, embora até gastou um pouco mais do que deveria. Agora, fica flertando com gastar mais, um país com dívida em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) de 90%. O Brasil teima em flertar com o precipício. O câmbio, no final, é um ativo. O país ficou tão barato que os estrangeiros, no final, começaram a comprar bastante o país. Agora, nesta semana estamos no pico da incerteza, quando ocorre a discussão para valer no Congresso.

Valor: O que ocorre no exterior não nos afeta?

Figueiredo: O pacote fiscal do Biden é absurdamente grande, US$ 1,9 trilhão. Esse pacote suscitou a preocupação do mercado de superaquecer e vir inflação. Qual é o tamanho da preocupação? Eu diria que pequena, ainda, mas antes era zero. O juro em 10 anos estava em torno de 1,1%, agora subiu mais perto de 1,4%. Deu uma alta grande, mas ainda é baixo. Se imagina que a meta de inflação do Fed é 2%, é juro negativo ainda. Os ativos estão caros lá fora, por isso mais suscetíveis a turbulência. Só que o apetite dos banqueiros centrais e dos governos de ajudar a economia é muito grande.

 

Reviravolta em Brasília traz alívio ao mercado

Faltando menos de duas horas para o fim de um pregão turbulento e rodeado de incertezas, o mercado brasileiro encontrou motivos para uma virada impressionante. Em um tuíte, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), descartou a possibilidade de deixar o Bolsa Família fora do teto de gastos, amenizando a preocupação com um descontrole das contas públicas. Esse foi o gatilho para tirar o Ibovespa de uma queda de mais de 3% e zerar a alta do dólar - algo que nenhuma intervenção do Banco Central foi capaz de fazer ao longo do dia.

Para se ter uma ideia do tamanho do movimento, o Ibovespa saiu da marca de 107.466 pontos (-3,65%) para 112.398 pontos (+0,77%) em poucos minutos. É possível dizer, portanto, que o “preço do medo” foi de aproximadamente 5 mil pontos na bolsa. Depois da reação inicial, o índice passou por uma certa acomodação e fechou em leve queda 0,32%, aos 111.184 pontos, com giro financeiro de R$ 37,2 bilhões. Já o dólar comercial desabou mais de 11 centavos e ficou perto de fechar em terreno negativo.

Após tocar R$ 5,6374 na mínima intradiária, a moeda encerrou praticamente estável, em alta de 0,05%, a R$ 5,6659. Em um sinal de que ajuste pode continuar hoje, o contrato futuro da divisa americana encerrou o pregão em queda de 1,12%, aos R$ 5,6235.

Até então, nem a injeção do equivalente a US$ 2 bilhões pelo Banco Central através de swaps cambiais havia sido suficiente para trazer maior tranquilidade ao câmbio - na máxima, por volta das 13h, o dólar chegou a R$ 5,772. E não faltavam motivos para estresse: preocupações com a nova rodada de restrições impostas por governo estaduais para limitar o avanço da pandemia, temores fiscais e também um cenário externo negativo.

Mas o principal ponto de alerta dos agentes, como se pôde ver na reta final do pregão, era com uma nova manobra de senadores para tirar o Bolsa Família do teto de gastos. Segundo apurou o Valor, uma ala de lideranças da Casa passou a articular a medida para abrir espaço para obras no Orçamento. A exclusão do programa abriria um espaço de R$ 34,9 bilhões.

Após reunião com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e com integrantes do Planalto, Lira refutou a ideia. “Quero deixar claro que são infundadas todas as especulações sobre furar o teto. Tanto o Senado quanto a Câmara votarão as PECs sem nenhum risco ao teto de gastos, sem nenhuma excepcionalidade ao teto. Essas especulações não contribuem para o clima de estabilidade e previsibilidade”, escreveu em seu perfil no Twitter. Outro fator positivo foi a decisão, oficializada com a complementação de voto do relator Marcio Bittar (MDB-AC), de limitar em R$ 44 bilhões o gasto com o novo auxílio emergencial este ano.

Até então, a proposta não trazia limite para os gastos com o benefício. Junto com o prêmio embutido nos ativos locais, o risco fiscal também vem pesando sobre as perspectivas para a política monetária. Mesmo com a fala do presidente do Banco Central, Roberto Campos, indicando calma ao mercado em relação ao rumo da taxa Selic, os juros de curto prazo seguiram em alta durante a sessão regular e até ampliaram nos preços a probabilidade de uma elevação de 0,75 ponto da Selic na reunião de março.

“Estamos olhando todas as variáveis, não só locais, como internacionais”, disse o dirigente em palestra na noite de terça-feira. Campos ressaltou, ainda, que o BC possui hoje um amplo conjunto de instrumentos para fazer com que as metas sejam cumpridas.

Ainda assim, a ansiedade dos agentes com a discussão sobre a PEC Emergencial explicou, em grande medida, o movimento de alta nos juros futuros, em uma demonstração de que, para o mercado, um descumprimento mais flagrante das regras de limite de gasto poderia impor uma ação mais forte do BC.

A precificação extraída da curva de juros ao fim da sessão regular - pouco antes do tuíte de Arthur Lira - mostrava chance de 87% de alta de 0,75 ponto percentual da Selic na reunião de março. Na terça, essa probabilidade era de 81%.

Segundo Solange Srour, economista-chefe do Credit Suisse, apesar dessas falas, Campos Neto se atentou em indicar preocupação com a convergência da inflação em relação à meta perseguida pela autoridade monetária, o que sinaliza que uma normalização já neste mês não está fora da mesa.

A expectativa do Credit Suisse é de que o BC inicie a alta de juros já em março, com dose de 0,50 ponto percentual. “Não acho que o mercado esteja exagerando na precificação [para o Copom], acho que o mercado só se adianta a um cenário pior”, disse Srour, em entrevista no início da tarde, referindo-se a riscos associados à PEC Emergencial, que fariam o câmbio se depreciar ainda mais e as expectativas de inflação se desancorarem.

 

FOLHA

Na pior década da história, renda dos brasileiros encolhe 5,5%

Em média, cada brasileiro teve renda de R$ 35.172 em todo o ano passado. Em um cálculo simples, o valor significa uma perda próxima de R$ 1.770 em relação a 2019, já considerada a inflação, e de R$ 2.040 ante 2010.

Dito de outra maneira, o país empobreceu 5,5% na década encerrada em 2020, no pior desempenho já registrado pelas estatísticas e estimativas disponíveis, que alcançam até o início do século passado.

Mesmo no período 1981-1990, conhecido na história como a década perdida, a queda acumulada do Produto Interno Bruto por habitante foi menos intensa, próxima dos 4% —com a ressalva de que a metodologia de apuração do PIB mudou de lá para cá.

Como se pode intuir, a chamada renda per capita de um país encolhe quando o crescimento do PIB é menor que a expansão populacional num mesmo intervalo de tempo.

No decênio há pouco encerrado, o produto —vale dizer, toda a renda gerada na indústria, nos serviços e na agropecuária— teve alta real de pouco menos de 2,7%, a menor já medida em tal período.

Enquanto isso, o aumento do número de brasileiros, mesmo em processo de desaceleração, beirou os 8,7% nas projeções do IBGE.

Dessa maneira, os 211,8 milhões de habitantes do país no ano passado dispunham de menos renda, em média, que os 194,9 milhões de 2010.

São raros, na história econômica mundial, episódios de empobrecimento ao longo de uma década inteira. Em geral, eles estão associados a guerras, rupturas políticas ou crises econômicas globais.

Desta vez, a pandemia de Covid-19 desempenhou papel decisivo ao derrubar a atividade na maior parte do mundo —e o Brasil não seria exceção.

Sem o coronavírus, é provável que o PIB per capita brasileiro tivesse encerrado o decênio próximo da estagnação, o que já seria considerado um péssimo resultado para um país de renda média.

No período, a economia nacional viveu de 2014 a 2016 sua segunda recessão mais profunda desde o início do século 20, apenas um pouco menos devastadora que a de 1981-83.

Ali chegava ao fim a política econômica do governo Dilma Rousseff (PT), que já colecionava números declinantes desde 2011 devido à combinação de ambiente internacional menos favorável e erosão da confiança doméstica nas ações e finanças do governo.

Os anos seguintes foram de contenção de gastos públicos, ajustes nas empresas estatais e permanência da instabilidade política, levando à quase estagnação do PIB por habitante —até a derrocada de 2020.

Embora o impacto econômico da pandemia no Brasil não figure entre os maiores do mundo, o mau desempenho do país no restante da década distanciou sua renda per capita dos padrões observados nas nações desenvolvidas.

Conforme dados do FMI, a proporção entre o PIB por habitante brasileiro e o dos países ricos caiu de 32,6%, em 2010, para 28,2% em 2019, considerado o poder de compra das moedas.

 

Senado aprova em 1º turno texto-base da PEC que libera até R$ 44 bi para novo auxílio

Apesar de desidratar medidas fiscais da equipe econômica, o Senado aprovou por 62 votos a 16 em primeiro turno nesta quarta-feira (3) a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial com um teto, de R$ 44 bilhões, para os gastos com a nova rodada do auxílio emergencial neste ano.

A votação do segundo turno, inicialmente prevista para o mesmo dia, acabou adiada para a manhã desta quinta-feira (4), assim como um único destaque para esse turno. Os demais destaques foram rejeitados.

Depois, caso aprovada no segundo turno, seguirá para a Câmara, onde também precisa passar por dois turnos e com apoio de 60% dos parlamentares.

A ideia de travar o custo da renovação do auxílio emergencial foi defendida pelo líder do governo, Fernando Bezerra (MDB-PE), em entrevista à Folha publicada nesta semana. Se aprovado, esse limite dependerá de outra PEC no futuro para ser elevado.

Técnicos do Ministério da Economia avaliam que, embora a versão final seja mais enxuta da considerada ideal para o ministro Paulo Guedes (Economia), o governo conseguiu aprovar, no mesmo texto, a liberação do auxílio junto com os gatilhos —medidas a serem acionadas, por um período determinado, em caso de crise nas contas públicas.

Guedes havia indicado a interlocutores que poderia deixar o governo, caso a PEC Emergencial não fosse aprovada pelo Congresso. Líderes do Senado queriam autorizar apenas a nova rodada do auxílio -sem a sinalização de compromisso com o ajuste fiscal no futuro. Interlocutores do governo então negociaram para evitar uma ampla derrota do ministro da Economia.

O governo avalia criar faixas com valores distintos do auxílio emergencial a depender do perfil do beneficiário. A proposta em estudo prevê parcela padrão de R$ 250, mas o benefício mensal seria maior para mulheres chefes de família e menor para pessoas que se declararem sozinhas.

No desenho em elaboração, beneficiários que atendam aos critérios e não tenham filhos ou dependentes terão direito a parcelas mais baixas. Há modelos com valores de R$ 125, R$ 150 ou R$ 175 para essas pessoas. O patamar de R$ 150 atualmente é o mais provável.

Aproveitando a disposição do Congresso para aprovar o auxílio, Guedes condicionou a nova rodada à PEC Emergencial, que estava parada no Senado desde o fim de 2019. A proposta era mais rígida no controle de gastos públicos, prevendo, por exemplo, o corte de jornada e de salários de servidores quando as contas públicas entrarem em situação de forte aperto.

Para conseguir apoio no Senado, o governo teve que ceder, mas manteve pontos considerados vitais para a equipe econômica. Os gatilhos agora são mais brandos, como barreira a concursos públicos, reajuste salarial do funcionalismo e à criação de despesas obrigatórias.

Na Câmara dos Deputados, o presidente Arthur Lira (PP-AL) já indicou que a proposta vai direto a plenário, sem passar por comissões, para acelerar a tramitação e a consequente liberação do auxílio emergencial.

A PEC, como defende Guedes, prevê um protocolo a ser acionado em caso de calamidade pública. No ano passado, por causa da crise da Covid-19, foi decretado estado de calamidade, por exemplo.

No protocolo previsto, serão acionados os gatilhos durante o período de calamidade, ou seja, medidas que visam barrar o aumento de gastos com funcionalismo, como criação de cargos e progressão nas carreiras, além de criação de benefícios tributários. Numa versão anterior, essas medidas, como vedação a reajustes salariais de servidores, valeriam por dois anos após o fim da calamidade, mas, para aprovar a PEC, a vigência dos gatilhos foi reduzida.

Na calamidade, estados e municípios poderão adotar essas medidas. Caso não acionem os gatilhos, não terão acesso a garantias da União ou a empréstimos.

Os gatilhos também podem ser acionados pela União, estados e municípios nas situações de aperto nas contas públicas: despesa obrigatória primária passar de 95% da despesa obrigatória total ou despesas correntes estiverem acima de 85% das receitas correntes. A expectativa é que esse cenário se concretize apenas em 2024 ou 2025.

A PEC autoriza o uso do saldo financeiro dos fundos públicos para compensar a dívida pública. A medida é uma forma de balancear o endividamento a ser realizado para pagar o novo auxílio emergencial e outras consequências da crise do coronavírus.

Durante a tramitação no Senado, provocou polêmica a inclusão no texto do relator Márcio Bittar (MDB-AC) de proposta que extinguia os mínimos constitucionais para saúde e educação. O dispositivo provocou pronta reação de senadores, governistas e oposição.

Bittar, parlamentar muito próximo a Paulo Guedes e que trabalha em sintonia com a equipe econômica, precisou recuar para evitar a derrubada da PEC Emergencial. Em uma sessão na semana passada, senadores ameaçaram aprovar requerimento determinando que a PEC fosse encaminhada para a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), o que atrasaria a tramitação em pelo menos duas semanas.

"Na semana passada, tivemos aqui uma discussão e foi retirada da pauta a questão da desvinculação. Não era um jabuti. Eu tenho o convencimento da matéria, mas teremos oportunidades de debater isso. E disse, logo em seguida, que entendia a derrota e tinha muita coisa ainda para ser salva nesse relatório", afirmou o relator, ao ler seu relatório, na terça-feira (2).

"Eu quero aqui mais uma vez reconhecer, como disse ontem, que, embora em alguns momentos me salta a vontade, o desejo de que as coisas aconteçam como eu gostaria, eu dobro a cabeça, dobro a cabeça, com resiliência e com respeito, porque as coisas não são exatamente como eu quero ou como ninguém quer, nem o presidente da República", afirmou no dia seguinte.

O governo e o relator também precisaram desidratar a PEC ainda mais para viabilizar a sua aprovação. Bittar também recuou no corte nos repasses do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) para o BNDES, atendendo a pedidos de diversos partidos, inclusive da base do governo.

A versão original da PEC, apresentada por Guedes, previa gatilhos mais duros a serem acionados temporariamente em caso de aperto nas contas públicas, como corte de jornada (e de salário) de servidores públicos em até 25% e redução de pelo menos 20% dos cargos de confiança.

O relatório final, por outro lado, manteve a desvinculação de receitas para atividades de administração tributária. Isso poderá enfraquecer o funcionamento e a autonomia dos órgãos de fiscalização tributária no âmbito da Receita Federal e dos demais entes federados, segundo auditores fiscais.

Após negociação com líderes, Bittar recuou em outro ponto e manteve na Constituição a possibilidade de a União intervir em um estado para reorganizar as finanças da unidade da federação.

A PEC também determina um prazo para que o governo apresente um plano para redução gradual dos benefícios tributários. No entanto, após negociação com partidos, esse corte não deverá afetar fundos de desenvolvimento regional, o Simples Nacional, a Zona Franca de Manaus, incentivos tributários a entidades sem fins lucrativos, redução de encargos sobre a cesta básica, o Prouni (Programa Universidade para Todos) e bolsas de estudo para estudantes de nível superior.

Com aval do Ministério da Economia, foi incluída na PEC um dispositivo que desobriga o governo a ajudar, por meio de um programa de financiamento, estados e municípios a pagarem precatórios (dívidas judiciais a empresas e pessoas físicas).

Representantes de prefeituras e governos estaduais tentaram derrubar essa medida no Congresso, pois argumentam que, sem o apoio financeiro da União, não conseguirão quitar esses débitos —que somam mais de R$ 100 bilhões— até 2024, prazo determinado na Constituição.

Em acordo com líderes, Bittar então decidiu estender o prazo para o fim de 2029, mas manteve o fim da obrigatoriedade de a União abrir uma linha de financiamento para esses entes.

Horas antes da votação, senadores sinalizavam uma mudança estrutural com potencial para comprometer a imagem de responsabilidade fiscal do governo Jair Bolsonaro. Senadores, mesmo líderes do governo no Congresso, sinalizavam apreço pela hipótese de se retirar do teto dos gastos os recursos destinados ao Bolsa Família.

A origem da proposta estava numa emenda do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que não previa a retirada dos gastos com o programa social do teto dos gastos e sim dos gatilhos previstos na PEC. No entanto, o mal entendido resultou em uma pressão para que o Bolsa Família fosse retirado do teto dos gastos.

Mesmo lideranças governistas se animaram com a possibilidade, que abriria margem para investimentos. No entanto, a ideia foi totalmente abandonada após uma reunião com o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), o ministro Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), entre outras lideranças.

“Esta fala é para deixar bem claro que todas as especulações que rondaram ou sondaram o dia de hoje são infundadas”, afirmou Lira, após o encontro.

"Tanto o Senado quanto a Câmara votarão as PECs sem nenhum risco ao teto de gastos, sem nenhuma excepcionalidade ao teto de gastos, para que fique claro que essas notícias sempre especulativas não contribuem para o clima de estabilidade, de previsibilidade do nosso país", completou.

Também houve iniciativas parlamentares, como um requerimento do Cidadania, para que a proposta fosse "fatiada". Isso significaria apenas votar uma proposta com a cláusula de calamidade, para permitir o pagamento do auxílio emergencial, mas deixando as medidas de ajuste fiscal para o futuro.

O ministro Eduardo Ramos havia descartado essa hipótese, ao deixar o Congresso, o que representaria a maior derrota do governo na tramitação da PEC. O requerimento acabou rejeitado pelos senadores, por 49 votos contra 25.

Um dos senadores que havia defendido o fatiamento, Major Olimpio (PSL-SP), participou da sessão a partir de um leito de hospital, com a voz demonstrando abatimento, por causa da Covid-19. Sua assessoria informou que o senador está bem, em fase de acompanhamento apenas por precaução.

 

 

Não há sinal de fim de recessão e economistas já veem 2021 como ano perdido

A recessão que começou no início de 2020, com a chegada do coronavírus ao Brasil, ainda não deu sinais de ter acabado, apesar de o país ter tido crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) nos dois últimos trimestres do ano passado.

Em junho do ano passado, o Codace (Comitê de Datação de Ciclos Econômicos), órgão ligado ao FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) e formado por oito economistas de diversas instituições, definiu que o Brasil entrou em recessão no primeiro trimestre de 2020, encerrando um ciclo de fraco crescimento de três anos (2017-2019).

Segundo Paulo Picchetti, economista do FGV Ibre e professor da Escola de Economia de São Paulo da FGV, o comitê não utiliza “aquela regra de bolso simples” de dois trimestres consecutivos de queda do PIB para datar o início da recessão. Da mesma forma, não considera que dois trimestres seguidos de crescimento representam o seu fim.

Além disso, o comitê fundamenta suas decisões na definição clássica do que é recessão –uma queda generalizada do nível de atividade– e olha para um conjunto grande de indicadores de atividade econômica, não só para o PIB.

De acordo com o economista, houve uma queda generalizada da atividade a partir do fim do primeiro trimestre de 2020, mas a recuperação noss últimos dois trimestres do ano não se caracteriza por um aumento generalizado do nível de atividade.

Ele lembra que alguns setores não se recuperaram e ainda estão bem abaixo do nível de antes da recessão, principalmente os serviços, mas também alguns segmentos da indústria.

“Para caracterizar uma retomada não basta alguns poucos setores no curto prazo mostrarem crescimento. É como se a gente tivesse descido três degraus e subido dois. Subiu, mas não foi de forma suficientemente forte para considerar que você saiu de processo recessivo”, afirma.

“É difícil falar de saída da recessão quando o desemprego está nos maiores níveis da série histórica. Infelizmente os dados de curto prazo e projeções não são de uma recuperação forte do mercado de trabalho nem no momento nem no futuro próximo. Quando você tem uma retomada do nível de emprego, você tem uma certeza muito maior de que realmente entrou em um período de expansão.”

Picchetti cita ainda a perspectiva de grande parte dos economistas de uma nova queda do PIB neste primeiro trimestre e, eventualmente, até no segundo trimestre de 2021.

Se isso correr, os dados terão de ser analisados para se verificar se o país está emendando dois períodos recessivos, que podem ser considerados como uma grande recessão.

“Nada disso está claro ainda. O primeiro trimestre nem acabou, vai demorar para a gente conhecer todos os indicadores. Em resumo, existe uma incerteza muito grande para datar alguma coisa que seria o final da recessão com base só nesses resultados de 2020.”

ANO PERDIDO

A economia brasileira pode terminar o ano de 2021 praticamente no mesmo patamar do final do ano passado.

A avaliação é que o recrudescimento da pandemia, o atraso na vacinação e a piora nas condições financeiras provocadas por questões políticas e fiscais vão comprometer o resultado do ano. Uma eventual volta do auxílio emergencial, em patamares menores, também não deve contribuir para um resultado melhor.

O FGV Ibre calcula que um crescimento de 3,6% em 2021 já seria obtido se o PIB ficasse estagnado por todos os quatro trimestres (o chamado carrego estatístico). A instituição projeta crescimento de 3,2%, ou seja, prevendo um segundo semestre com crescimento insuficiente para compensar a queda esperada no primeiro.

Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Ibre, afirma que 2021 será um ano de crescimento do PIB, mas de piora em outros indicadores importantes, como emprego e renda. Ela afirma que mesmo que sejam retomados programas de transferência do governo, os valores não seriam suficientes para impedir uma contração recorde na renda, estimada em 6%.

Também estima um desemprego que deve chegar a 16% e terminar o ano na média de 15,3%, dois pontos percentuais acima da média de 2020. Em 2022, continuaria acima do nível pré-pandemia, próximo de 14%.

“Do ponto de vista das famílias, o que interessa é emprego e renda disponível. O mercado de trabalho é o calcanhar de aquiles nessa recuperação. O PIB é positivo, mas é um PIB que não consegue gerar emprego e, se gerar, é informal. É uma taxa de desemprego alta, com pouca geração de renda e uma inflação relativamente salgada. Vão ser dois anos de taxa de desemprego alta”, afirma.

Segundo a pesquisadora, a alegria com a recuperação vista no segundo semestre de 2020 durou pouco, pois a munição do governo em termos de capacidade de injetar dinheiro na economia acabou. Por isso, para obter uma recuperação mais rápida da economia seria necessário avançar na vacinação e ter uma melhora nos números da pandemia.

Silvia afirma que há o risco também de um terceiro trimestre ruim, dependendo da extensão da pandemia.

“É como se fosse um semestre perdido [o primeiro]. Você tem um contexto econômico muito fragilizado em alguns segmentos. A solução para a pandemia é a vacinação, e a gente está muito atrasado e com muita incerteza sobre quantas doses teremos.”

Lisandra Barbero, economista da XP, afirma que o PIB do quarto trimestre mostrou números positivos generalizados, tanto pelo lado da demanda quanto pelo lado da oferta, e deixou um carrego estatístico de 3,6% para 2021.

Com base nesse carrego e na expectativa de recuperação do setor de serviços, liderada pela vacina no segundo semestre, a instituição manteve a projeção de crescimento de 3,4% em 2021, com queda de 0,1% no primeiro trimestre.

“Embora positivos, acreditamos que os números de hoje dizem pouco sobre 2021. Diferente do segundo semestre do ano passado, a renda total do consumidor está diminuindo agora, e a dinâmica da Covid piorou substancialmente. Além disso, a volatilidade do mercado financeiro aumentou, com efeitos negativos nas condições financeiras.”

Luciano Sobral, economista da NEO Investimentos, projeta crescimento de 2,8% para o ano e não vê o início de uma recuperação antes do último trimestre. Ele estima um desemprego chegando ao pico de quase 20% e terminando o ano perto de 18%.

Para Sobral, qualquer ganho de atividade com a volta do auxílio emergencial, que deve representar em 2021 pouco mais de 10% do gasto de 2020, vai ser perdido por conta da piora nas condições financeiras provocada pela indefinição sobre a política fiscal.

“Um dos motivos pelos quais a gente prevê esse PIB relativamente baixo é que, se você olhar a massa de salários do ano passado, não melhora muito quando se coloca na conta a criação de empregos neste ano. E vão sair esses R$ 300 bilhões para entrar R$ 30 bilhões, R$ 40 bilhões [de auxílio emergencial]. É difícil ser otimista."

O economista do Itaú Unibanco Luka Barbosa, por outro lado, afirma que a instituição não vê sinais de queda na atividade neste ano e projeta crescimento de 0,3% no primeiro trimestre e de 4% no acumulado de 2021, ajudado pelo carregamento estatístico de 3,6%.

“Não precisa crescer muito para o PIB ser 4% em 2021, que é a nossa projeção. A gente vê um primeiro trimestre positivo, não vejo sinal de queda. Há vários indicadores apontando crescimento. A tendência é a economia continuar se expandindo. Parece que o risco é de ser melhor e não pior”, afirma Barbosa.

Ele afirma que a economia manteve a capacidade de expansão neste ano, mesmo sem o auxílio emergencial, e que não seria necessária uma nova edição do benefício.

“O mercado de trabalho está se recuperando. Não tem uma recuperação completa, mas já voltou a subir a quantidade de pessoas empregadas. A taxa de poupança foi muito elevada e isso ajuda a sustentar a economia também.”

O banco projeta uma queda no desemprego de 14,7% no final de 2020 (dado dessazonalizado) para 14,2% no final deste ano.

Sobre as novas restrições causadas pela pandemia, ele afirma que as taxas de isolamento social caíram em janeiro e fevereiro, beneficiando o consumo de serviços, e que a reversão desse cenário em março já é levada em consideração na projeção para este trimestre. O risco, segundo ele, é uma permanência dessas restrições pelos próximos meses.

O economista do Santander Lucas Maynard diz que a instituição projeta queda de 0,4% no primeiro trimestre e crescimento de 0,3% no segundo, considerando a contribuição de uma nova rodada de auxílio emergencial e medida de reforço na renda, como antecipação do abono salarial e 13º dos aposentados. Para o ano, espera crescimento de 2,9%.

“A dinâmica da recuperação em 2021 está atrelada mais ao calendário de vacinação. O cenário sanitário é primordial”, afirma Maynard. “Esse fluxo de renda poderia ajudar um pouco. Por isso até a gente ainda não fala em queda no segundo trimestre. A gente ainda contempla um primeiro semestre de lado.”

Ele cita também riscos para indústria causados pela falta de suprimentos para a produção, algo visto, por exemplo, no setor automotivo. E não vê uma recuperação do emprego neste ano, com a taxa média passando para 13,5% no final de 2021, bem acima da média do ano anterior à crise (11,9% em 2019).

“No nosso cenário, a volta do PIB ao nível pré-crise só no primeiro semestre de 2022”, afirma.

SETORES

A repercussão do resultado do PIB entre representantes de vários setores também mostra as dúvidas sobre como será a recuperação neste ano.

O presidente da Abiplast e vice-presidente da Fiesp e do Ciesp, José Ricardo Roriz Coelho, diz que o auxílio emergencial sustentou o PIB, pois injetou dinheiro direto na economia, via consumo. Para este ano, segundo ele, é urgente planejar outras saídas, já que o valor da ajuda será menor (R$ 250 em vez de R$ 600) e por menos tempo (quatro meses).

“As reformas estruturais, administrativa e tributária, vão possibilitar dinamismo ao ambiente de negócios e, por consequência, estimular a retomada econômica. O Brasil pede uma agenda clara e propositiva. Na outra frente, passou da hora de planejarmos e executarmos a ampla vacinação de todos, com organização e boa comunicação”, afirma Roriz Coelho.

Para o presidente-executivo da Conexis, associação que reune as empresas de telecom, Marcos Ferrari, o país precisará de esforço adicional de medidas econômicas.

"A conectividade deve estar no foco das políticas públicas para que os investimentos em telecomunicações continuem sendo uma alavanca para o crescimento", disse.

 

ESTADÃO

Tragédia maior no PIB de 2020 é a queda de 4,8% no resultado per capita, diz economista

Para o economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otavio de Souza Leal, embora os números do Produto Interno Bruto (PIB) de 2020 tenham vindo um pouco melhores do que ele esperava, a queda de 4,80% no PIB per capita caracteriza a "tragédia maior" dos números divulgados nesta quarta-feira, 3, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

"Durante a recessão de 2015 e de 2016 houve queda de mais de 4,0% na renda per capita, em média, para em seguida acontecer uma recuperação que ficou em 0,7% ao ano, na média. Antes de recuperarmos as perdas de 2015 e 2016, surge 2020 com um tombo de 4,80%, e essa é a tragédia maior do PIB. Mostra uma piora clara da situação financeira do brasileiro", argumenta Leal.

O PIB de 2020 tombou 4,10% ante 2019, resultado pouco melhor do que a mediana do mercado apurada pelo Projeções Broadcast, de queda de 4,20%. As estimativas, todas negativas, era de variação entre 4,55% e 3,50%. O PIB do último trimestre do ano passado cresceu 3,20% frente ao terceiro trimestre, considerando o ajuste sazonal.

Leal atenta para a participação do setor externo no PIB de 2020, que contribuiu positivamente com 1,2 ponto porcentual para o resultado do ano. "Se não fosse o setor externo, a queda do PIB iria para mais perto de 6,0%. Este é um comportamento normal em tempos recessivos. Como as importações caem muito em crises, acaba que as exportações líquidas se tornam mais favoráveis", pontua.

O economista do Banco Alfa não tem dúvidas de que o nível da atividade desacelerou no começo deste 2021 não só a ponto de sua projeção para o PIB do primeiro trimestre ser de queda de 0,30% ante o trimestre final de 2020, como já há viés de queda na projeção. Segundo Leal, três fatores pesam contra a atividade no primeiro trimestre: o fim do auxílio emergencial, a segunda onda da covid-19, que acaba restringindo a circulação de pessoas, e o processo de vacinação ainda muito lento contra a doença.

"É difícil escapar de um número negativo no primeiro trimestre. Essa confusão inicial da vacina tira um pouco do ânimo das pessoas. Espero queda de 0,30% no PIB do primeiro trimestre, e se eu revisar, vai ser para baixo", ratifica.

Para o segundo trimestre, no entanto, Leal está mais otimista, com projeção de crescimento de 0,30%. Dos três problemas que devem puxar para baixo a atividade do primeiro trimestre, pelo menos dois deles devem estar "bem encaminhados" entre abril e junho: as novas parcelas do auxílio emergencial, algo que, na perspectiva de Leal, "já está dado, e vai dar um ânimo maior para o consumo" e também a vacinação em massa, travada pelo fraco fluxo de recebimento de vacinas pelo Brasil, problema que o economista imagina que se resolva nas próximas semanas.

Antes da divulgação do PIB de 2020, o Banco Alfa projetava alta de 3,50% no PIB de 2021. De acordo com o economista, a nova estimativa do banco deve colocar o PIB de 2021 "mais perto de 4,0%".

 

O GLOBO

‘Não é só uma crise fiscal, há crise política e institucional’, diz Arminio Fraga

Ex-presidente do Banco Central e sócio fundador da Gávea Investimentos, o economista Arminio Fraga diz que o Brasil passa por uma crise que vai além da área fiscal. Segundo ele, o Brasil é percebido hoje como um país de visão atrasada, que passa ao largo de grandes debates, como meio ambiente e qualidade da democracia.

Arminio diz que nenhum país cortaria o auxílio à população de forma abrupta. Ressaltou que mesmo em uma situação econômica e sanitária não tão negativa, a saída teria seria “suavizada”.

Tivemos a maior recessão desde o Plano Collor. O que nos espera?

O Brasil, na verdade, sofreu dois tombos. Tivemos o de 2014, 2015 e 2016, e agora esse. Olhando o gráfico com os dados trimestrais do PIB, é qualquer coisa de extraordinário: desde 2012, o PIB caiu mais que subiu. A queda do PIB per capita chegou a bater quase 10%. É um sinal muito ruim.

E a pandemia?

É um momento que requer muita reflexão. A economia só vai ter chance de se recuperar quando a pandemia estiver dominada. Há um consenso de que a reação do governo deixou muito a desejar, custando caro em número de vidas e em termos de PIB. Há a visão clara e pacífica de que, enquanto a pandemia não estiver superada, vai funcionar como um freio.

Há outras fontes de incerteza?

Outra fonte de incerteza é a política geral. Já falei isso no passado e continuo achando que os efeitos qualitativos, como a questão ambiental, a resposta à crise sanitária e temas em geral ligados à qualidade da nossa democracia, como esses vários decretos sobre armas, criam um pano de fundo tenso.

Do lado da economia, o investimento vem muito parado, a taxa de investimento é muita baixa. A do setor público caiu de 5 % do PIB para 1%. Mesmo um liberal como eu consegue imaginar um espaço importante de investimento tipicamente público complementar ao do setor privado.

Há outros pontos de preocupação?

Ao lado, temos um quadro fiscal precário, a respeito do qual pouco se fez. A reforma da Previdência foi aprovada, é importante, mas teremos déficit primário a perder de vista. Com a inflação arregaçando as mangas, o lado fiscal pode ficar ainda mais preocupante. Isso é algo para o que não está se encontrando resposta.

O vento a favor está muito forte lá fora, preço das commodities subindo, uma situação, para o Brasil, rara. Mesmo assim, a taxa de câmbio foi para R$ 5,70. As pessoas deveriam se perguntar o que está acontecendo. É um quadro geral extremamente preocupante, dificílimo, não há como negar.

O auxílio emergencial deve ser mantido?

Como parecia previsível, o governo não tomou nenhuma medida considerada antipática para viabilizá-lo, mas antipático é jogar o país em outra recessão. A situação sanitária recomenda auxílio. Não há a menor dúvida: nenhum país cortaria esse auxílio, nas circunstâncias atuais, de maneira radical. Mesmo em uma situação nem tão ruim, haveria uma saída minimamente suavizada do auxílio.

Sou a favor, mas correr mais risco na economia, caminhar para outra recessão é um risco social incalculável. Algumas pessoas esquecem que a crise do real em 1998 e 1999 foi equilibrada com o tripé macroeconômico (câmbio flutuante, meta fiscal e de inflação), que o colapso da economia entre 2014 e 2016 veio na esteira de um colapso fiscal.

Corremos o risco de colapso fiscal?

A irresponsabilidade do governo não foi surpresa. Vejo o Congresso ansioso, mas mais reativo e não proativo. O que quero dizer é que, quando a chapa esquenta, o Congresso se move. Não vejo o Congresso pensar na estrutura tributária, na reforma do Estado para valer. Cerca de 80% do gasto vão para folha de pagamento e Previdência.

Na esmagadora maioria dos países, inclusive os de renda média, a parcela corresponde a 60%. É um trabalho de uma década. Não é só uma crise fiscal, é muito mais que isso. No Brasil hoje, há elementos de crise política, institucional, da credibilidade do nosso arcabouço maior. O Brasil está com uma imagem externa ruim e, pior, com uma imagem interna também ruim, por isso o investimento aqui, que é o mais importante, está tão fraco.

Como fica a imagem lá fora?

O Brasil fica mal. Em muitas dimensões, é visto como um país que tem visões atrasadas e incompatíveis com as grandes questões existenciais do planeta, sobre meio ambiente, da qualidade da democracia.

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